Essa constatação foi feita pela pesquisadora Rosana de Oliveira Pithan e Silva, do Instituto de Economia Agrícola (IEA), da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), órgão ligado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.
Segundo a pesquisadora, o abandono da atividade e a concentração da produção, que até então ocorria basicamente na agricultura familiar, é um fator que vem crescendo no Brasil. “É uma tendência mundial, que funciona como uma estratégia que busca maior eficiência, com necessidade de escala para reduzir custos e ter rentabilidade maior”, explica.
Ainda há sinais que a concentração da atividade ocorre na propriedade com maior escala e redução de rebanho, segundo a Embrapa. Atualmente, 2% dos estabelecimentos produzem 30% do leite do país.
No estudo publicado pelo IEA, (Link) a pesquisadora aponta esse motivo como fundamental para se ter uma perspectiva do que pode ocorrer no mercado daqui para frente. Como consequência, pode-se ter condução do mercado e diminuição da concorrência, atuando conforme interesse das empresas e, muitas vezes, com restrição da oferta de produtos e preços mais altos.
“É importante frisar que esse modelo concentrador já ocorreu em vários setores do agro. Isso mostra a necessidade de políticas públicas aos médios e pequenos produtores, principalmente àqueles da agricultura familiar, como os assentados, que buscam uma atividade que dá garantia de uma renda mensal. A redução de sua participação na produção poderá, a curto e a médio prazo, tirá-los do mercado, trazendo grande problema social, que deve ser pensado antes que ocorra de fato”, alerta Rosana Pithan.
Preços
O ano de 2022 se destacou por altos preços que se intensificaram com a entrada da entressafra, o que comprometeu o consumo do produto pela população, devido a questões econômicas do país que se configuraram por um cenário de desemprego e queda de salários dos trabalhadores. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontou que o grupo “Leites e derivados” teve grande variação (+22,1%), diante de uma inflação de 5,8% no ano.
Os principais fatores que influenciaram diretamente os preços praticados foram: redução da produção nacional com a baixa oferta de leite cru; alta dos preços dos principais itens da alimentação do gado (milho e soja); crescente abandono da atividade (desde 2021) com consequente queda da captação de leite pela indústria, ano após ano, o fenômeno La Niña, que por três anos provocou seca intensa no Sul do país (importante região produtora do produto), afetando o pasto e ainda o solo para a produção de milho; a mudança crescente de parte do sistema produtivo do gado para confinamento, que exige maior volume de insumos alimentares; chuvas fortes na região Sudeste, que deixaram pastos extremamente úmidos; a inflação; o aumento dos preços dos combustíveis; ascensão da cotação do dólar; e o conflito entre Ucrânia e Rússia, que trouxe distúrbios no mercado internacional.
Produção
Quanto à produção de leite industrializado, houve, em 2022, uma redução de 5% em relação ao ano anterior, com quase 1 bilhão de litros a menos, o que levou à necessidade do aumento nas importações em 26,3%, especialmente da Argentina e Uruguai. “Isso representa 10% do total consumido internamente, o que é muito preocupante”, disse a pesquisadora.
A redução da produção de leite não é um fator isolado ao Brasil, mas vem ocorrendo em países como a Nova Zelândia (maior exportador de leite do mundo), que está com sua produção estagnada. Acontece o mesmo na União Europeia, e países da América Latina também têm tido crescimento pífio nos últimos anos. Apenas nos Estados Unidos tem havido aumento.
Outro ponto a ser considerado é com relação a utilização do confinamento, que tem se mostrado tendência crescente na pecuária de leite. Esse modelo leva à necessidade de maior investimento na alimentação animal, com preferência a alimentos alternativos, já que milho e soja exigiriam aumento de seu cultivo e expansão de suas produções. “É preciso investimentos na área produtiva ou, no caso do confinamento, em tecnologia para sua implantação e alcançar maior produtividade e eficiência o que, nem sempre, o pequeno produtor tem conhecimento desses tópicos por falta de assistência técnica pública e acesso a financiamentos, ou seja, há necessidade de políticas públicas efetivas para atender esses produtores, orientando-os e propondo técnicas e tecnologias acessíveis que o ajudem, aumentando a qualidade e a produtividade do leite, sem a necessidade de altos investimentos, garantindo sua sobrevivência”, finaliza Rosana.
Fonte: portaldoagronegocio