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Ciência & Saúde

Fabiana Zuelli: Primeira Cientista Brasileira a Vencer o Prêmio USERN

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Para uma criança que passou sua infância imersa no mundo da ciência, ser fascinada pela área de pesquisa não é complicado.

Fabiana Corsi-Zuelli acompanhava seu pai, um biomédico, para cima e para baixo quando pequena. Fazia dos laboratórios seu parquinho e dos microscópios suas bonecas. Hoje, já muitos anos depois, aquela criança espoleta se tornou a primeira brasileira a conquistar o prêmio da Universal Scientific Education and Research Network (USERN) – uma premiação global que reconhece os feitos de cientistas jovens (até os 40 anos de idade) em qualquer novo avanço ou conquista na educação científica, pesquisa ou serviço à humanidade em cinco campos científicos: incluindo ciências médicas, da vida, formais, físicas e sociais.

Um conselho de 600 cientistas da nata da inovação, incluindo 20 ganhadores de prêmios Nobel e Abel, elegeram Fabiana e seu trabalho como um dos mais influentes do mundo, superando as outras mais de 90 mil indicações. Em outras palavras, Corsi-Zuelli ganhou a Bola de Ouro Jovem do ramo das ciências médicas. 

Ela conta para a Super que o troféu foi uma surpresa, mas que a alegria é imensa. “Acho que reflete a minha trajetória enquanto pessoa, enquanto pesquisadora. Eu sou uma pessoa que vem do ensino público do Brasil, desde o ensino fundamental estudei em escola pública, então pra mim sempre teve a barreira dos recursos ali, para alcançar uma universidade de excelência e enfrentar essas barreiras.”

Como uma cientista, ela diz que o mérito também é um reflexo do espaço das mulheres nas pesquisas. “Existem pesquisas que mostram que a mulher, que é maioria na pós-graduação, ainda é minoria em citações. E esse reconhecimento é muito interessante e bom para a sociedade, porque mostra o papel da mulher na ciência, dá visibilidade para a mulher e pode servir de inspiração para outras jovens que possam ingressar na ciência.”

O início de tudo

Fabiana se tornou doutora pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, no interior de São Paulo, na cidade em que nasceu e cresceu. Mas tudo começou com um bacharelado em enfermagem, onde teve seu primeiro contato com o que ela chama de “ciência formal”, em uma iniciação científica. 

“A minha primeira iniciação foi um estudo pré-clínico, em que eu trabalhava com roedores e investigava os mecanismos inflamatórios relacionados a uma condição de inflamação geral”, conta a doutora. “Depois fiz uma outra iniciação investigando mecanismos relacionados com a depressão.”

Depois de alguns intercâmbios acadêmicos e pesquisas, saiu um casamento: Fabiana uniu sua atração pelos mecanismos de doenças ao âmbito da saúde mental – e dessa união, veio o mestrado em neurociência. Ao mesmo tempo, a doutora vivia um período difícil: um diagnóstico de esquizofrenia na família e o sofrimento que o acompanha. 

Foi carga suficiente para motivar a pesquisadora a embarcar no tema do doutorado e do estudo premiado pela USERN: como fatores biológicos e ambientais podem influenciar na manifestação de transtornos psicóticos. 

A pesquisa do ouro

O artigo publicado analisou 429 indivíduos, que tiveram avaliações clínicas, biológicas e ambientais completas. Dessas pessoas, 143 eram pacientes com primeiro episódio de psicose, o que Corsi-Zuelli chama de “surto psicótico limpo”, ou seja, não era secundário a outras condições médicas. Os demais participantes eram indivíduos de controle de base populacional e irmãos de pessoas em surto limpo, que não manifestaram sintomas.  

Com a coleta de sangue foi possível observar que nesses pacientes existia um aumento de proteínas inflamatórias, as citocinas. Esse é o fator biológico que a equipe de pesquisa procurava.

Além disso, foi observado que o estado inflamatório era mais propenso em pessoas que sofreram algum caso de trauma na infância e em indivíduos que relataram o uso diário da Cannabis sativa, a maconha. Ou seja, os fatores ambientais também parecem influenciar no surgimento de psicoses. 

“A identificação do fator ambiental foi um grande achado. É importante para que futuras pesquisas façam essa consideração, não só do indivíduo como no seu caráter biológico, mas também no seu caráter na questão social e ambiental”, disse Fabiana. 

A cientista ficou feliz com o resultado da pesquisa e ressaltou como ela e a equipe conseguiram unir várias pontas soltas sobre transtornos psicóticos com o artigo, desde a aparição de inflamações, até o uso de cannabis e o impacto dos traumas. 

Portas abertas

Com bastante orgulho, a doutora conta que quando começou sua trajetória, não existia um ambulatório de primeiro episódio psicótico para atender pacientes depois que eles eram direcionados ao serviço hospitalar. Por conta desse projeto, sua orientadora, Cristina Marta Del-Ben, conseguiu instituir no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto um ambulatório especializado nesses casos.  

“Hoje nós temos esse serviço que faz o acompanhamento desses indivíduos e uma equipe multidisciplinar para ter essa intervenção precoce”, disse a pesquisadora.

Em relação a terapias, ela explica que os transtornos psicóticos exigem uma constante reinvenção de tratamentos – até porque um terço dos pacientes não responde aos métodos convencionais. Por isso, a pesquisa vem em ótimo momento: novos fármacos são feitos com base em direcionamentos específicos em onde devem atuar e esse é o caminho que o estudo indica. 

“Isso é medicina de precisão, é como se estivéssemos dizendo ‘não estou tratando os pacientes da mesma maneira, e sim identificando as características desse indivíduo e tratando ele de acordo com suas necessidades’”, explica Corsi-Zuelli. 

“Esse primeiro ensaio, em que a ideia é exatamente identificar dentro dos casos de psicose quem são aqueles indivíduos que têm alterações inflamatórias, leva a um ensaio clínico que está testando a combinação do antipsicótico com o droga que modula o sistema imunológico, para descobrirmos se esses indivíduos podem se beneficiar desse tratamento combinado.”

Em todo momento, a pesquisadora divide as conquistas com o time que acompanhou o estudo. O projeto foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e coordenado pelo professor Paulo Rossi Menezes. Mas também envolveu outros cientistas brasileiros e de outros centros ao redor do mundo. 

Em 2025, a doutora iniciará um pós-doutorado na Universidade de Oxford. “Eu respiro pesquisa, então para mim é dar continuidade no que eu comecei aqui”, conclui Fabiana Corsi-Zuelli.

Fonte: abril

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