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Confissões sobre o arbítrio do STF: polêmicas reveladas em meio a debates calorosos

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“O tribunal, Alexandre de Moraes em especial, foi além de suas atribuições em vários momentos – e tudo bem, porque foi por ‘boa causa’, mas agora chega” – foi com essas palavras que uma colunista de um grande jornal brasileiro resumiu um pensamento cada vez mais prevalente entre a opinião pública. Com a conclusão do processo em que Jair Bolsonaro foi condenado por tentativa de golpe de Estado e outros crimes, e com o início do cumprimento da pena do ex-presidente na Polícia Federal em Brasília, colunistas e editoriais em grandes publicações estão admitindo que sim, o STF saiu das quatro linhas para conseguir conter o “golpismo”, mas agora é necessário voltar a seguir as regras.

Esta onda de confissões, no entanto, ainda vem tímida. Como se os eufemismos estivessem em oferta na Black Friday e os autores dos textos tivessem comprado todos os que viram, espalham-se no fim de novembro frases e expressões como “zona de sombra”, “práticas que, em circunstâncias ordinárias, seriam frontalmente repudiadas”, “flexibilizações preocupantes”, “máculas no processo”, “medidas excepcionais que concentram poder”, “poderes extraordinários” e “a participação ativa do Judiciário na fase investigativa pode ter comprometido a imparcialidade” (destaque nosso). É muito esforço para contornar a verdade óbvia e muito inconveniente: a de que o Supremo só conseguiu condenar Bolsonaro, os outros supostos “golpistas” e os manifestantes do 8 de janeiro atropelando a Constituição e os códigos processuais, e criando um regime de exceção.

No caso de Bolsonaro e do 8 de janeiro, a imprensa, quando intuía que havia algo de errado, tolerou os abusos, quando não justificou e até aplaudiu tudo. Afinal, eram “circunstâncias” extraordinárias; a “causa era boa”

Todas as expressões citadas acima, se fossem traduzidas para o português claro, significariam abuso de poder, violação de garantias democráticas básicas, extinção do devido processo legal, cerceamento de defesa, processos conduzidos sem respeito ao juiz natural, condenações sem provas, a instituição de crimes de opinião, condenações por crimes que não foram sequer tentados. Uma lista enorme de, na mais benigna das hipóteses, irregularidades processuais grotescas. Um único destes itens já bastaria para se anular um processo inteiro – e por muito menos o Supremo já anulou (equivocadamente) condenações e processos da Lava Jato, cujos crimes foram reais e confessados por seus autores.

Mas, no caso de Bolsonaro e do 8 de janeiro, essa mesma imprensa, quando intuía que havia algo de errado, tolerou, quando não justificou e até aplaudiu tudo. Afinal, eram “circunstâncias” extraordinárias; a “causa era boa”. Sem esse apoio (ou ao menos sem essa omissão), Moraes e o Supremo jamais teriam conseguido fazer o que fizeram. Em outras palavras, o que esses neocríticos do STF relutam em admitir é que, por anos, eles endossaram a ideia de que, para “defender a democracia” e “derrotar o bolsonarismo” (nos dizeres de um agora ex-ministro do Supremo), os fins justificaram os meios. Mas isto já não é direito, muito menos democracia: é a validação do uso puro e simples da força – não pelo fuzil, mas pela caneta.

Pois são esses mesmos que agora vêm pedir “autocontenção” ao Supremo. “Esperamos terem sido excepcionais e transitórios”, diz outro colunista a respeito dos “poderes extraordinários” assumidos pela corte. Depois de apoiar Moraes e o STF quando eles transformaram o Brasil em uma autocracia (porque, afinal, mais importante era colocar Bolsonaro na cadeia), agora pedem que, por gentileza, guardem seus superpoderes de volta em alguma gaveta – mas pedem com educação, para não serem confundidos com “inimigos da democracia” e acabarem incluídos em algum inquérito sigiloso. Suprema ingenuidade. “O poder absoluto corrompe absolutamente”, dizia Lord Acton; esse gênio não volta para a garrafa por livre e espontânea vontade, como Gilmar Mendes acaba de demonstrar com suas mudanças na lei do impeachment.

Se agora os formadores de opinião julgam que o Supremo exagerou e precisa voltar à normalidade, precisarão fazer logo algo que a imprensa demorou décadas a fazer no caso do golpe de 1964: admitir que erraram ao apoiar o arbítrio e a ilegalidade, mesmo considerando que havia uma “boa causa”. Precisarão se juntar ao clamor pela correção dos abusos, pela transparência sobre o tamanho da sanha censora do Supremo, pela abertura da CPI do Abuso de Autoridade. Mas terão de fazê-lo com firmeza e coragem, em vez de recorrer a afirmações envergonhadas sobre a ação do STF e que não admitem abertamente sua cumplicidade na construção do atual estado de coisas.

Fonte: gazetadopovo

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