Direto De Brasilia

Celular do Dono do Banco Master Apreendido Causa Temor em Brasília: Entenda os Motivos

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A apreensão do celular do banqueiro Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, feita pela Polícia Federal durante a deflagração da operação Compliance Zero, tornou-se um elemento sensível na vida política, jurídica e financeira em Brasília.

O aparelho, recolhido após a prisão do executivo no Aeroporto de Guarulhos, é visto por parlamentares, ministros, assessores e operadores do poder como potencial “bomba de fragmentação” capaz de expor relações políticas, trocas de favores e articulações que atravessam governo, Centrão e oposição.

Segundo apuração da Gazeta do Povo com fontes ligadas às investigações, há inúmeros nomes de peso que mantiveram contato com o banqueiro ao longo dos últimos anos. Embora essas interlocuções não necessariamente caracterizem irregularidades, os conteúdos vão passar por uma varredura dentro da PF.

Investigadores já identificaram diálogos com governadores, deputados, senadores, ministros de Estado, além de membros do Judiciário.

Embora ainda não se saiba o conteúdo integral armazenado no dispositivo ou na nuvem, a possibilidade de que conversas, áudios, mensagens e históricos de chamadas revelem interlocuções suspeitas com o alto escalão tem provocado reações no meio político.

À reportagem, a defesa de Daniel Vorcaro disse que não comenta casos específicos por se tratar de informações protegidas por sigilo bancário. “O banco sempre atuou com transparência, rigor regulatório e total conformidade com as normas contábeis exigidas pelos órgãos competentes. O banco sempre foi fiscalizado pelo Banco Central e foi auditado por empresas independentes de reconhecimento internacional”.

O constitucionalista André Marsiglia avalia que a prisão do banqueiro abriu uma disputa silenciosa sobre eventuais pressões para sua soltura, o que acabou ocorrendo no fim de semana. Vorcaro deixou a prisão com o uso de tornozeleira eletrônica. Segundo ele, o caso envolve um ator com potencial para “desestruturar o tabuleiro político”. “A prisão de Daniel Vorcaro, o dono do Banco Master, agitou o país e se ele falar [fizer uma delação premiada] pode derrubar os poderes da República, pode ser a delação do fim do mundo”.

O suposto lobby político e os aliados influentes

Em meio às múltiplas conexões do banqueiro, as investigações da Polícia Federal já indicam que sua principal base de apoio estava em parlamentares figurões do Centrão. Os investigadores já sabem, inclusive, que alguns lideravam uma articulação política que atuou em diferentes frentes em defesa dos interesses do Master.

Um senador trabalhou para barrar a instalação de uma CPMI que investigaria operações do banco no ano passado. Na época, a fala de outro senador, Jorge Kajuru (PSB-GO), jogou luz ao tema. Ele afirmou haver um “lobby contra a CPI” e que esse lobby estava “pesado nos bastidores” da política em Brasília. “Boa parte dos senadores não vai se vender, mas evidentemente tem gente que tem preço”, alegou na ocasião. A CPMI não foi levada adiante e documentos apreendidos durante a operação podem indicar o porquê.

Outro ponto que pode emergir nas apurações envolve um senador que tentou incluir na PEC da autonomia financeira do Banco Central a chamada “emenda Master”, que aumentaria de R$ 250 mil para R$ 1 milhão a cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC]) — justamente o produto mais vendido pelo banco de Vorcaro.

Governadores também podem estar na mira, sobretudo os que teriam autorizado a compra de ações do Master, incluindo o Banco de Brasília (BRB).

O banco negou irregularidades, reafirmou seu compromisso com a transparência, a integridade e o cumprimento das normas contábeis e regulatórias, colocando-se à disposição para fornecer esclarecimentos adicionais.

Para investigadores da PF, o negócio foi uma tentativa de “abafar a fiscalização” do Banco Central. A investigação também apura investimentos bilionários recebidos pelo banco provenientes de um fundo suspeito de ligação com o crime organizado.

