O jejum intermitente raz benefícios à saúde, como perda de peso e melhora da saúde cardiovascular. Mas um estudo (1) feito com camundongos revelou um outro lado: em animais geneticamente predispostos a ter câncer, fazer jejum aumentou a incidência de tumores. Conversamos com Marco Aurélio Ramirez Vinolo, professor da Unicamp e coautor da pesquisa.
O estudo mostrou que quando os ratos voltavam a se alimentar, após o jejum, havia uma proliferação de células-tronco intestinais. Por que isso acontece?
O intestino é formado por uma camada de células-tronco, que se diferenciam e geram as células maduras, os enterócitos, com funções de absorção [de nutrientes], secreção de muco e várias outras.
É um processo que acontece continuamente. Em humanos, há uma renovação do epitélio intestinal inteiro a cada 3 a 5 dias. Em camundongos, é mais ou menos a mesma coisa.
Quando a gente coloca os animais em jejum por 24 horas, essas células diminuem a taxa de proliferação. Isso é esperado. O interessante é que, depois que acontece a realimentação, a proliferação [celular] aumenta em relação ao animal que se alimenta continuamente.
Ou seja, a realimentação dá um boost na proliferação das células. Isso tem efeito positivo para o organismo, que é aumentar a taxa de regeneração arterial. Mas pode, num indivíduo geneticamente suscetível, levar a maior risco de câncer colorretal.
O que essa descoberta em cobaias pode significar para a saúde humana?
Tudo o que eu vou falar aqui é especulação, porque o que a gente viu foi um modelo animal. O jejum intermitente tem benefícios metabólicos, para o organismo. Isso já está bem comprovado. Agora, ele pode trazer riscos em indivíduos suscetíveis [a tumores].
Um outro fator que a gente não explorou ainda, mas será super-relevante para as próximas pesquisas, é entender como a alimentação interfere nisso. Será que mudando o tipo de alimento, eu torno ainda mais suscetível, ou eu protejo contra tumores? É algo que tem de ser estudado.
Seria recomendável evitar o consumo de certos alimentos logo após o jejum?
A carne queimada, quando passa do ponto, tem algumas moléculas com efeitos potencialmente carcinogênicos. São fatores que se unem para aumentar as chances de desenvolvimento [de um tumor].
E embutidos ou ultraprocessados?
Sim. Aí você puxa para o lado da quantidade de gordura nesses alimentos, outro fator que também está associado à maior suscetibilidade [ao câncer]. É bem por aí mesmo.
Fonte 1. “Short-term post-fast refeeding enhances intestinal stemness via polyamines”, S Imada e outros, 2024.
Fonte: abril