Apesar das tentativas da sétima arte de retratar o tubarão-branco (Carcharodon carcharias) como o maior predador dos mares (vide o clássico Jaws), ele não é imbatível.
Em 2023, o corpo de um grande tubarão foi encontrado em uma praia da Austrália com um buraco no abdômen, com marcas de dentes irregulares ao seu redor e sem o fígado (que armazena grandes quantidades de gorduras, e por isso tem alta densidade calórica). O brutamontes chegava aos seus 4,7 metros, o que levantou o mistério: o que o matou?
Nos últimos anos, cenas parecidas aconteceram na orla sul-africana, com várias carcaças de tubarões sendo levadas pelas ondas, com sinais de ataques.
![0502-Tubarão-Layout_Site1 Fotografia da Carcaça de um tubarão barnco encontrada em Portland](https://media.diadeajudar.com.br/wp-content/uploads/2025/02/06004531/0502-tubarao-layout_site1.jpg)
Tanto na África do Sul como na Austrália, a resposta desse mistério é a mesma. Um novo estudo publicado na revista científica Ecology & Evolution analisou o DNA das mordidas na carcaça australiana e confirmou que a culpada é a orca (Orcinus orca).
O time de pesquisadores coletou amostras das feridas do tubarão-branco morto e procuraram por qualquer material genético que o responsável pudesse ter deixado para trás. A análise confirmou a presença de DNA de orca na mordida principal, enquanto três outras feridas continham vestígios de DNA de tubarões-de-nariz-largo (que provavelmente se alimentaram do cadáver já morto).
“Havia quatro feridas deixadas por mordida distintas, uma das quais era característica da extração de fígado por uma ‘baleia assassina’, semelhante ao que foi observado na África do Sul”, diz a bióloga líder da pesquisa Isabella Reeves, da Universidade Flinders, na Austrália.
Essas predadoras pretas e brancas, carinhosamente apelidadas de “baleias assassinas” (apesar de serem um tipo de golfinho), fazem jus à alcunha. Elas se alimentam de mais de 140 espécies de animais marinhos, incluindo o maior peixe e o maior animal do mundo – o tubarão-baleia e a baleia-azul, respectivamente. Por isso, tubarões-brancos não são nada tão especial assim. Para vencer essas presas grandes, a caça é feita em grupo, claro.
Na costa da África do Sul, pesquisadores já haviam flagrado uma dupla de orcas atacando os grandes tubarões, mas esse tipo de predação ainda não tinha sido registrada nas águas australianas.
Dois dias antes do aparecimento da carcaça, Bent Tip e Ripple, duas orcas locais conhecidas de pesquisadores, foram vistos caçando uma presa grande em Bridgewater Bay, mas não dá para saber se era aquele tubarão encontrado na praia.
“Essas descobertas fornecem evidências convincentes da predação de tubarões-brancos por baleias assassinas em águas australianas, com uma forte indicação de consumo seletivo de fígado”, escreve Reeves em comunicado. “Isto sugere que tais eventos de predação podem ser mais difundidos e prevalentes em todo o mundo do que se acreditava anteriormente”.
O que fascina os pesquisadores é que diferentes grupos de orcas não se misturam e muito menos se comunicam. Isso levanta algumas questões sobre como um comportamento de caça semelhante poderia ter surgido em dois locais diferentes, de maneira independente.
Além disso, os pesquisadores mencionam que talvez seja necessário manter um certo tipo de monitoramento sobre este tipo de incidente nos mares australianos. “Sabemos que os tubarões-brancos são reguladores essenciais da estrutura e funções dos ecossistemas”, diz o geneticista ecológico Adam Miller, da Universidade Flinders.
As preocupações são válidas. De acordo com o estudo, o deslocamento ou a morte direta dos tubarões-brancos como resultado da predação das baleias assassinas na África do Sul levou a mudanças em cascata no ecossistema marinho mais amplo. “Por isso é muito importante preservarmos estes principais predadores”, conclui Miller. O próximo passo é monitorar o ecossistema australiano para saber a magnitude dos impactos dessa predação.
Fonte: abril