Às margens do rio Cuiabá, na Orla do Porto, sobrevivem as ruínas de um dos empreendimentos mais marcantes da história econômica e social da capital: a Cervejaria Cuyabana. No início do século XX, o complexo industrial foi referência de modernidade, lazer e produção em larga escala. Hoje, restam paredes antigas, estruturas deterioradas e vestígios silenciosos de um espaço que já reuniu centenas de pessoas aos domingos.
O resgate mais recente e detalhado dessa história foi feito pelo pesquisador e fotógrafo João Paulo Paes (@jpaes.mt), que publicou imagens atuais do local e reuniu fontes históricas para contextualizar a importância da cervejaria no desenvolvimento de Cuiabá. As fotos dele mostram o contraste entre o que o complexo representou e o estado de abandono em que se encontra atualmente.
A descrição mais antiga conhecida está nos relatos do cônego Jacomo Vicenzi, em Paraíso Verde (1918). Ele retrata a cervejaria como um dos principais pontos de encontro das famílias cuiabanas, onde música, convívio social e a vista privilegiada do “curso largo e majestoso do rio Cuiabá” transformavam o lugar em destino obrigatório. Um sobrado com salão amplo, aberto em três lados, abrigava as celebrações.
Mais que um ponto de lazer, a Cuyabana funcionava como um complexo industrial de grande porte. Segundo o historiador Rubens de Mendonça, em Roteiro Histórico & Sentimental da Vila Real do Bom Jesus de Cuiabá, a fábrica pertencia à firma Almeida & Cia., administrada pelo coronel João Batista de Almeida Filho e, mais tarde, por seu genro, o médico Alberto Novis. Para a época, representava um salto econômico para a região.
O empreendimento contava com infraestrutura logística própria: o Porto Almeida, equipado com guindaste para carga e descarga de mercadorias. Por ali chegavam matérias-primas e o produto acabado seguia principalmente para Corumbá e outras cidades do interior. Havia até uma linha exclusiva de bondinho, que conduzia visitantes diretamente aos fundos da fábrica, especialmente aos domingos, um atrativo que tornava a Cuyabana um dos espaços mais movimentados da cidade.
Ao longo da década de 1910, o local também ampliou sua vocação recreativa. Além das festas, passou a abrigar um hipódromo e instalou um projetor cinematográfico, exibindo filmes gratuitos à população. Entre os produtos fabricados, destacavam-se a famosa Cerveja Rosa, chopp, levedo, extrato de malte e gelo, itens que já integravam um mercado regional em plena expansão.
Mas o tempo e a falta de preservação transformaram o que era símbolo de inovação em ruínas expostas e vulneráveis. Hoje, parte das paredes originais ainda está de pé, cercada por mato, infiltrações e sinais de abandono. As fotos registradas por João Paulo Paes evidenciam a fragilidade do que restou e ajudam a manter viva a memória de um espaço que há mais de um século pulsava vida, música e produção.
Apesar da degradação, o imóvel é uma lembrança física de uma fase em que Cuiabá experimentou modernidade, circulação de pessoas, novos hábitos e conexões comerciais pelo rio. As ruínas preservam a memória de um tempo em que a Cervejaria Cuyabana unia produção industrial, porto fluvial, lazer e cultura e ajudava a movimentar economicamente a cidade.
Fonte: primeirapagina






