Estudos realizados no Brasil têm se debruçado sobre os principais desafios enfrentados pelos produtores comerciais de pirarucu, abrangendo aspectos como melhoramento genético, criação de larvas, manejo sanitário, alimentação, crescimento, transporte e processamento. José Miguel Saud Morheb, piscicultor e empresário especializado na produção de peixes nativos em ambientes controlados, é uma das figuras centrais dessas pesquisas. Com mais de 12 anos de experiência, Morheb, que atua em Itapuã, no oeste de Rondônia, destaca o pirarucu (Arapaima gigas) como uma espécie promissora para o desenvolvimento da aquicultura em água doce, devido às suas altas taxas de crescimento e à crescente demanda de mercado.
Nos últimos cinco anos, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) tem mobilizado diversas instituições de pesquisa, tanto nacionais quanto internacionais, para colaborar com os principais atores do setor. O projeto, que contou com o apoio financeiro do Sebrae e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), focou nos desafios enfrentados pelos produtores na criação, manejo, cultivo e processamento dessa espécie.
Avanços na Reprodução e Diversidade Genética
Morheb ressalta que, embora o pirarucu fosse considerado monogâmico em sua formação de pares durante a reprodução, esse comportamento não se observa em fazendas de criação, onde uma fêmea pode copular com vários machos em diferentes ocasiões. A reprodução ocorre com a formação de pares que constroem ninhos no fundo de áreas rasas para a cópula, sendo seguidos de cuidados parentais intensivos após a fertilização externa.
Pesquisas em genômica populacional, tanto em estoques silvestres quanto em cativeiro, produziram resultados significativos, permitindo melhorias na cadeia produtiva e na conservação dos recursos genéticos do pirarucu. “Estudos confirmaram que o pirarucu representa uma única espécie, dividida em duas linhagens genéticas distintas, oferecendo novas oportunidades para o entendimento do processo de domesticação e adaptação dessas linhagens em sistemas de produção”, explica Morheb.
Redução dos Custos de Alimentação e Transportes
O projeto também investigou como o pirarucu se beneficia do consumo de zooplâncton na fase inicial de criação, antes de ser condicionado a rações comerciais. A pesquisa revelou que até atingirem 500 gramas, os peixes preferem consumir cladóceros e insetos. Além disso, um teste realizado com alevinos mantidos em tanques fertilizados demonstrou um ganho de peso 20% superior em relação aos animais de controle, que estavam em tanques não fertilizados.
Outro aspecto crucial abordado foi o transporte do pirarucu, uma etapa fundamental no manejo e cultivo. Com a falta de informações sobre as melhores práticas, o projeto realizou um estudo para definir a densidade ideal de transporte em contêineres. A pesquisa concluiu que uma densidade máxima de 160 kg por metro cúbico é segura para o transporte dos peixes por até seis horas, levando em consideração parâmetros fisiológicos para garantir o bem-estar dos animais.
Nutrição e Gestão de Doenças Parasitárias
A nutrição também foi um ponto de estudo importante, já que a falta de rações adequadas para as diversas etapas de produção do pirarucu é uma limitação crítica. A pesquisa identificou o farelo de glúten de milho, o farelo de subprodutos de aves e o farelo de soja como potenciais fontes proteicas para formulação de rações. Além disso, os estudos sobre os parasitas do pirarucu, especificamente o helminto Dawestrema cycloancistrium (Monogenea: Dactylogyridae), forneceram informações essenciais para o manejo eficaz de doenças parasitárias nos sistemas de produção.
Perspectivas para o Mercado e Processamento
Morheb destaca as qualidades do pirarucu que tornam a espécie atrativa para o processamento industrial, como seu excelente desempenho zootécnico, alto rendimento de carne, ausência de espinhos intramusculares, além de boa textura, sabor e cor da carne, que agradam ao paladar dos consumidores.
Ao longo do projeto, 10 treinamentos técnicos foram realizados, impactando 314 participantes nas áreas de reprodução e produção, e contribuindo significativamente para a profissionalização dessa cadeia de valor no Brasil. “Esses avanços são fundamentais para o crescimento sustentável da piscicultura de pirarucu e para a ampliação da produção de peixe no Brasil”, conclui Morheb.
Fonte: portaldoagronegocio