Em 1908, no estado americano do Wyoming, o caçador de fósseis Charles H. Sternberg fez uma descoberta. Durante uma escavação, ele desenterrou o esqueleto de um Edmontosaurus, um dinossauro herbívoro de bico achatado, envolto em pele fossilizada. O achado, enviado ao Museu Americano de História Natural, foi considerado na época “não apenas um esqueleto, mas uma múmia genuína de dinossauro”.
Um ano depois, Sternberg e seus filhos voltaram à mesma região e encontraram outro exemplar semelhante, com a mesma característica mumificada. Desta vez, a amostra foi enviada para um museu na Alemanha.
Desde então, a área ficou conhecida entre os cientistas como um local de preservação incomum. O ponto misterioso recebeu um novo nome: a “zona das múmias” (the mummy zone, em inglês).
Essa faixa de aproximadamente dez quilômetros de largura, localizada no leste de Wyoming, guarda fósseis raríssimos que preservam não apenas ossos, mas também tecidos externos – como pele, cascos e escamas – de criaturas que viveram há mais de 66 milhões de anos, nos últimos momentos do período Cretáceo. São partes do corpo que se decompõem mais rapidamente, e é por isso que encontrá-las nesse estado de preservação é tão especial.

Em 2001, o paleontólogo Paul Sereno, da Universidade de Chicago, levou um grupo de alunos para explorar a zona das múmias. E o que começou como uma simples expedição de campo transformou-se em uma redescoberta histórica graças a dois novos fósseis de Edmontosaurus, apelidados de Ed Jr. e Ed Sr., ambos extremamente detalhados e bem preservados.
Ed Jr. revelou uma crista ao longo do pescoço e das costas, coberta por pequenas escamas semelhantes às de lagartos modernos. Ed Sr., por sua vez, apresentava pele enrugada, cascos nas patas traseiras – em vez de garras – e uma fileira de espinhos ao longo da cauda, uma combinação nunca antes observada em dinossauros desse grupo.
Os fósseis foram preparados no laboratório de Sereno, e as análises detalhadas – incluindo tomografias computadorizadas e exames em microscópios eletrônicos – trouxeram uma surpresa: nenhum traço de matéria orgânica havia sobrevivido. A carne e a pele haviam se decomposto completamente antes da fossilização.
Mas como? O segredo da preservação, segundo um estudo publicado na última quinta (23) na revista Science, está nos microrganismos.
Após a morte, os corpos desses dinossauros provavelmente secaram sob o sol, até que uma enchente os cobriu com lama e sedimentos. Nesse ambiente, colônias microbianas formaram uma película biológica que cobriu as peles já ressecadas. Isso se transformou em uma camada de argila, moldando cada escama, ruga e casca com precisão microscópica.
Sereno explicou ao jornal The New York Times que o processo funciona da mesma maneira que uma rotina de skincare com argila. “Quando você esfrega argila no rosto, ela penetra em todos os poros”, diz Sereno. “Quando você toca nesses fósseis e olha para os dedos, ainda vê vestígios de argila.”
O processo costuma ocorrer em ambientes marinhos calmos, não em vales fluviais sujeitos a enchentes sazonais – como era o caso de Wyoming durante o final do Cretáceo, quando a região fazia parte de uma planície costeira banhada por rios e lagoas.
Além dos Edmontosaurus, a área também produziu fósseis de Tyrannosaurus rex e Triceratops com impressões de pele preservadas, sugerindo que a “zona das múmias” pode ter sido um ponto de concentração de cadáveres que, por um conjunto único de condições geológicas e biológicas, escaparam da decomposição total.
Para Sereno, os novos achados permitem reconstruir o Edmontosaurus com uma fidelidade inédita. “Pela primeira vez, acho que conseguimos reproduzir completamente a aparência do Edmontosaurus. Poderíamos colocá-lo em um filme de Hollywood e ele seria cientificamente preciso da cabeça aos pés”, afirmou ao jornal nova-iorquino.
Fonte: abril






