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Brasil

Como a Inteligência Artificial pode auxiliar na tomada de decisões tributárias complexas?

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A inteligência artificial ou IA emerge como um elemento transformador na sociedade contemporânea, moldando práticas, processos e decisões em diversos setores, incluindo o direito tributário, tributação e o jurídico. No Brasil, a recente implementação do sistema IARA (Inteligência Artificial em Recursos Administrativos) pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) ilustra o potencial da tecnologia para dinamizar e modernizar a gestão pública e a administração de justiça. No entanto, essa inovação exige uma reflexão cuidadosa sobre seus impactos éticos, jurídicos e sociais.

A aplicação da IA no campo tributário e tributação é impulsionada pela necessidade de eficiência em sistemas frequentemente sobrecarregados. Dados indicam que, antes do IARA, o tempo médio de tramitação de um processo no Carf era superior a seis anos, enquanto o novo sistema promete reduzir esse período para apenas um ano. Essa aceleração reflete a capacidade da IA de processar grandes volumes de dados e identificar padrões com velocidade e precisão superiores às habilidades humanas. Contudo, a celeridade não pode ocorrer em detrimento de direitos fundamentais, como o contraditório, a ampla defesa e a imparcialidade.

No Brasil, o uso da IA no Judiciário também tem avançado. O Supremo Tribunal Federal (STF) utiliza o sistema Victor para organizar processos de repercussão geral, reduzindo significativamente o tempo de análise preliminar

Internacionalmente, países como a Polônia e a Holanda já utilizam sistemas de IA em suas administrações fiscais. O sistema STIR, adotado pela Polônia desde 2017, utiliza algoritmos para analisar dados financeiros e identificar possíveis fraudes tributárias. Embora eficaz na detecção de irregularidades, o uso de algoritmos secretos tem gerado preocupações sobre a transparência e a equidade das decisões. Na Holanda, o escândalo envolvendo o sistema SyRI, utilizado para identificar fraudes em subsídios sociais, demonstrou como parametrizações inadequadas podem levar à discriminação e à violação de direitos fundamentais, resultando na renúncia do primeiro-ministro em 2020.

Nos Estados Unidos, o IRS (InternalRevenue Service) utiliza ferramentas de aprendizado de máquina para monitorar declarações fiscais e identificar inconsistências. Em 2022, o sistema contribuiu para detectar cerca de 1,3 milhão de declarações potencialmente fraudulentas, protegendo mais de US$ 10 bilhões em receitas públicas. Contudo, mesmo sistemas robustos enfrentam críticas sobre o potencial de decisões enviesadas e a necessidade de salvaguardas éticas.

No Brasil, o uso da IA no Judiciário também tem avançado. O Supremo Tribunal Federal (STF) utiliza o sistema Victor para organizar processos de repercussão geral, reduzindo significativamente o tempo de análise preliminar. Ainda assim, a transparência desses sistemas é uma preocupação constante, especialmente em áreas onde as decisões envolvem subjetividade ou análise contextual.

A regulamentação da IA no Brasil permanece incipiente. O Projeto de Lei 2338/2023, em tramitação, busca estabelecer diretrizes para o uso da tecnologia, mas enfrenta desafios relacionados à definição de critérios éticos e de transparência. A União Europeia, por sua vez, aprovou em 2024 um marco regulatório abrangente, classificando sistemas de IA conforme o nível de risco e impondo restrições rigorosas aos de maior potencial lesivo. A legislação europeia representa um modelo a ser estudado e adaptado, considerando as especificidades do sistema jurídico brasileiro.

A aplicação da IA no direito tributário e jurídico oferece benefícios indiscutíveis, como a redução de custos, a celeridade processual e o aumento da previsibilidade. Entretanto, o risco de decisões enviesadas, a opacidade de sistemas de deeplearning e a falta de regulamentação robusta são desafios significativos. A implementação de sistemas explicáveis (XAI – Explainable Artificial Intelligence) é fundamental para garantir a transparência e o controle humano sobre as decisões automatizadas.

Estudos sugerem que a transparência de sistemas de IA pode aumentar a confiança pública e reduzir a litigiosidade, mesmo nos casos envolvendo tributação. Na Austrália, a adoção de IA no sistema tributário melhorou a eficiência na análise de 96% das declarações fiscais eletrônicas, permitindo ao governo alocar recursos humanos em auditorias mais complexas. No entanto, o país enfrentou críticas por falta de mecanismos de revisão humana em casos contestados, destacando a necessidade de um equilíbrio entre automação e supervisão.

A IA não é apenas uma ferramenta, mas uma força transformadora que redefinirá a maneira como lidamos com questões jurídicas e e de tributação. O desafio reside em garantir que essa transformação respeite os direitos fundamentais, promova a justiça e preserve a confiança no sistema. Os números e os exemplos internacionais mostram que a IA tem um potencial imenso, mas também riscos significativos.

A pergunta que permanece é: até que ponto estamos prontos para delegar decisões complexas a sistemas que, embora eficientes, podem carecer de transparência e imparcialidade? A resposta exige um diálogo aberto, regulamentação robusta e uma visão clara sobre os limites éticos da tecnologia. O futuro do direito tributário e jurídico pode ser mais eficiente e acessível com a IA, mas apenas se estivermos dispostos a enfrentar os desafios que ela apresenta com coragem, responsabilidade e uma busca incessante pela justiça.

Leonardo Roesler, gestor de empresas, especialista em direito empresarial e tributário, é pós-graduado em Direito Desportivo, sócio do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa IBGC.

Fonte: gazetadopovo

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