Os da espécie Hyalinobatrachium fleischmanni são quase imperceptíveis nas florestas tropicais onde moram. Não só por seu tamanho diminuto (semelhante ao de um marshmallow), mas também por sua cor – ou ausência de cor. Eles têm pele, músculos e órgãos translúcidos. Por isso, receberam o nome de glass frogs – “sapos de vidro”, em tradução livre para o português.
Eles são quase transparentes. Há uma mancha verde nas costas do sapinho de vidro, que se confunde com as folhas das árvores em que ele dorme, durante o dia. A aparência é um baita e evita que o animal seja visto por seus predadores.
Mas esses sapos, assim como eu e você, dependem dos glóbulos vermelhos presentes no sangue, que transportam oxigênio para todo o corpo. A cor vermelha, visível através da pele transparente, poderia anunciar a presença do sapo de vidro para seus predadores. Mas eles têm um truque para melhorar essa camuflagem: escondem a maior parte do enquanto dormem.
Quem percebeu isso foram biólogos da Duke University (Estados Unidos) depois de muito observar os sapinhos. Eles notaram que a transparência dos animais era muito maior (61%) durante o sono em comparação aos momentos em que eles estavam acordados. Carlos Taboada, primeiro autor do estudo, suspeitava que o sangue recuaria para vários órgãos quando não estivesse em circulação. E a equipe foi investigar a hipótese.
Em laboratório, eles estudaram alguns sapos durante o sono e, depois, anestesiados. Para vasculhar o interior do animal (e entender a circulação sanguínea nas duas situações), os cientistas emitiram laser na direção dos sapinhos para que eles liberassem ondas ultrassônicas, que permitem a construção de uma “imagem fotoacústica”. Este raio X 2.0 serviu para identificar o conteúdo de cada órgão.
Assim, a equipe descobriu que 89% dos glóbulos vermelhos dos sapos se acumulavam no fígado, que filtra o sangue, enquanto eles dormiam. Com o sistema circulatório quase transparente, a invisibilidade dos animais aumentava enquanto eles descansavam – um momento de maior vulnerabilidade, na floresta, em relação aos predadores.
Essas descobertas foram publicadas na revista Science, na última quinta (22), e levantaram outras questões. Os cientistas ainda não sabem, por exemplo, se o metabolismo destes sapos muda enquanto eles estão dormindo, para que o organismo precise de menos oxigênio circulando.
A equipe também se perguntou como os sapos juntam todas aquelas células sanguíneas no fígado sem que se forme um coágulo – ótimo para a cicatrização de uma ferida, péssimo se acontece em um vaso sanguíneo, por exemplo, interrompendo a passagem do sangue (e de oxigênio) para o resto do corpo.
Uma hipótese é que os de vidro podem controlar quando o sangue forma coágulos – nada voluntário, claro. Se este for caso, os cientistas poderiam compreender os mecanismos que estão por trás disso e, quem sabe, descobrir truques importantes para a prevenção dos perigosos coágulos em outros animais – como nós, humanos.
Fonte: abril