Ossos da mandíbula e da bochecha esquerda de um hominídeo ancestral do Homo sapiens, com algo entre 1,1 e 1,4 milhões de anos de idade, foram encontrados no sítio arqueológico Sima del Elefante, na Serra de Atapuerca, no norte da Espanha. Esse tataravô foi apelidado de Pink, em homenagem à banda britânica Pink Floyd.
Esses são os restos humanos mais antigos já encontrados no oeste da Europa, e são bastante similares – ainda que não idênticos – ao crânio e a mandíbula de um Homo erectus. O erectus é um ancestral menor e mais parrudo que o sapiens, que migrou para fora da África centenas de milhares de anos antes de nós.
Na hipótese mais popular entre especialistas, foram os erectus que deram origem aos neandertais na Europa e aos denisovanos na Ásia, bem como aos próprios sapiens na África. Acredita-se que eles foram os primeiros grandes primatas capazes de usar fogo e caçar em grupos.
Várias ossadas de erectus já foram encontradas na África e na Ásia – inclusive na Geórgia, país do Cáucaso que fica bem na fronteira entre Europa e Ásia, pertinho do Oriente Médio.
A Península Ibérica, porém, fica na extremidade oeste do continente. A comprovação de que o erectus chegou lá na outra ponta do mundo conhecido à época seria um passo além para essa área de pesquisa.
A equipe internacional de cientistas envolvida na descoberta foi liderada pela pesquisadora Rosa Huguet, do Instituto Catalão de Paleontologia Humana e Evolução Social (IPHES).
O estudo foi publicado na Nature, e afirma que é “razoável atribuir os restos humano ao Homo aff. erectus“. No jargão, a abreviação “aff.”, do latim affinis, significa que os fósseis não dão 100% de match com a espécie, mas claramente pertecem a um animal muito similar. Tem afinidade.
Não se sabe ainda se essas diferenças são suficientes ou não para classificar Pink como membro de uma nova espécie.
Antecede o antecessor
Fósseis encontrados na região de Atapuerca normalmente têm dono. Lá foi descoberta, na década de 1990, a espécie Homo antecessor, que viveu há cerca de 900 mil anos na Espanha.
Até agora, esse era considerado o hominídeo mais antigo da Europa: viveu quase meio milhão de anos antes dos neandertais. Mas o novo fóssil, nomeado de ATE7-1, não tem nada a ver com o antecessor.
A aparência do rosto remete às espécies mais antigas do gênero Homo, que se projetam para a frente. Seu nariz era plano e achatado, e suas bochechas eram proeminentes. Já os Homo antecessor tinham rostos parecidos com os dos Homo sapiens, mais retos e verticais.
A nova descoberta levou os pesquisadores, inclusive, a reavaliar a classificação de um outro osso descoberto em 2007, que se parece mais com um Homo erectus do que qualquer coisa deixada pelos Homo antecessor.
Para reconstruir o rosto a partir dos ossos fragmentados – que incluem partes da bochecha, do maxilar superior e da estrutura do nariz –, os pesquisadores combinaram técnicas tradicionais a partir da observação e inspeção com análise 3D e modelos computadorizados. Já para estimar a idade do Pink, eles calcularam a idade da camada de sedimentos em volta dos ossos com três métodos diferentes.
Essa população de hominídeos na Europa era desconhecida dos pesquisadores. Junto do fóssil do rosto, os cientistas encontraram ossos de animais com marcas de cortes e ferramentas de quartzo e sílex que provavelmente eram usadas para abater e cortar os animais. A região era ocupada por uma floresta úmida, provavelmente rica em presas para que os hominídeos pudessem caçar.
Os cientistas pretendem fazer novas escavações na região de Atapuerca para encontrar mais fósseis que possam ajudar na descrição dos companheiros de espécie de Pink. Quem sabe eles não encontram o Floyd daqui a pouco. Já dá para fazer um som.
Fonte: abril