André Marsiglia destacou que Vorcaro cultivou relações extensas com governo, Centrão e ministros de tribunais superiores. “Ele tem e já teve ligações com o governo. Ele tem e já teve relações com o Centrão e ele tem e já teve relações com ministros do STF”, afirmou.

Ao comentar o poder do banqueiro e a necessidade de vigilância sobre os próximos passos processuais, o constitucionalista avalia que “deixá-lo preso seria muito inconveniente” para alguns. “E se ele for solto [como ocorreu no fim de semana], fiquemos atentos em quem eventualmente for responsável pela sua soltura”.

A “bomba-relógio” do conteúdo digital

Fontes ligadas às investigações reforçaram à Gazeta do Povo que as principais revelações podem estar não nos autos processuais nem nos documentos financeiros, mas nos dados armazenados no celular de Vorcaro.

Segundo relatos colhidos pela PF, o aparelho pode conter registros de pressões, pedidos, indicações políticas, intermediações, repasses em financiamentos de campanhas e tratativas envolvendo interesses públicos e privados.

As investigações já são tratadas como um dos maiores escândalos financeiros da história recente do Brasil. Mas a dimensão política do caso pode provocar reacomodações no governo, no Congresso e no Judiciário.

Para Marsiglia a dimensão política do caso pode superar o impacto financeiro e alcançar o alto escalão da política e do judiciário nacional. Ele reforça que o temor nesse momento pode ser transversal: atingindo governistas, opositores, operadores, lobistas e autoridades que, em algum momento, se aproximaram do banqueiro. Segundo investigadores, a história avança em duas frentes: a apuração de supostas fraudes bilionárias e a análise do aparelho telefônico que pode revelar os bastidores menos visíveis da República.

Encontros, contratações e consultorias

Em 2022 o empresário chegou a patrocinar um jantar em Nova York para magistrados do STF, apesar de não haver evidências de irregularidades no evento.

Chegou a contratar o escritório da advogada Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes. Ela foi procurada pela Gazeta do Povo, mas não respondeu aos questionamentos até a publicação da reportagem. O espaço segue aberto. Nem o escritório nem a advogada são alvos de apuração e não há registros de irregularidades nas ações comerciais entre eles.

O deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS), vice-líder da oposição na Câmara dos Deputados, pediu à Procuradoria-Geral da República (PGR) a abertura de um procedimento para apurar possível relação entre escritórios de advocacia e um esquema de créditos fictícios envolvendo o Banco Master, com base em reportagens que mencionam a contratação de grandes bancas para atuar em defesa de interesses do banco e, supostamente, influenciar decisões regulatórias e negociações com órgãos públicos.

A representação afirma que essas informações levantam dúvidas sobre eventual participação, direta ou indireta, nas práticas investigadas pela Operação Compliance Zero, que levou à prisão de Daniel Vorcaro, embora não haja indícios de ilegalidades por parte dos escritórios. Sanderson sustenta que a preocupação não está na contratação legítima dos advogados, mas na possibilidade de terem sido utilizados para interceder ou exercer pressão sobre autoridades durante tratativas envolvendo a venda do Master.

Ricardo Lewandowski — então recém-aposentado do STF e hoje ministro da Justiça — chegou a integrar o comitê consultivo estratégico do Banco Master antes de assumir o posto no governo.

Em nota, a assessoria do ministro afirmou à reportagem que depois de deixar o STF, em abril de 2023, ele retornou às atividades de advocacia. “Além de vários outros clientes, prestava serviços de consultoria jurídica ao Banco Master. Ao ser convidado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública, em janeiro de 2024, Lewandowski retirou-se de seu escritório de advocacia e suspendeu o seu registro na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)”, descreveu.

A assessoria não respondeu se Lewandowski ainda mantém contato com a presidência ou a alta cúpula do banco. Na lista de relações com o banqueiro estaria ainda ex-presidentes do Banco Central que foram contratados como consultores.

