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uando estava com um bloqueio criativo, Salvador Dalí recorria a uma técnica inusitada. Em seu estúdio, o pintor espanhol tirava uma soneca em uma poltrona enquanto segurava uma chave com a mão. Seu braço ficava pendurado para fora do assento – e no chão, embaixo da chave, ele deixava uma travessa metálica.
Então, era só esperar o sono chegar. Quando enfim começava a adormecer, sua mão relaxava e deixava a chave cair em cima da travessa, resultando num barulho que o acordava do soninho. Dalí não perdia tempo: imediatamente voltava ao trabalho, ainda meio grogue de sono.
Detalhe: Thomas Edison, inventor da lâmpada, fazia a mesma coisa – mas com bolinhas de metal em vez de chaves.
O motivo? Eles acreditavam que os momentos logo antes do sono profundo – aquele estado em que estamos meio acordados e meio dormindo, chamado de “hipnagogia” – eram os mais propícios para o surgimento de ideias criativas. Hoje, os cientistas sabem que isso tem um fundo de verdade – mas calma, leia toda a matéria antes de providenciar chave e travessa.
Esses exemplos mostram que, mesmo para as mentes mais inventivas da História, nem sempre ter ideias boas e originais era algo fácil e automático. Às vezes, era preciso um empurrãozinho.
Imaginar é um dom comum a todos os seres humanos – e também uma daquelas características que nos diferenciam dos outros animais, incapazes de atingir esse nível de abstração. Apesar disso, a criatividade parece a muitos de nós algo inacessível, difícil de cultivar, restrita apenas àqueles que já nasceram com aptidões artísticas ou inventivas.
Isso não é verdade. Nas últimas décadas, a psicologia e a neurociência começaram a desvendar o processo de surgimento de ideias originais no nosso cérebro – e descobriram estratégias que qualquer um pode adotar para aperfeiçoar a própria capacidade criativa, mesmo que você se considere desprovido desse traquejo. Vamos entender como nos próximos parágrafos.
Penso, logo crio
Por muito tempo, a ideia de pessoas como criadoras não existiu no imaginário do Ocidente. Na Antiguidade Greco-Romana, por exemplo, entendia-se que os humanos mais exploravam as possibilidades da realidade do que de fato criavam coisas novas. Mesmo a arte era considerada uma representação da natureza, e não exatamente um fruto da imaginação. Músicos e poetas pediam inspiração a um grupo de deusas conhecidas como musas – e acreditavam ser veículos por meio dos quais elas se manifestavam.
Foi só no Renascimento que a ideia do ser humano enquanto criador aparece de vez, um conceito que ganhou força no Iluminismo e, depois, no movimento Romântico. Isso fica claro nas artes plásticas – que, do século 19 em diante, se tornaram cada vez mais abstratas e experimentais, se afastando do objetivo de representar fielmente a natureza.
Desde então, buscamos entender como as boas ideias surgem, e se é possível melhorar o processo criativo. O tema, é claro, é explorado há muito tempo nas artes e na filosofia. Também é uma fixação de teóricos da administração e autores de autoajuda – que investigam, por exemplo, o que faz uma empresa ser inovadora e como os gestores podem cultivar essa soft skill no ambiente de trabalho.
O que se pode chamar de estudo científico da criatividade começou só na década de 1950, quando o psicólogo americano J. P. Guilford publicou as bases desse campo de pesquisa. Ele se interessou em responder uma pergunta essencial: de onde vêm as ideias criativas?
Para isso, Guilford propôs que o raciocínio humano se divide em dois tipos: o convergente e o divergente. Ambos podem ser usados para resolver problemas ou chegar a conclusões após uma análise, mas funcionam de maneira bem diferente.
O pensamento convergente é aquele que busca uma única solução para um impasse específico. Ele segue uma ordem estruturada, avançando e refinando uma mesma ideia em vez de experimentar várias resoluções diferentes. Pense, por exemplo, numa questão de uma prova de matemática. Pode até haver várias maneiras de chegar no resultado, mas o mais fácil (e comum) é escolher um único método e seguir com ele até o final.
