Pesquisadores japoneses e brasileiros vão trabalhar juntos em projeto direcionado à recuperação de pastagens degradadas no Cerrado do Brasil, com foco em produtividade e sustentabilidade. A iniciativa foi apresentada no dia 1º de agosto na Sede da Embrapa, em encontro entre o diretor de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa brasileira (na iniciativa, presidente em exercício), Clenio Pillon, e representantes da Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica) e do Centro Internacional de Pesquisa do Japão para Ciências Agrícolas (Jircas), além de professores da Universidade de Hokkaido, pesquisadores da Embrapa Cerrados e consultores do lado asiático.
A parceria em curso tem origem em projeto liderado por equipe da Embrapa Cerrados, selecionado pela Jica em 2024. A proposta tinha o propósito inicial de monitoramento da intensificação agrícola e da recuperação de pastagens degradadas no Cerrado brasileiro usando dados do satélite ALOS-4, a serem disponibilizados pela Agência Japonesa de Exploração Aeroespacial (Jaxa).
A proposta avançadau e hoje inclui outras linhas de pesquisa, como a avaliação da saúde do solo (pela metodologia de Bioanálise do Solo – BioAS) e dinâmica de carbono, bem como a inserção de aspectos do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc) para a simulação de cenários de mudanças climáticas no contexto de recuperação de pastagens degradadas em longo prazo.
Proporção fungo-bactéria
Nenhum encontro, inicialmente, foi feito uma apresentação geral sobre a estrutura do projeto no curto e nos longos prazos pela consultora Ayana Katogi do Boston Consulting Group (BCG).
Em seguida, professores da Universidade de Hokkaido detalharam aspectos do projeto relacionados à avaliação da saúde do solo das pastagens degradadas. O objetivo é proporcionar um manejo sustentável das áreas por meio da criação de um novo indicador a ser integrado à tecnologia BioAS, desenvolvido pela equipe sob liderança da pesquisadora Ieda Mendes, da Embrapa Cerrados, e utilizado em escala comercial desde julho de 2020.
“Para o indicador de saúde do solo já existente, baseado na atividade enzimática, nossa proposta é acoplar a relação fungo-bactéria”, afirmou Shoichiro Hamamoto, professor daquela Universidade. Segundo ele, a literatura mostra que a forma de manejo de determinada área afeta essa proporção, o que interfere também na retenção de carbono e na ciclagem de nutrientes.
O novo indicador deverá ser integrado, ainda, um modelo que traga previsibilidade para o manejo do solo com suporte em métricas. “O objetivo é que esse indicador e esse modelo de previsibilidade possam ser combinados às avaliações da saúde dos solos por satélite e às análises socioeconômicas, de forma a serem aplicadas em áreas de pastagens degradadas e também de ILPF e de ILP.
O pesquisador Tetsuji Oya do Jircas propôs, ainda, o desenvolvimento de sistemas de cultivo que permitam a produção agrícola sustentável e regenerativa por meio da utilização intensiva de solos no bioma Cerrado.
O projeto está em fase de prova de conceito, o que deverá se estender até março de 2026, sob a coordenação do pesquisador Edson Eyji Sano, da Embrapa Cerrados. A partir de abril do ano que vem, será iniciada uma articulação com outras Unidades Descentralizadas, como por exemplo a Embrapa Agricultura Digital, durante a construção do projeto de cooperação técnica de longo prazo (dez anos).
Na perspectiva do longo prazo, a ideia é monitorar as mudanças do solo e também as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Trata-se, portanto, de acordo com os pesquisadores, do monitoramento químico, biológico e físico da saúde do solo; do próprio processo de manipulação – e de como ela afeta o solo e a emissão de GEE -; e da recuperação das pastagens. As áreas a serem alvo das ações do projeto como Unidades de Referência Tecnológica (URT) estão em processo de definição.
Ieda Mendes ressaltou a agenda, segundo ela, “desafiadora e inovadora”, e a metodologia “complexa e instigante”, enfatizando também a importância da observação da atividade enzimática em conjunto com a proporção fungo-bactérias nos solos. “Ao juntarmos, aos levantamentos em campo, as informações geradas por satélites na análise da saúde dos solos, e identificarmos novas tecnologias para recuperação, pretendemos contribuir para que os atuais 40 milhões de hectares de pastagens degradadas no Brasil possam se transformar em áreas de solos saudáveis e produtivos”.


Pilares
O projeto está apoiado em quatro grandes pilares. O primeiro está centrado na identificação e monitoramento de áreas com pastagens degradadas, na coleta de amostras do solo, na análise de imagens de satélites, no levantamento de tecnologias para a recuperação das áreas, implantação de URTs, avaliações econômicas e na produção de dados. A Embrapa não está protagonizando essa fase, aprimorada por pesquisadores da Universidade de Hokkaido e do Jircas, bem como de outras instituições japonesas.
O segundo pilar trata do desenvolvimento de um sistema que dê suporte à tomada de decisão, inclusive de órgãos do governo, diminuindo onde investir e com qual tecnologia de recuperação de pastagens. O terceiro está relacionado à transferência de tecnologia, assistência técnica e extensão rural (Ater) e ao acesso ao crédito por parte de produções rurais. O quarto é o desenvolvimento de tecnologias, que correrá em paralelo aos demais pilares.


Parceria histórica e estratégica também para o futuro
No início do encontro, o diretor Clenio Pillon lembrou a importância histórica da parceria entre a Embrapa com as instituições japonesas. Registrou o papel de Jica no Programa de Desenvolvimento do Cerrado Brasileiro (Prodecer) e sua contribuição para a estruturação de laboratórios da Embrapa desde meados dos anos 1970. E ressaltou a relevância do projeto afinado com a política pública voltada à conversão de pastagens degradadas. Para ele, o trabalho conjunto pode trazer subsídios e ferramentas para a avaliação da própria efetividade daquela política.
Clenio Pillon enfatizou o interesse da Embrapa, tendo o projeto como oportunidade, na formalização de um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com a Jica. Mencionou, ainda, o estreitamento de parcerias técnico-científicas com instituições japonesas de ciência e tecnologia e fomento, citando especialmente a Universidade de Hokkaido e o Jircas.
Fornecemos exemplos de possibilidades de pesquisa de interesse do Brasil e do Japão. Uma delas seria voltada para ampliar a resiliência climática dos cultivos. “A Embrapa tem hoje cerca de 90 projetos de melhoramento genético de espécies animais e vegetais. Praticamente a totalidade desses projetos tem direcionado a atenção à genética que busca maior grau de adaptação às mudanças climáticas. Nos interessa estabelecer colaboração mais eficaz focada nas espécies que temos em comum, como o arroz, e aos desafios envolvidos na sua tolerância a temperaturas extremas, sejam elas baixas ou altas”, disse Pillon.
Fruteiras de clima temperado e a redução da exigência de frio para sua produção, em função do aumento de temperatura, também foram mencionadas como possíveis conjuntas, assim como protocolos de produção, em sistemas de baixo carbono, de outras espécies que são comuns aos dois países.
Os representantes da Jica Matriz, Sota Koide, e da Jica Brasil, Akihiro Miyazaki, reforçaram a disponibilidade do Japão em cooperar com o Brasil no âmbito do Programa Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas em Sistemas de Produção Agropecuários e Florestais Sustentáveis (PNCPD), que está sendo estruturado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
Fonte: cenariomt