Embora não haja indícios de que esses vínculos tenham favorecido condutas ilícitas, a amplitude das conexões contribuiu para a percepção de que Vorcaro mantinha trânsito privilegiado entre figuras estratégicas.

Operação foi vazada?

Vorcaro foi preso no dia 17 de novembro, mas, para investigadores, ele já estaria ciente de que seria alvo de buscas em endereços ligados a ele e em unidades do Banco Master. Supostamente também sabia que teria o passaporte apreendido e seria impedido de deixar o país. Foi preso enquanto embarcava em um jatinho para Dubai, o que reforçou a suspeita de tentativa de fuga — versão contestada pela defesa que afirma que ele seguia para uma viagem a negócios.

Em uma nota divulgada à imprensa no dia 25 de novembro, a defesa de Daniel Vorcaro informou que o banqueiro atualizou o Banco Central sobre as negociações de venda das instituições do Conglomerado Master — inclusive a divulgação da venda do Banco Master a um grupo nacional, com imediato envio da documentação ao BC.

A defesa também disse que comunicou que o banqueiro viajaria a Dubai em 17 de novembro para assinatura de contrato e anúncio de operação com investidores estrangeiros que passariam a integrar o bloco acionário do banco, pois Vorcaro buscava “soluções de mercado sólidas, com boa-fé, transparência e respeito ao regulador.” Os documentos enviados ao BC foram apresentados pela defesa ao Poder Judiciário.

A Gazeta do Povo tentou contato com a assessoria do Master, mas até a publicação da reportagem não obteve retorno. A defesa de Vorcaro não informou sobre suas possíveis ligações com nomes de peso na cena política, econômica e jurídica nacional.

A própria Polícia Federal teria recebido, horas antes da prisão, a informação de que Vorcaro tinha conhecimento da ação e antecipou o cumprimento dos mandados. Questionada, a PF disse apenas que não se manifesta sobre investigações em curso.

Banco Master construiu um império em poucos anos

Em apenas cinco anos, Vorcaro transformou o antigo Banco Máxima no Banco Master e projetou o nome da instituição com uma estratégia agressiva de captação. Para os investigadores, boa parte desta trajetória pode estar registrada em aparelhos eletrônicos e arquivos digitais que estão sendo analisados.  

O que as autoridades já sabem é que o Master oferecia Certificados de Depósito Bancário (CDBs) com remuneração acima do mercado atraindo milhões de investidores. O crescimento dos ativos do banco saiu de R$ 36 bilhões em 2023 para R$ 63 bilhões em 2024. O Banco nega a prática de quaisquer irregularidades.

A instituição financeira investia recursos em ativos que, segundo analistas, são pouco líquidos, empresas endividadas e precatórios sem lastro, além de operar carteiras de crédito consignado simuladas. “Se de fato ocorreu, não se faz isso sem ter influência política, econômica e financeira e sem deixar rastros, a menos que eles desapareçam”, alerta o criminalista Márcio Nunes.

A estrutura foi classificada pelo Ministério Público Federal como uma das maiores fraudes documentadas no sistema financeiro brasileiro e especialistas consideram que ela vai escalar à cena política.

A liquidação extrajudicial do Banco Master, decretada pelo Banco Central, desencadeou o maior resgate da história do FGC. Dos R$ 41 bilhões em CDBs emitidos, 1,6 milhão de investidores terão de ser ressarcidos. O montante representa aproximadamente um terço de todo o caixa do FGC, o que obrigará os maiores bancos a realizar aportes adicionais.

Economistas afirmam que a conta, no fim, recairá sobre os próprios investidores, já que a contribuição ao FGC é repassada pelas instituições por meio da remuneração dos títulos. “Não temos dúvidas que todos pagaremos um pouco dessa conta. É difícil acreditar que a situação, em se provando irregular, não fosse do conhecimento das autoridades”, alerta o economista e analista de mercado Rui São Pedro.