Já o pensamento divergente é mais fluido e caótico: ele explora diversas ideias diferentes ao mesmo tempo, muitas vezes misturando as soluções e conectando-as de maneiras pouco óbvias. É o tipo de raciocínio típico dos brainstormings, por exemplo. Para Guilford, a criatividade é um produto direto da nossa capacidade de pensar de forma divergente. Ao fazer conexões entre coisas aparentemente desconexas, criamos ideias inéditas. Até hoje, essa explicação é a mais aceita pelos cientistas.
O que (não) é criatividade
A teoria de Guilford explica de onde a criatividade vem. Mas há ainda uma questão mais elementar – e, surpreendentemente, mais complexa: o que é a criatividade?
O conceito é um daqueles que todo mundo sabe reconhecer intuitivamente, mas que é difícil de colocar em palavras. Até dá para resumir em algo como “a habilidade de ter ideias originais e fora do comum” ou “a capacidade de encontrar respostas pouco óbvias para uma determinada pergunta”, mas, quando se trata de pesquisa científica, é preciso de uma definição um pouco mais exata. Qual usar?
“Entre os pesquisadores, existe uma grande diversidade de opiniões sobre como definir a criatividade”, conta Adam Green, neurocientista da Universidade de Georgetown, em Washington (EUA). Green é fundador da Sociedade para a Neurociência da Criatividade, que reúne os especialistas da área, e, por isso, está no centro das discussões sobre como definir o conceito.
Adam garante que não há consenso. Até existe uma “definição padrão”, adotada de forma provisória pelos pesquisadores da área na falta de algo melhor. “Mas ninguém gosta dela de verdade”, brinca John Kounios, professor de psicologia na Universidade Drexel e também referência no tema.
A tal “definição padrão” diz que, para algo ser considerado criativo, precisa cumprir dois requisitos: ser novo e útil. O primeiro passo é fácil de entender – a originalidade é o cerne da criatividade, claro. O segundo é um pouco mais confuso.
Acontece que só criar algo inédito não basta. Qualquer um pode rabiscar uma forma geométrica diferentona numa folha de papel ou inventar uma palavra nova – basta combinar vogais e consoantes numa sequência inexistente, tipo “alaqueneuta”. Isso, porém, não significa nada.
O que pode ser considerado criativo é criar um termo que seja ideal para descrever uma determinada coisa em um determinado contexto, como fazia Guimarães Rosa com os neologismos em seus romances. É por isso que o requisito “utilidade” entra na definição.
Mas é aí que surge um segundo problema: sabemos que uma pintura, um poema ou uma música podem ser criativos, mas até que ponto eles são úteis – e o que é ser útil? Emocionar pessoas ou se expressar são objetivos muito sutis para uma palavra tão dura.
É por isso que a definição padrão não agrada totalmente. O grande desafio é ter uma mesma descrição que possa ser aplicada a diferentes manifestações da criatividade (na arte, na ciência, nos negócios etc.).
Algumas versões substituem a parte do “útil” por “relevante” ou “apropriado a um contexto”, o que ajuda a ampliar a definição e diminuir o utilitarismo. O lado ruim, é claro, é que a definição também fica menos precisa.
Para contornar esse empecilho, outros autores preferem mudar o foco: em vez de definir as coisas que são criativas, preferem descrever o próprio processo de criação de ideias. “Eu defino a criatividade como a habilidade de quebrar um conceito em vários elementos e reorganizá-los para criar algo novo, surpreendente e significativo”, diz Kounios.
Outros pesquisadores também acham importante dividir a criatividade em duas manifestações distintas: a small-c (“pequena”), que se refere a atividades do dia a dia que exigem ideias novas, como pensar numa receita diferente com os ingredientes que estão na geladeira, escolher um presente fora do óbvio para o seu amigo ou disparar aquele trocadilho perfeito numa conversa; e a big-c (“grande”), que geralmente está relacionada ao trabalho ou à carreira e se refere a empreitadas mais complexas, como inventar uma história para um livro, desenvolver um produto novo ou esboçar um projeto de pesquisa.
Medindo a criatividade
Se definir o conceito já é difícil, imagine medi-lo. Sabemos, é claro, que algumas pessoas são, sim, mais criativas que outras, e também conseguimos identificar quando algo (um filme, um design etc.) é criativo. Ou seja, existe um gradiente. Mas como colocá-lo em números?
