Os poucos meses em que morei na Itália foram suficientes para me doutrinarem: na minha cabeça, uma boa pizza tem que ter massa fina e recheios bem dosados, sem exageros. Mas eu sabia que, uma vez em Chicago, era mandatório guardar um espacinho — ou melhor, um espação — para experimentar a sua famosa deep dish pizza. Assadas em formas altas, as icônicas pizzas da cidade possuem bordas de três a quatro dedos de altura e, o mais impressionante, recheios que acompanham essa mesma estatura, quase como uma torta.
Nada melhor do que experimentar uma deep dish pizza no lugar em que ela foi inventada, certo? Bom, mais ou menos. Para escapar de uma chuva repentina, acabei parando debaixo do toldo da Pizzeria Uno, que afirmava, em um quadro pendurado na parede, ter sido o “local de nascimento” da receita, em 1943. Ao lado, recortes de jornal da época anunciavam a abertura do estabelecimento, que prometia servir uma pizza singular.
Com pé-direito baixo e paredes escuras, o salão era cavernoso e muito bonito. Logo uma garçonete se aproximou aconselhando fazer o pedido rápido, já que as pizzas demoravam para assar — o que eu descobri, mais tarde, ser um padrão nos restaurantes de deep dish pizza. Escolhi uma das especialidades da casa, a Spinoccoli, que leva espinafre, brócolis, um blend de queijos, um pouco de alho e, como descrito no próprio cardápio, um molho de tomate “pedaçudo”.
Meia hora depois, chegou à mesa a grandalhona que, infelizmente, não agradou. A massa me pareceu dura e o tal do Spinoccoli não convenceu. Hora de apurar as informações. De fato, a deep dish pizza foi inventada na Pizzeria Uno (que na época tinha outro nome). Mas há fontes que afirmam que a receita foi criada pelo gerente do restaurante, Rudy Malnati, ou por seu filho que era bartender, Lou Malnati. E há ainda quem diga que a deep dish pizza atual é resultado de um aprimoramento feito pela cozinheira Alice Mae Redmond.
Esses nomes todos interessam porque deram origem a outras duas pizzarias, tão icônicas quando a Pizzeria Uno e que também disputam os méritos por criar a receita: a Gino’s East, de 1966, e a Lou Malnati’s, de 1971. Quando ainda trabalhava na Pizzeria Uno, Alice Mae Redmond achava a massa da deep dish pizza dura (!) e teria feito mudanças para deixá-la mais macia. Concordo totalmente com você, Alice! E, assim, lá fui experimentar a versão da Gino’s East.
Encontrei outro salão descolado, com paredes totalmente cobertas por rabiscos e telões exibindo partidas de todos os esportes imagináveis para uma clientela que empunhava copões de cerveja. Dessa vez, escolhi um sabor mais clássico, pepperoni, que levou quarenta minutos para chegar. Agora, sim! A deep dish do Gino’s tinha uma massa bem gostosa e era um pouco mais baixa, o que a deixava muito mais equilibrada de forma geral.
Em uma cidade com tantas coisas gostosas para comer, ficou faltando tempo (ou seria espaço no estômago?) para provar a Lou Malnati’s, que foi fundada pelos dois ex-funcionários da Pizzeria Uno e também é muito elogiada.
Mas acabei gostando tanto da deep dish pizza que antes de deixar Chicago consegui encaixar uma “saideira” na Giordano’s, que ficava bem perto do hotel onde eu estava hospedada, o Peninsula. Esperei coisa de vinte minutos no salão grande e moderninho até chegar a minha pepperoni. No fim, foi a melhor pizza de todas: a massa era crocante na medida e o molho de tomate, que cobria todo o topo, excelente.
Eis que eu descubro que, enquanto a Uno, a Gino’s e a Lou discutem quem merece os créditos pela invenção da deep dish pizza, a Giordano’s afirma que a sua receita foi trazida a Chicago por dois imigrantes da — veja só — Itália, cuja família preparava essa pizza em ocasiões especiais há mais de 200 anos em Turim, seguindo uma receita da “Mamma” Giordano. Mais um pouco de pesquisa e, realmente, em Turim existe há tempos a “pizza al padellino”, assada em panelas altas e redondas e, devo dizer, bem parecida com a deep dish pizza.
Fonte: viagemeturismo