SAÚDE

‘Caracol venenoso: toxina letal pode revolucionar tratamento de diabetes’

2025 word1
Grupo do Whatsapp CuiabĂĄ

VocĂȘ estĂĄ passeando na praia e vĂȘ uma concha grande, daquelas que a Ariel usa para ouvir o som do mar. Inocentemente, vocĂȘ a pega com as mĂŁos, sem saber que ali dentro ainda vive um dos animais mais venenosos do mundo. Foi assim que morreram pelo menos 36 pessoas nos Ășltimos trĂȘs sĂ©culos, desde que os caracĂłis-do-cone (Conus geographus) começaram a ser monitorados.

Agora, cientistas estudam as toxinas desse animal e como elas podem ajudar a produzir medicamentos para diabetes. Uma pesquisa sobre esse tema foi publicada nesta terça (20) na revista Nature.

Pode ser que vocĂȘ conheça a sensação que o caracol-do-cone provoca em suas vĂ­timas: uma das toxinas Ă© parecida com um hormĂŽnio humano chamado somatostatina, que regula o nĂ­vel da glicose no sangue. Quando circulam na corrente sanguĂ­nea, as substĂąncias provocam uma baixa na glicose (hipoglicemia) cujos primeiros sintomas sĂŁo confusĂŁo mental, fraqueza e tremores. Levado ao nĂ­vel extremo, a hipoglicemia provocada pelo caracol-do-cone deixa a vĂ­tima sem reação, e mata em atĂ© cinco horas.

A somatostatina atua como um “freio” para muitos processos no corpo humano, impedindo que os nĂ­veis de açĂșcar no sangue, hormĂŽnios e outras molĂ©culas aumentem perigosamente. 

Os pesquisadores da Dinamarca e EUA descobriram o caracol-do-cone produz uma toxina chamada consomatina. Ela funciona de forma semelhante Ă  somastostatina, mas Ă© mais estĂĄvel e especĂ­fica do que o hormĂŽnio humano. Enquanto a somatostatina interage diretamente com vĂĄrias proteĂ­nas, a consomatina interage apenas com uma. Esse direcionamento preciso faz com que a toxina do caracol-do-cone afete os nĂ­veis de hormĂŽnio e de açĂșcar no sangue, mas nĂŁo os nĂ­veis de muitas outras molĂ©culas.

A consomatina tambĂ©m Ă© mais especĂ­fica do que as drogas sintĂ©ticas de primeira linha, e dura muito mais tempo no corpo do que o hormĂŽnio humano, graças Ă  inclusĂŁo de um aminoĂĄcido incomum que dificulta sua decomposição. Esse Ă© um outro mecanismo que deve ser Ăștil para os pesquisadores farmacĂȘuticos que investigam maneiras de produzir medicamentos com benefĂ­cios duradouros.

A descoberta revela um modelo promissor para o projeto de medicamentos, mas ainda nĂŁo passou por testes clĂ­nicos em animais ou humanos. Na verdade, os pesquisadores pretendem estudar um mecanismo semelhante, mas que seja menos agressivo que a substĂąncia do caracol.

“Essa consomatina, em especĂ­fico, nĂŁo Ă© particularmente para o diabetes, mas achamos que poderia ser um bom tipo de inspiração para futuros distĂșrbios hormonais e para tratamentos de cĂąncer” diz Ho Yan Yeung, bioquĂ­mica e principal autora do estudo, em entrevista Ă  Super.

Ho Yan Yeung, PhD, primeiro autor do estudo (à esquerda) e Thomas Koch, PhD, também autor do estudo (à direita) examinam um lote recém-coletado de caracóis cÎnicos.
(Safavi Lab/Reprodução)

Encontrar medicamentos melhores por meio do estudo de venenos mortais pode parecer contraintuitivo, mas Helena Safavi, autora sĂȘnior do estudo, explica que a letalidade das toxinas geralmente tem um direcionamento preciso de molĂ©culas no corpo da vĂ­tima. Essa mesma precisĂŁo pode ser muito Ăștil no tratamento de doenças.

“Os animais peçonhentos, por meio da evolução, ajustaram os componentes do veneno para atingir um alvo especĂ­fico na presa e desorganizĂĄ-lo”, diz Safavi. “Se vocĂȘ retirar um componente individual da mistura de veneno e observar como ele perturba a fisiologia normal, essa via geralmente Ă© realmente relevante para doenças.” Ela explica que, para quem trabalha com a quĂ­mica da medicina, â€œĂ© um meio que um atalho”.

“É muito surpreendente como muitos desses animais peçonhentos nos deram tantos candidatos a medicamentos interessantes, que poderíamos desenvolver como futuras terapias” diz Yeung, que cita exemplos de medicamentos que foram obtidos a partir de venenos de larvas, aranhas e cobras. “Isso mostra que precisamos investigar mais a natureza para tentar encontrar fontes de medicamentos mais interessantes para o futuro.”

Fonte: abril

Sobre o autor

Avatar de Redação

Redação

Estamos empenhados em estabelecer uma comunidade ativa e solidåria que possa impulsionar mudanças positivas na sociedade.