O som é um fator crítico para a sobrevivência no fundo do mar. Espécies marinhas usam a audição para encontrar comida, se comunicar com outros animais de seu grupo, cortejar parceiros, evitar predadores e navegar.
Os Misticetos, ou baleias de barbatana (um grupo monofilético da ordem dos cetáceos que não possuem dentes), por exemplo, são craques na cantoria. As baleias jubarte, baleias-azuis, baleias-francas e cinzentas são animais enormes que dependem da música para se comunicar em um tititi constante. Mas o bate-papo eterno se mostrou perigoso para esses mamíferos.
Isso porque existe um outro animal que se beneficia do som dos misticetos: as orcas. As baleias assassinas (que ganharam o apelido mesmo não sendo tecnicamente baleias, mas definitivamente assassinas) são o único predador natural desse grupo de baleias mastodônticas – aliás, são os verdadeiros grandes predadores dos oceanos, se alimentando de mais de 140 espécies de animais marinhos.
Caçando em grupos, as orcas parecem mirar seus ataques organizados especialmente em pares de mãe e filhote. As chances de vitória são melhores para a adversária preta e branca, visto que a grande maioria das espécies de baleias de barbatana costumam nadar sozinhas. Quando atacadas, algumas espécies revidam e lutam de volta, enquanto outras escolhem fugir.
Mesmo assim, o falatório não para e as baleias continuam produzindo altos cantos subaquáticos. Então, o que impede as orcas de se concentrarem nos chamados e atacá-las o tempo todo?
Essa foi a pergunta guia do estudo publicado na Marine Mammal Science, feito por pesquisadores da Universidade de Washington. Eles descobriram que algumas espécies de baleias de barbatana fazem seus sons em uma frequência tão baixa que as orcas não conseguem captar o barulho. Essas parecem ser as baleias que escolhem fugir dos ataques, como as azuis, boreais, de Bryde, minke e fin.
As frequências são tão profundas que passam indetectáveis pelas orcas, que não ouvem sons abaixo de 100 hertz.
Já os misticetos que escolhem bater de frente com as baleias assassinas não se preocupam em abaixar a voz e cantam com tudo, em um tom bem acima dos hertz limite. O clube de luta inclui baleias francas, baleias-da-groenlândia, baleias-cinzentas e baleias-jubarte.
Para o estudo, Trevor Branch, professor de ciências aquáticas e pesqueiras na Universidade de Washington e autor principal do estudo, conduziu uma série de experimentos sobre audição das orcas, revisando a frequência da fonte e o nível da fonte das populações de todas as baleias de barbatanas.
Branch juntou essas informações com o conhecimento de como os sons se movem pelo oceano para prever quais populações de baleias podem ser facilmente ouvidas pelas orcas.
O autor e sua equipe descobriram que os chamados de espécies de fuga raramente viajam mais de um quilômetro antes de desaparecer. Isso significa que, mesmo que as orcas pudessem ouvi-las, ainda seria difícil rastreá-las.
“Nunca me ocorreu que algumas baleias cantam baixo para evitar orcas, mas quanto mais eu olhava para isso, mais eu percebia que cada aspecto do comportamento delas é influenciado pelo medo de predação”, disse Branch em comunicado.
O contrário acontece com espécies que escolhem lutar.
Essas baleias de barbatanas geralmente migram e têm filhotes em águas rasas costeiras, que oferecem um tipo de proteção contra ataques de orcas. Devido à sua natação lenta e formato corporal mais navegável, sua comunicação tende a ocorrer em frequências mais altas (acima de 1.500 hertz), que podem ser facilmente detectadas pelas orcas.
Já as fujonas têm corpos mais aerodinâmicos, adaptados para velocidade, e normalmente se dispersam por regiões mais amplas de oceano aberto para reproduzir, onde conseguem fugir em todas as direções.
O canto também influencia os padrões de acasalamento das espécies.
As baleias macho das espécies que escolhem fugir precisam que suas serenatas de amor sejam ouvidas pelo maior número de fêmeas possível. Por isso, a música escolhida deve ser simples e repetitiva, para que a cantoria possa ser feita em períodos prolongados e as pretendentes possam rastreá-la até a fonte.
“Essas músicas super altas podem expor eles e seus companheiros a ataques de orcas. E é aí que entra a crípse acústica: cantar em frequências baixas que são impossíveis, ou muito difíceis, para as orcas ouvirem”, explica Branch.
A hipótese usada no estudo, de que os misticetos se dividem entre o clube da fuga e o clube da luta não é nova. Porém, a pesquisa sugere uma novidade sobre a adaptação desse grupo. Os pesquisadores agora buscam saber se essa crípse acústica pode ter sido desenvolvida como um mecanismo de defesa.
Fonte: abril