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Educação Econômica: Como Preparar Jovens para o Futuro Financeiro

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Os jovens brasileiros chegam à maioridade em um país em que 77,6% das famílias estão endividadas, 29,5% atrasadas com suas obrigações e 12,1% afirmaram que não terão condições de liquidarem suas obrigações, segundo a pesquisa Nacional de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, de junho de 2025, da Confederação Nacional do Comércio (CNC). Este cenário reflete a importância da educação e o letramento financeiro desde cedo.

O letramento financeiro, entendido como a soma de conhecimentos, habilidades e atitudes que permitem tomar decisões financeiras seguras, é hoje amplamente reconhecido como competência indispensável ao bem-estar econômico das pessoas. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o letramento financeiro envolve mais do que compreender noções básicas, como juros compostos ou inflação, mas também abarca a aplicação destes conceitos em situações práticas e cotidianas.

Ensinar educação financeira cedo não é treinar jovens para o consumismo, mas ajudá-las a ligar escolhas e renúncias presentes a consequências futuras

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), homologada em 2017, passou a exigir, a partir de 2020, que escolas de todo o país ensinem finanças pessoais de forma transversal e aplicada, não apenas nas aulas de Matemática, mas em diversas disciplinas. O objetivo é que o aluno aprenda a planejar gastos, entender contratos, poupar e investir antes mesmo de receber o primeiro salário. A educação financeira, já na formação básica, surge não só como um instrumento para mitigar esses riscos, mas também como uma atuação preventiva, capacitando futuros adultos a lidar com os desafios financeiros de forma mais proativa.

A urgência tem razões que vão além das parcelas do cartão. Embora a taxa de desemprego geral tenha recuado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ela ainda alcança 14,9% entre jovens de 18 a 24 anos – o dobro da média nacional. A disputa por postos formais tende a ficar mais difícil à medida que automação e inteligência artificial substituem tarefas repetitivas e operacionais, deslocando o início da vida laboral para trabalhos temporários, intermitentes ou sem carteira assinada. Quem chega ao mercado tendo refletido sobre orçamento, reserva de emergência e qualificação profissional tem mais chance de enfrentar estes novos obstáculos.

Há também o horizonte da aposentadoria. Mesmo após a reforma de 2019, o déficit do Regime Geral da Previdência Social superou R$ 300 bilhões em 2024 e projeta trajetória ascendente conforme o país envelhece. Isso significa que a geração que hoje cursa o ensino médio não poderá contar apenas com as pensões do INSS para manter o padrão de vida – poupança de longo prazo para a geração de investimentos e empreendedorismo serão indispensáveis para obtenção de renda complementar.

Ensinar educação financeira cedo não é treinar jovens para o consumismo, mas ajudá-las a ligar escolhas e renúncias presentes a consequências futuras: usar o crédito com parcimônia, comparar custos para a sua qualificação versus renda esperada, proteger-se contra golpes virtuais, perceber que o adiamento de pequenos desejos pode financiar grandes projetos – da faculdade ao primeiro negócio. Ao mesmo tempo, a alfabetização econômica favorece um olhar crítico sobre políticas públicas: entender juros, inflação, impostos e previdência torna o cidadão menos vulnerável a promessas populistas e mais apto a cobrar transparência e resultados.

Para que a BNCC tenha maiores chances de sucesso, três pontos merecem atenção. Primeiro, material didático contextualizado: falar de juros compostos usando exemplos de boletos, fintechs e micro empreendimentos que façam sentido no ambiente do aluno. Segundo, formação docente contínua para os tópicos de educação financeira – o professor de História pode discutir bolhas financeiras, o de Língua Portuguesa pode analisar contratos de crédito, o de Geografia aborda espaços econômicos globais e interações comerciais entre países, o de Ciências comentaria sobre consumo responsável e sustentável, mas todos precisam de suporte mínimo. Terceiro, parceria com famílias e comunidade: oficinas abertas, feiras de empreendedorismo e jogos de orçamento aproximam teoria e a prática para soluções de problemas reais.

O retorno social de investir nessa agenda é alto. Estudos do Banco Mundial indicam que pontos a mais no índice de letramento financeiro médio de uma população gera reduções significativas na inadimplência das famílias no prazo de cinco anos. No caso brasileiro, cada centavo economizado por um jovem hoje alivia a pressão futura sobre programas de assistência e sobre a própria Previdência.

A educação financeira não é vacina contra todas as incertezas, mas funciona como um guia para transitar com mais segurança em um mundo com poucos empregos formais no futuro e um longo tempo de contribuição para um valor cada vez mais baixo de aposentadoria. Quando a escola ensina a diferença entre desejo e necessidade, crédito e dívida, curto e longo prazo, ela entrega a esse jovem algo que nenhuma oscilação do mercado lhe poderá tomar: a capacidade de escolher o futuro que deseja construir. Com isto, a educação financeira nos jovens não beneficia apenas o indivíduo, pois ela se transforma em um recurso comunitário que fortalece a saúde econômica de todo o núcleo familiar.

A escola não pode prometer entregar riqueza fácil e rápida com a educação financeira. Contudo, pode entregar o que há de mais poderoso: a capacidade de escolher. Escolher se vale a pena parcelar, se é hora de assumir um empréstimo ou financiamento, se convém abrir um pequeno negócio ou se o que eu estou comprando é realmente em função das minhas necessidades e prioridades. Sem essa bússola, o jovem e sua família navegam sem destino, à mercê da próxima propaganda que promete felicidade e status social. Com ela, passam a navegar por mares turbulentos com a convicção de que, se não dá para controlar o vento da economia, ao menos é possível ajustar as velas do próprio barco para chegar ao seu destino. Em tempos de incerteza, esse é o verdadeiro patrimônio que a escola pode legar. Além disso, o ensino formal de finanças é uma política pública que reduz a desigualdade de conhecimento entre os diferentes grupos da população, beneficiando sobretudo jovens de famílias menos favorecidas, que raramente têm contato com práticas de planejamento financeiro em casa. Assim, levar letramento financeiro para a sala de aula transcende a dimensão do crescimento individual e se converte em política pública estratégica para o fortalecimento da economia e contra a vulnerabilidade financeira das classes menos favorecidas.

Rubens Fernandes Moura é professor de Economia da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio.

Fonte: gazetadopovo

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