Só cinco pessoas no mundo tiveram a experiência de ver uma cor completamente nova, fora da gama de cores naturalmente visíveis para o ser humano. Enxergar o tom inédito só foi possível graças uma nova tecnologia de estimulação da retina chamada Oz Vision, desenvolvida durante anos por pesquisadores da Universidade da Califórnia Berkeley.
“A cor é uma característica incrível de percepção visual, rica e complexa”, explica Ren Ng, professor do departamento de Ciências da Computação de Berkeley e um dos autores principais do estudo. “A maioria das pessoas que são daltônicas têm dificuldade de diferenciar algumas cores do arco-íris, mas nossa pesquisa mostra que mesmo quem tem a visão ‘normal’ pode descobrir que cores inéditas existem.”
Num experimento de prova de conceito para testar a técnica inovadora, os pesquisadores provaram que é possível superar os limites naturais da retina ao ativar células específicas do olho, os cones. Eles são os fotorreceptores responsáveis pela percepção das cores.
Estimulando individualmente milhares de cones, os participantes do estudo enxergaram uma cor impossível de ser percebida ao olho nu: um misto de azul e verde extremamente saturado que os cientistas chamaram de “olo”. Os pesquisadores conseguiram reproduzir a cor em vídeos e imagens que os participantes analisavam.
A nova tecnologia foi descrita num estudo publicado no periódico Science Advances nesta sexta, 18. O plano dos cientistas é que o Oz Vision não sirva só para fazer pessoas enxergarem novas cores, mas também para melhorar a percepção de cores de pessoas que sofrem com daltonismo.
Como funcionou o estudo
Apesar do nome, Oz não é mágica: a técnica estimula cada cone individualmente com microdoses de laser direcionadas, a partir de um mapa da retina que divide cada célula pelo seu tipo. Os cones vêm em três variedades: L (de comprimento de onda longo), M (de comprimento médio) e S (de comprimento small, curto). Para cada cor visível há um padrão diferente de ativação de células dos tipos L, M e S.
Cada uma dessas células é ativada por frequências diferentes de luz. A sensibilidade dos cones M se sobrepõe com L e S, então não dá para ativar só células M – o que acaba eliminando várias possíveis cores do nosso espectro de visibilidade possível. Num gráfico talvez dê para entender melhor:

Uma pessoa com daltonismo tem um problema nesses fotorreceptores. A forma mais comum, que confunde o vermelho e o verde, é genética: esses daltônicos nascem só com cones do tipo S e M, sem as células longas, que ajudam a discernir o vermelho.
Como as frequências que ativam M sempre acabam ativando um pouco de S e L junto, não dava para focar a estratégia nos comprimentos de onda da luz. O que a técnica Oz Vision faz é desenvolver uma abordagem inédita para o estímulo de cones, focando na distribuição espacial da luz na retina, e não em seu espectro.
O sistema Oz é uma mesa com lasers, espelhos e sensores ópticos para registrar o movimento da retina e influenciar os cones com suas microdoses repetidas de laser. Os participantes do estudo sentaram do outro lado da mesa de toda essa parafernália tecnológica, e receberam um feixe de luz laser direto na pupila. Eles conseguem manter a mira do laser nas células individuais mesmo com o movimento constante do olho, por causa de um software sofisticado de controle e rastreamento que chamam de Wizard (Mago, que nem o de Oz).
As pequenas doses de laser podem ser direcionadas só para células M, sem ativar suas vizinhas. Assim, os pesquisadores conseguiram fugir das limitações naturais da gama visível de cores.
Para provar que aquela cor induzida era, realmente, um tom novo, os pesquisadores mostraram o misto de verde e azul muito saturado ao lado da gama de cores naturalmente visível. Os participantes precisavam comparar a cor “olo” com cores existentes, mas eles não conseguiam fazer isso. Só foi possível perceber as relações depois de adicionar branco, para reduzir a saturação.
Esse primeiro teste do sistema Oz Vision mostrou que ele funciona bem. Agora, a ideia é usar essa plataforma para muito mais do que “só” mostrar uma nova cor. “A intensidade das microdoses de laser enviadas até os cones na retina é flexível, pode ser programada”, explica Ren. Isso quer dizer que a tecnologia pode ser usada para mais coisas – como ajudar pessoas que sofrem com daltonismo.
A ideia deles é “adicionar um tipo de cone virtual” para estimular a retina de pessoas daltônicas. Essa ainda é uma questão científica em aberto, que requer mais estudos e experimentos para entender se o cérebro consegue receber essa informação e aprender a diferenciar as cores.
Estudos do tipo em macacos-esquilo daltônicos tiveram sucesso em provocar o comportamento funcional de enxergar todas as cores, mas eles não sabem o que os primatas perceberam – porque eles não falam. Com humanos, em estudos futuros, a barreira da comunicação não será problema.
Fonte: abril