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Estudo revela a origem das misteriosas faixas escuras que cobrem Marte

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Milhões de linhas escuras que surgem de maneira repentina em encostas marcianas intrigam cientistas desde a década de 1970. Essas marcas compridas e estreitas aparecem onde antes havia apenas poeira clara e podem se estender por centenas de metros.

Como escurecem o terreno e depois desbotam lentamente ao longo dos anos, passaram muito tempo associadas a possíveis sinais de água corrente – uma hipótese que estimulou debates acalorados, já que a presença do líquido em Marte seria um marco para a busca por vida.

Mas um novo estudo publicado na revista Nature Communications mostra que a explicação é outra. Essas linhas são produzidas por processos inteiramente secos, movidos por poeira, areia e ventos capazes de deslizar a capa superficial do solo.

Como faixas escuras se formam?

As slope streaks (“faixas de declive”, em tradução literal) nascem quando a “película” de poeira clara que recobre boa parte do planeta vermelho se solta de repente e escorrega ladeira abaixo, deixando exposto um material mais escuro que fica logo abaixo dessa camada.

A poeira fina funciona como uma superfície frágil e pouco aderente. Basta que algo perturbe essa capa – como vento forte, areia em movimento ou pequenas vibrações – para que um pedaço descole e produza uma faixa escurecida que fica marcada por anos.

Durante muito tempo, acreditou-se que derretimento de gelo poderia provocar esse descolamento, porque algumas marcas apareciam em épocas ligeiramente mais quentes. Mas, com o acúmulo de imagens de alta resolução enviadas por sondas da Nasa e da Agência Espacial Europeia (ESA), a teoria começou a perder força.

Muitas linhas surgiam em regiões frias demais para permitir água líquida, ou em épocas impróprias para degelo. Faltava, porém, um mapa global de Marte capaz de revelar o comportamento dessas marcas ao longo do tempo – algo que nenhuma missão tinha produzido até agora.

Essa lacuna foi preenchida no novo estudo liderado por Valentin Tertius Bickel, da Universidade de Berna (Suíça). Ele analisou quase duas décadas de imagens da câmera CTX, a bordo da sonda Mars Reconnaissance Orbiter, que monitora o planeta vermelho desde 2006.

Para lidar com o volume colossal de dados, Bickel usou um algoritmo de aprendizado profundo treinado para identificar automaticamente as faixas, diferenciando-as de sombras, rochas e outros padrões naturais. O resultado foi um conjunto de mais de 2,1 milhões de detecções, que permitiu estimar a existência de 1,6 milhão de marcas distintas espalhadas pelo planeta.

Esse levantamento revelou que as faixas se concentram sobretudo em cinco regiões: Amazonis, Olympus Mons Aureole, Tharsis, Arabia Terra e Elysium. Essas áreas compartilham três condições essenciais: encostas íngremes, abundância de poeira fina e disponibilidade de areia solta. Com essa combinação, qualquer perturbação pode desencadear uma pequena avalanche superficial.

O estudo também mostra como essas pequenas avalanches ocorrem. Durante boa parte do ano, os ventos marcianos não são fortes o suficiente para mover areia. Mas, entre o fim da primavera e o outono no Hemisfério Sul, a velocidade do vento aumenta e atinge um ponto crítico. Quando isso acontece, grãos de areia do tamanho da ponta de um alfinete começam a saltar (ou quicar) sobre o solo. 

Cada grão que salta bate no chão e chuta partículas de poeira muito menores, descolando a camada superficial clara. A partir daí, a poeira escorrega encosta abaixo e forma a faixa escura.

O estudo também esclarece por que essas raras “mini-avalanches” nunca foram observadas no momento em que surgem. As condições ideais – ventos fortes, poeira abundante e mudança brusca de temperatura – tendem a ocorrer ao amanhecer ou ao anoitecer, quando o ar próximo ao chão sofre rápidas variações térmicas. No entanto, quase todas as sondas registram imagens ao meio-dia local, quando a iluminação é mais estável. 

Missões como a ExoMars Trace Gas Orbiter, que conseguem fotografar Marte nos dois extremos do dia, começaram apenas recentemente a mostrar sinais indiretos desses eventos, como no Apollinaris Mons, onde uma avalanche de poeira foi registrada no fim de 2023.

O novo levantamento mede com precisão a taxa de renovação das faixas. Cada local ativo ganha de 4 a 6% de novas marcas por ano marciano, o que significa que as linhas escuras que vemos hoje serão substituídas por completo em algumas décadas.

Em números absolutos, isso corresponde a 80 mil novas faixas criadas todos os anos. É uma dinâmica muito mais intensa do que se imaginava.

Já os processos antes considerados candidatos principais, como impactos de meteoritos e tremores internos, se mostraram exceções minúsculas. Entre milhões de marcas registradas, apenas 255 puderam ser ligadas diretamente a impactos. 

Apesar de cobrirem apenas uma fração minúscula da superfície marciana, as faixas podem ter impacto expressivo no clima do planeta. Isso porque cada uma desloca uma quantidade de poeira fina. Somando todas as marcas formadas ao longo de um ano, o volume de poeira que chega à atmosfera pode representar até um terço do total anual transportado por tempestades e redemoinhos.

Como a poeira influencia na temperatura, na opacidade da atmosfera e na formação de tempestades, compreender esse processo é fundamental para futuras missões robóticas e humanas. Painéis solares, radares e até sistemas de suporte à vida podem ser afetados pelo pó em suspensão.

Para Colin Wilson, cientista do projeto ExoMars Trace Gas Orbiter, “essas observações podem levar a uma melhor compreensão do que acontece em Marte hoje”. “Obter observações contínuas, de longo prazo e em escala global que revelem um planeta dinâmico é um objetivo fundamental das sondas orbitais atuais e futuras”, disse em comunicado.

Fonte: abril

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