O principal estudo sobre a situação da gestão pesqueira nacional, a Auditoria da pesca foi lançada hoje (27.7) pela Oceana. Em sua terceira edição, o documento aponta um salto no conhecimento sobre a situação dos estoques pesqueiros, fruto de pesquisas realizadas com recursos públicos por cientistas de diferentes instituições do país. Apesar do avanço, uma parte expressiva dos recursos pesqueiros brasileiros ainda é explorada sem que se conheça a sua situação biológica, o que representa riscos ambientais e socioeconômicos.
Estoques pesqueiros sobrepescados
A edição anterior da Auditoria levantou a existência de informações científicas sobre o estado de apenas oito estoques pescados comercialmente no país; no relatório lançado hoje, esse número saltou para 66 espécies. No entanto, os novos dados revelam uma situação alarmante: desses estoques para os quais existem informações disponíveis, 67% estão com volume abaixo dos níveis mínimos. Estão, portanto, numa zona de perigo biológico o que, inclusive, prejudica o rendimento econômico atual e futuro das pescarias.
É o caso de espécies amplamente conhecidas, como corvina, castanha, polvo e o camarão rosa das regiões Sul e Sudeste; e olho-de-boi (arabaiana), pescada amarela e xaréu pescados no Norte e Nordeste do país.
“Atualmente, três em cada quatro estoques conhecidos têm biomassa abaixo dos níveis ideais. E estamos falando de um universo de apenas metade dos recursos que são alvo da frota pesqueira marinha do país. A outra metade segue no apagão de dados. Nada se sabe, por exemplo, sobre a situação da sardinha-verdadeira, da cavalinha e da palombeta – alguns dos principais recursos pesqueiros do Brasil”, aponta o diretor científico da Oceana, o oceanógrafo Martin Dias.
Falta de Planos de Gestão
O estudo identificou também que apenas 10 estoques pesqueiros (ou 8% do total) estão submetidos a algum tipo de Plano de Gestão – implementado ou não. “Essa falta generalizada de planos de gestão significa que muitas pescarias e estoques ou não possuem regramentos ou os mesmos estão desconectados de metas e visão de médio e longo prazo. Geralmente o reflexo disso são regras pouco eficazes, parte de um arcabouço legal pouco transparente, repleto de insegurança jurídica”, explica a cientista marinha sênior da Oceana, a oceanóloga Letícia Canton.
Estoques pesqueiros com Plano de Gestão
O estudo também demonstra que apenas seis estoques possuem limites de captura. A tainha segue sendo o único recurso que possui um limite de captura e cotas definidos pelo governo brasileiro com base em avaliação de estoque recente. Os demais alvos da frota comercial que possuem limites de captura são estoques sob jurisdição da Comissão Internacional para a Conservação do Atum do Atlântico (da sigla em inglês ICCAT): albacora bandolim, albacora laje, albacora-branca e espadarte – estoques Atlântico Sul e Atlântico Norte.
Ciência para garantir a sustentabilidade
“A notícia boa da Auditoria da Pesca apresentada este ano é o fato de que a ciência pesqueira trouxe à luz, ou atualizou, informações sobre estoques dos quais se sabia pouco ou quase nada. O saber científico deve ser a base de quaisquer tomadas de decisão na política pesqueira. Ao não fazer isso o Estado assume o risco de atingir um ponto onde a sustentabilidade da atividade já não será uma opção”, alerta o diretor-geral da Oceana, o oceanólogo Ademilson Zamboni.
A oceanóloga Letícia Canton explica que essa expansão do conhecimento científico pesqueiro no Brasil já poderia ter alcançado outro patamar, caso a instabilidade institucional enfrentada pela pasta da Pesca, ao longo dos últimos anos, não fosse uma realidade. “Importantes projetos de pesquisa foram selecionados em 2015 e seu início foi postergado por três anos devido ao atraso no repasse dos recursos. Com isso, eles só foram concluídos em 2022”, complementa.
Soluções urgentes
A Oceana defende que o governo federal, por meio dos Ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e da Pesca e Aquicultura (MPA) – hoje corresponsáveis pela gestão da pesca – atuem rapidamente para promover o uso sustentável dos recursos pesqueiros marinhos e a otimização dos benefícios econômicos das pescarias.
“É preciso transparência, participação social e amplo uso das informações científicas para resolver a grave situação em que se encontra a pesca no Brasil. Promover, com urgência, as reuniões dos Comitês Permanentes de Gestão Pesqueira (CPGs), dar acesso aos dados para a sociedade nos canais do governo e estabelecer limites de captura são medidas que precisam ser tomadas já”, reforça o diretor-geral da Oceana.
Fonte: portaldoagronegocio