Que as mulheres vivem mais que os homens você já sabe. Segundo a OMS, a expectativa de vida delas é maior em praticamente todos os países do mundo. E isso não é exclusivo dos humanos: em quase todos os mamíferos, as fêmeas vivem mais do que os machos. Por mais que dezenas de vídeos no Instagram possam justificar essa hipótese – como o de homens colocando voluntariamente fogo em suas roupas ou a enfiando mão na boca de um jacaré –, existe uma explicação científica por trás da longevidade feminina: o hábito sexual.
Um estudo publicado na revista Science Advances, analisou dados de 528 espécies de mamíferos e 648 espécies de aves mantidas em zoológicos ao redor do mundo, além de informações sobre 110 espécies em ambientes selvagens. Foi o levantamento mais extenso já realizado sobre diferenças sexuais na expectativa de vida.
Entre os mamíferos, o resultado foi claro: as fêmeas vivem, em média, 12% mais que os machos. Nas aves, a tendência se inverte – os machos vivem 5% mais.
Segundo Fernando Colchero, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, na Alemanha, e autor do estudo, essas diferenças não são apenas genéticas. Elas refletem também como cada sexo investe energia para sobreviver, competir e se reproduzir.
Uma das chaves para essa diferença está no código genético. Em mamíferos, as fêmeas possuem dois cromossomos X, uma espécie de seguro biológico contra mutações. Já os machos, com apenas um X e um Y, não têm essa proteção.
A teoria, chamada de hipótese sexual heterogamética, também explica o padrão inverso entre as aves. Nelas, os machos possuem dois cromossomos Z, enquanto as fêmeas têm apenas um Z e um W – invertendo o “privilégio genético”.
“Se houver mutações no cromossomo X, e se você tiver apenas uma cópia desse cromossomo X, você essencialmente não terá um backup. Portanto, essas mutações acabarão sendo prejudiciais e reduzirão sua longevidade”, disse Colchero à CNN.
Mas os genes não contam toda a história. As exceções (como fêmeas de falcões e gaviões, que vivem mais que os machos) mostram que a natureza raramente segue regras absolutas.
Entre os fatores comportamentais, a seleção sexual aparece como um dos principais motores da diferença. Em muitas espécies, os machos investem quantidades descomunais de energia em competir por parceiras – crescendo mais, exibindo chifres, cores ou galhadas e travando lutas violentas. “Esses machos estão sacrificando parte da própria sobrevivência em nome da reprodução”, afirmou Colchero ao jornal.
Uma prova disso é que, em espécies não monogâmicas, nas quais os machos competem intensamente, as fêmeas tendem a viver mais. Já nas espécies monogâmicas, as diferenças de longevidade entre os sexos são menores.
O estudo também testou a hipótese do custo da reprodução: segundo essa ideia, o esforço da gestação e dos cuidados com os filhotes encurtaria a vida das fêmeas. A surpresa foi descobrir o contrário. Em zoológicos, fêmeas que cuidam de filhotes vivem mais (em alguns casos, muito mais) do que os machos da mesma espécie.
“Parece contraintuitivo porque, para qualquer pessoa que tenha bebês, cuidar de filhotes consome uma energia enorme. E você imaginaria que essa energia viria às custas da sobrevivência”, observou Colchero.
Mas, do ponto de vista evolutivo, faz sentido. O sexo que cuida precisa sobreviver por mais tempo, especialmente nos casos em que o filhote é dependente do genitor. Garantir que a criança chegue até a idade adulta para se reproduzir é garantir também o futuro da espécie
Entre as aves de rapina, por exemplo, as fêmeas – maiores, agressivas e ativas em defesas territoriais – desafiam o padrão masculino de longevidade. Essas exceções, dizem os autores, indicam que a evolução pode ter desenvolvido múltiplas estratégias de sobrevivência dentro de grupos distintos.
As mulheres, assim como as fêmeas de mamíferos, vivem mais do que os homens em pelo menos 5 anos – mostrando que as leis evolutivas também moldam nossa espécie.
O gene egoísta
Fonte: abril