SAÚDE

Cães de Chernobyl: Sobreviventes do Desastre Nuclear após 40 Anos

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Em abril de 1986, o reator 4 da Usina Nuclear de Chernobyl, no norte da então União Soviética, explodiu durante um teste de segurança mal executado.  A falha liberou no ar grandes quantidades de material radioativo, como Césio-137 e Iodo-131, contaminando mais de 2.600 quilômetros quadrados. 

Além da radiação, metais pesados, pesticidas, poeira de chumbo e amianto também se espalharam durante o processo de limpeza da área.

A tragédia forçou a evacuação de dezenas de milhares de pessoas e deixou para trás casas, pertences e animais de estimação. Muitos cães foram abandonados ou já viviam de forma semisselvagem na região e permaneceram expostos ao ambiente contaminado.

Quase três décadas depois, cientistas começaram a investigar o que aconteceu com esses animais.

Entre 2017 e 2019, uma equipe da Universidade Estadual da Carolina do Norte e da Universidade Columbia coletou amostras de sangue de 302 cães que viviam em três zonas distintas: nas imediações da própria usina; na cidade de Chernobyl,  a cerca de 15 quilômetros do reator; e na cidade de Slavutych, construída a cerca de 45 quilômetros para abrigar trabalhadores deslocados após o desastre.

O objetivo inicial era compreender como uma população de animais havia sobrevivido por tantas gerações em um dos ambientes mais contaminados do planeta.

A análise revelou que os cães próximos à usina eram geneticamente distintos dos encontrados em áreas mais afastadas. 

Vivendo isolados por décadas, eles formavam um grupo de alta consanguinidade, distribuído em 15 famílias identificadas. Quanto mais próximo do reator, maior a diferenciação genética em relação a cães domésticos modernos.

Essa estrutura sugeria que os animais descendiam de poucos indivíduos originais e que se reproduziram entre si desde então.

Em março de 2023, esses resultados foram publicados na revista Science Advances. Os pesquisadores destacaram 391 regiões do genoma que diferenciavam os cães de Chernobyl dos de outras partes da Ucrânia e da Europa.

Muitas dessas regiões estavam associadas a funções de reparo do DNA, que ajudam as células a corrigir danos em seu material genético, e ao controle do ciclo celular, mecanismo que regula a divisão e o crescimento das células.

Esses processos são fundamentais para manter a integridade do organismo e prevenir doenças, como o câncer. Isso levantou a hipótese de que, logo após o desastre, uma pressão seletiva extrema poderia ter favorecido animais com características genéticas capazes de aumentar sua sobrevivência no ambiente hostil.

Ainda assim, não havia evidências conclusivas de que essas diferenças conferissem proteção efetiva contra doenças.

No fim de 2024, a equipe publicou um novo estudo, desta vez na revista PLOS One, aprofundando a investigação. O foco era entender se as diferenças genéticas observadas tinham relação direta com mutações causadas pela radiação ou se derivavam de outros fatores, como o isolamento populacional.

Para isso, os cães da cidade de Chernobyl foram usados como grupo de controle, já que eram geneticamente parecidos com cães da Rússia e da Polônia, mas viviam mais longe do epicentro do acidente.

Os cientistas examinaram o DNA dos cães da usina em diferentes escalas, do nível cromossômico até variações menores. A expectativa era que mutações hereditárias vantajosas – caso existissem – ainda pudessem ser detectadas, mesmo após 30 gerações.

Não encontraram, porém, nenhum sinal de alterações genéticas que pudessem ser atribuídas diretamente à radiação. Segundo os pesquisadores, é mais provável que a separação geográfica e o pequeno tamanho populacional inicial expliquem as diferenças em relação aos cães da cidade.

O estudo também chamou atenção para o papel de outras substâncias tóxicas liberadas no desastre, como chumbo e amianto, no impacto à saúde dos animais.

Para a equipe, compreender como as populações próximas a áreas contaminadas se adaptam ao longo do tempo pode fornecer pistas valiosas sobre riscos à saúde humana em futuros acidentes ambientais. 

Como destacou a pesquisadora Megan Dillon, que liderou o estudo, é possível que os primeiros cães a sobreviver após o acidente já tivessem, por acaso, características genéticas favoráveis e que essas tenham se mantido ao longo das décadas.

“Talvez tenha havido uma pressão seletiva extrema no início, e então os cães da usina simplesmente permaneceram separados da população da cidade. Investigar essa questão é um próximo passo importante no qual estamos trabalhando agora”, afirmou em comunicado

“A importância de continuar a estudar os aspectos de saúde ambiental de desastres de grande escala como este não pode ser superestimada”, acrescentou Norman Kleiman, coautor e professor na Escola de Saúde Pública da Universidade de Columbia, em nota.

“Dadas as nossas sociedades cada vez mais tecnológicas e industriais, invariavelmente haverá outros desastres semelhantes no futuro, e precisamos entender os potenciais riscos à saúde e a melhor forma de proteger as pessoas”.

Fonte: abril

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