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Aumento rápido de fraudes em artigos científicos, alerta estudo

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Há alguns anos, pesquisadores alertam que resultados falsos estão se infiltrando na literatura acadêmica em ritmo crescente. Agora, uma nova análise estatística não só confirma esses temores, como mostra que a escala do problema é muito maior do que se imaginava.

Uma equipe de pesquisadores, liderada pelo cientista de dados Luís A. Nunes Amaral, da Northwestern University, detectou indícios de que organizações conhecidas como “paper mills” (em português, fábricas de artigos) estão produzindo estudos falsos ou de baixa qualidade em escala industrial. O problema é que as publicações estão crescendo cada vez mais, ameaçando a integridade de áreas da ciência e futuras pesquisas.

A ciência avança porque cada geração de pesquisadores se apoia nos resultados de trabalhos anteriores. É como um grande jogo de Jenga: é necessário uma base estável para que a torre cresça sem precisar começar do zero com novos blocos. 

Acontece que essa confiança nessa base está cada vez mais escassa. Já em 2010, editores e grupos de vigilância acadêmica vinham identificando um aumento de artigos com dados fabricados e imagens manipuladas. O problema se intensificou com a pressão crescente sobre jovens cientistas, para os quais publicações de alto impacto são fundamentais para conquistar vagas, promoções e financiamento.

“Se essas tendências não forem contidas, a ciência será destruída”, alertou Amaral, autor do estudo publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences, para o The New York Times.

A equipe de Amaral mapeou um banco de mais de 1 milhão de artigos, usando fóruns online de detetives acadêmicos, bancos de dados de retratações e redes de editores e autores suspeitos. Encontraram cerca de 30 mil artigos com sinais de fraude — e estimaram que o número total, fora da amostra, pode ser até cem vezes maior.

Os padrões mostraram que essas pesquisas parecem ser produzidas de assunto em assunto, ou seja, são produzidos vários estudos de um mesmo tema e publicados em curtos intervalos, muitas vezes concentrados em revistas de um mesmo grupo editorial. Imagens duplicadas apareciam em trabalhos diferentes, sugerindo que as fábricas de artigos mantêm bancos de figuras para criar lotes inteiros de pesquisas.

Segundo Anna Abalkina, pesquisadora da Free University of Berlin que estuda o fenômeno, as paper mills oferecem pacotes completos de autoria: por centenas ou milhares de dólares, qualquer cientista pode comprar um lugar na lista de autores de um artigo que, muitas vezes, nunca ajudou a escrever. Em alguns casos, esses artigos são criados internamente, com textos e figuras gerados ou adaptados com inteligência artificial para escapar de detectores de plágio.

O crescimento é exponencial. O número de artigos suspeitos dobra a cada um ano e meio, muito mais rápido que a taxa geral de publicações científicas, que dobra a cada 15 anos. Certas áreas, como pesquisas sobre microRNA e sua função no câncer, já estão saturadas por estudos questionáveis. Mas os pesquisadores preveem que logo as fábricas de papel infiltrarão outras áreas de estudo. “O risco é que cada vez mais áreas da ciência sejam envenenadas, de modo que nenhum cientista respeitável entre nelas, porque a área está inundada de lixo”, disse o Amaral para o jornal norte-americano.

E a tendência pode piorar com o avanço de ferramentas de IA capazes de gerar imagens e dados sintéticos indetectáveis. Abalkina diz que ela e seus colegas testaram ferramentas disponíveis em algumas IAs e descobriram que imagens fabricadas por elas já podem não serem mais reconhecidas como falsas. As pesquisas fraudulentas ganharam mais um aliado: a criação de imagens sob demanda. 

A descoberta vem em tempos de uma denúncia recente: a revista japonesa Nikkei investigou artigos científicos em pré-publicação e descobriu prompts escondidos nos textos pedindo para que, caso o estudo fosse revisado por alguma inteligência artificial, fossem relevados aspectos negativos da pesquisa e fizessem elogios sobre o resultado final da publicação. Em tempos que 1 em 5 revisores usa IAs para a análise de textos, os prompts passaram batido e muitos desses estudos foram publicados, mesmo com seus pontos negativos ou até mesmo errados presentes.

Para Amaral, soluções tradicionais como retratar artigos não são suficientes: “É como tentar drenar um vazamento gigantesco com um copo de água. Simplesmente não vai funcionar”, disse ao New York Times

Fonte: abril

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