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De Evita a Madame Mao: as primeiras-damas mais mandonas da história

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“Não sou primeira, nem dama”, disse Irina Karamanos, a companheira do presidente chileno Gabriel Boric.

Com toda razão, ainda mais para uma dirigente feminista de esquerda. O título não-oficial da mulheres dos presidentes, uma invenção americana do século XIX, é anacrônico, ultrapassado e até incompatível com os tempos atuais.

Mas em lugar de ir cuidar de seus assuntos, ela fez o marido criar o Gabinete Irina Karamanos, de onde pretendia mandar numa longa lista de assuntos de sua preferência. É claro que não deu certo e Boric rapidamente acabou com a experiência, que pode ser creditada ao excesso de entusiasmo progressista do jovem casal – ele com 36 anos; ela, 33.

Permanece porém a impressão de que Irina, sem ter sido eleita para nenhum cargo, tentou ganhar uma posição indevida.

A história de mulheres que terceirizam o poder através dos maridos é longa e atribulada. A mais conhecida e próxima de nós é a de Eva Duarte, a Evita de Juan Perón, elevada a mãe dos pobres em vida e a mito do movimentado panteão argentino ao morrer aos 33 anos de câncer no útero.

A trajetória de seu corpo embalsamado e venerado num caixão de vidro na sede da CGT, como uma Bela Adormecida populista, foi mais movimentada ainda do que numa vida em que deu um salto histórico ao passar de atriz de rádio para favorita de Perón.

O líder argentino repetiu a dose 22 anos depois, colocando outra mulher do ramo do entretenimento noturno, a ex-dançarina Isabelita, como sua vice e substituta no que deveria ser uma restauração gloriosa, mas acabou em desastre.

Perón morreu menos de um ano depois de voltar do exílio e ser reeleito presidente. Isabelita assumiu um governo que já estava corroído pelas brigas internas do peronismo. Acabou deposta pelos militares, o que deu início ao período de trevas da ditadura.

Ao contrário, o afastamento e prisão da mulher de Mao Tsé Tung, Jiang Qing, depois da morte do imperador vermelho, abriu caminho para a modernização da economia da China.

Jiang Qing, chamada originalmente em países ocidentais de Madame Mao, era o mal encarnado na Gangue dos Quatro, facção extremista dentro de um movimento já radical do Partido Comunista da China, a Revolução Cultural.

A ex-atriz de cinema comandava o setor cultural – obviamente com o viés anticultural que pretendia exterminar todos os laços da sociedade com seu passado. A catástrofe nos métodos produtivos, com a transferência em massa de habitantes das cidades para o campo, provocou quebras de produção que levaram à morte por fome de um número calculado em até 30 milhões de chineses.

Depois da morte de Mao, a ala comandada por Deng Xiaoping assumiu o poder e os integrantes da Gangue dos Quatro foram presos e condenados. Jiang Qing pegou pena de morte, comutada para prisão perpétua. Suicidou-se depois de ser liberada para tratamento médico, tão radical quanto sempre havia sido.

A Ásia é fértil em mulheres de líderes políticos que se tornaram escandalosamente poderosas – e nenhuma provavelmente ultrapassa a extravagância de Imelda Marcos, transformada em sinônimo dos excessos que os regimes ditatoriais permitem.

Quando o marido, Ferdinand Marcos, foi forçado a abandonar o poder, entraram para a história as cenas de cidadãos comuns olhando os milhares de pares de sapato que a “Borboleta de Ferro” havia deixado para trás.

Por incrível que pareça, Imelda não só voltou às Filipinas como seu filho, Bongbong Marcos, foi eleito presidente e tomou posse em junho. Os processos por corrupção contra Imelda desmancharam-se no ar.

Mary Todd Lincoln foi a primeira mulher de presidente a ser chamada de “primeira dama” pela imprensa. Como não é raro, Eleanor Roosevelt estava mais à esquerda que o marido, Franklin Delano Roosevelt. Viviam vidas separadas Seu relacionamento com a jornalista Lorena Hickock produziu cartas de amor francas e apaixonadas.

Eleanor é unanimemente considerada a mulher de presidente americano mais influente, excetuando-se casos acidentais como o de Edith, transformada praticamente em a dona do poder real depois que seu marido, Woodrow Wilson, sofreu uma série de derrames e ficou, na prática, incapacitado.

De todas, a única que seguiu carreira política própria foi Hillary Clinton. Também criou controvérsias que reverberam até hoje. Na primeira eleição, Bill Clinton fez campanha propondo “eleja um e leve dois”, exaltando a capacidade da mulher. Não deu muito certo. A reforma no sistema de saúde que ela encabeçou acabou engavetada e muitos americanos rejeitaram a ideia de que a mulher do presidente, sem ter sido eleita para nada, exerça influência para além da intimidade do casal.

Depois deixar a Casa Branca, Hillary foi eleita senadora e virou ícone feminista, apesar do papel bem tradicional de mulher que “perdoa” as infidelidades do marido. Tinha certeza de que se transformaria num caso raro – com precedente na Argentina do casal Kirchner – de marido e mulher que são eleitos presidentes. Um certo Donald Trump apareceu em seu caminho, levando à Casa Branca a mais bela primeira dama de todos os tempos, com a possível exceção de Carla Bruni, na França.

A hierática e silenciosa Melania enfrentou o ódio nada disfarçado de todas as forças antitrumpistas do universo.

Assim como ter a fama de mandonas, levar pancada por causa do marido é uma das sinas das primeiras-damas. E não falar muito para não atrapalhar. Michelle Obama sabotou a si mesma ao ser filmada, ainda antes da posse do marido, dizendo que “pela primeira vez” sentia orgulho dos Estados Unidos. Apesar da popularidade altíssima, teve que passar oito anos mordendo a língua para não dar argumentos aos adversários do marido.

No escurinho do off, não são só adversários que criticam: partidários reclamam anonimamente quando as esposas influenciam demais.

Em países parlamentaristas, as mulheres dos chefes de governo aparecem bem menos. As funções mais cerimoniais são exercidas pelos chefe de Estado, eleitos ou hereditários, como no caso das monarquias. Na Inglaterra, a mulher do primeiro-ministro não é convidada para vários eventos oficiais – o que não impediu Carrie, mulher de Boris Johnson, ex-funcionária de relações públicas do Partido Conservador, prejudicar o marido com suas interferências, levando à inevitável comparação com Lady Macbeth.

Num mundo ideal, cônjuges de governantes seguiriam suas vidas normalmente, tal como fazem os maridos de primeiras-ministras ou presidentes mulheres. Ninguém ficava discutindo, por exemplo, se Joachim Sauer, professor de física e química teórica, influenciava decisões de Angela Merkel aproveitando a proximidade no leito conjugal.

No mundo real, existe a expectativa de que mulheres dos governantes sejam discretas e de especialize na arte de engolir sapos. Anomalias autoritárias como o regime conjunto de Daniel Ortega e Rosario Murillo na Nicarágua, são uma grotesca degeneração de tudo o que esquerda já teve de idealista.,

Muitos consideram a vice-presidente, dada a práticas esotéricas, mais poderosa do que o marido, numa prova de que podemos não acreditar nelas, pero que las hay, las hay.

Fonte: Veja

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