A escala do prejuízo reacendeu o debate sobre o modelo de garantia de depósitos, sobre o histórico de falhas regulatórias do Banco Central, que demorou a intervir mesmo após sinais de desequilíbrio financeiro e a possível ligação com autoridades para dar sustentação.

O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, afirmou ser essencial fortalecer financeiramente a instituição para viabilizar investimentos internos e aprimorar sua supervisão sobre o sistema financeiro. A fala foi proferida em evento da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) em que ele destacou que tecnologias como inteligência artificial podem otimizar a fiscalização, reduzindo a dependência de amostragens e automatizando processos, além de permitir avanços contínuos na supervisão.

Galípolo citou o caso do Banco Master como exemplo da necessidade de modernização do perímetro de supervisão, lembrando que o trabalho do BC é permanente e envolve cooperação com MP e PF. Ele ressaltou que falhas bancárias não são exclusividade do Brasil, ocorrendo também em sistemas complexos como os dos Estados Unidos e da Suíça, e que o aprendizado constante é fundamental para evitar a repetição de problemas.

Quando as investigações ganharam corpo

As investigações sobre o Banco Master ganharam força a partir de 2024, quando o Ministério Público Federal solicitou à Polícia Federal que apurasse suspeitas de manipulação na emissão de carteiras de crédito. O banco nega irregularidades no processo.

A apuração apontava indícios de que títulos sem lastro teriam sido criados e posteriormente repassados a outra instituição financeira. Após fiscalização do Banco Central, esses ativos acabaram substituídos supostamente de forma irregular, sem avaliação técnica adequada.

O caso ganhou novo peso durante a CPI do Crime Organizado, no Senado, quando o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, indicou que o esquema financeiro sob investigação — e que levou à prisão do presidente e de diretores do banco — pode ter movimentado cerca de R$ 12 bilhões. Rodrigues também informou que, na casa de um dos alvos da operação Compliance Zero, foram apreendidos R$ 1,6 milhão em espécie. Ele destacou que a apuração ocorre em cooperação com o Banco Central e o Coaf, dada a gravidade das supostas fraudes e o impacto no sistema financeiro.

De acordo com a PF, o Banco Master teria emitido R$ 50 bilhões em CDBs com juros acima dos praticados pelo mercado, sem comprovação de liquidez para honrar os títulos no futuro. Para sustentar a aparência de solvência, parte do montante teria sido direcionada a créditos inexistentes de uma empresa, adquiridos sem desembolso e posteriormente revendidos ao BRB. O banco público, segundo as investigações, pagou R$ 12,2 bilhões por esses créditos sem a documentação necessária, numa operação que teria servido para reforçar o caixa do Master.

As transações ocorreram justamente no período em que o BRB avaliava a compra do próprio Banco Master e buscava convencer órgãos de controle sobre a viabilidade da operação. O BRB afirma que sempre agiu com transparência seguindo os padrões de integridade e está disponível para esclarecimentos.

A defesa de Daniel Vorcaro tem afirmado que não existe “qualquer fraude de R$ 12 bilhões”, contestando a estimativa apresentada pela Polícia Federal.

Os advogados alegam que as carteiras foram adquiridas previamente de terceiros, responsáveis pela documentação, e que o Banco Master tinha respaldo contratual para montá-las e repassá-las ao BRB. Argumentam ainda que, ao identificar inconsistências, a instituição teria substituído de boa-fé os créditos fornecidos por esses terceiros.

A defesa reforça que as carteiras investigadas “nunca chegaram a ser transferidas em caráter definitivo ao BRB” e que, por isso, o pagamento feito pelo banco público não teria relação com esses ativos. A Justiça Federal havia decidido manter a prisão do dono do Banco Master e, na semana passada, ele chegou a ser transferido, da carceragem da PF, para o Centro de Detenção Provisória 2, em Guarulhos (SP), mas deixou a prisão no fim de semana e passou a responder ao processo com aplicação de medidas restritivas.

Fonte: gazetadopovo

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