Para a maioria das habilidades cognitivas, há testes relativamente simples que resolvem a questão. A memória pode ser colocada à prova (“Você se lembra do que eu lhe apresentei na nossa última consulta?”), bem como a reação a estímulos externos (“Você está ouvindo esse som?”), a identificação de padrões (“Qual dessas figuras difere das outras?”) e até alguns sentimentos (“Isso faz você se sentir triste ou feliz?”). Não dá para fazer o mesmo com a criatividade.
Ou melhor: até dá. Basta ser criativo (rs). Uma saída comum para esse problema são os chamados “testes de usos alternativos”. Esses experimentos de laboratório consistem em entregar um objeto aleatório para voluntários de pesquisa e pedir que eles pensem em várias possibilidades de aplicação daquele item em contextos diferentes.
Se o objeto for um copo de plástico, por exemplo, uma resposta básica seria usá-lo para beber água. Uma ideia um pouco mais ousada seria enchê-lo de terra e transformá-lo num vasinho de planta. E uma pessoa com um bocado de pensamento divergente poderia usar um barbante para transformá-lo em um telefone improvisado.
Colhidas as respostas, os cientistas calculam quão boas essas pessoas são em pensar de forma divergente com base em métricas como a quantidade total de aplicações encontradas para o objeto, quanto tempo o participante levou para chegar a essas aplicações e quão diferentonas elas são em relação às apresentadas pelos demais.
Em 2021, pesquisadores de Harvard criaram e validaram um teste ainda mais simples para medir a capacidade de pensamento divergente. Nesse questionário, o usuário só precisa escrever dez palavras aleatórias, tentando escolher termos que sejam distantes entre si em todos os sentidos (semântico, morfológico, fonético etc.)
Então, um software analisa quão distintos realmente são os vocábulos escolhidos e quão original o usuário foi em suas escolhas em relação aos outros – calculando, com isso, uma nota final de criatividade. (1) Você pode inclusive experimentar o teste (em inglês), aqui.
De qualquer forma, esses métodos não são perfeitos. “Nós não medimos exatamente a criatividade com isso, mas sim o potencial de criatividade”, explica Mark Runco, professor e pesquisador sobre criatividade na Southern Oregon University, nos EUA. Afinal, esses testes apenas identificam a capacidade de pensamento divergente de cada pessoa, mas não necessariamente o quanto elas aplicam aquela habilidade para de fato gerar boas ideias no dia a dia.
A criatividade no cérebro
Você já deve ter ouvido falar naquela história de que o lado direito do nosso cérebro é o polo criativo e artístico, enquanto a metade esquerda seria racional e científica. Balela, claro. A realidade é mais complicada.
Mais recentemente, com o advento de tecnologias que mapeiam a atividade eletroquímica do órgão em tempo real, os neurocientistas finalmente começaram a entender o que ocorre na nossa cabeça quando estamos gerando ideias originais. Seria possível encontrar uma área do sistema nervoso responsável especificamente pela criatividade?
A resposta é “mais ou menos”. Observando o cérebro de pessoas durante experimentos em que elas se esforçavam para ter ideias originais, cientistas descobriram que essa habilidade é fruto da cooperação entre três redes neurais distintas. (2) “Redes neurais” são conjuntos de neurônios que costumam trabalhar em sintonia para cumprir determinadas funções. Não são exatamente áreas, portanto – não nessa acepção geográfica com que nos habituamos a descrever a massa cinzenta.
A chamada rede de modo padrão parece ser a principal envolvida no surgimento de novos insights. Ela é a responsável pela nossa capacidade de divagar e fica mais ativa quando não estamos focados em algo – quando estamos sonhando acordados.
A segunda protagonista do processo é a rede de controle cognitivo, formada por áreas do cérebro que são acionadas quando é preciso focar a atenção no mundo externo, como ao fazer uma prova. Ela parece ser responsável por avaliar, de um modo mais racional, os insights que foram gerados pela rede de modo padrão, descartando aqueles estapafúrdios e dando seguimento aos promissores, que prosseguem para se tornarem uma ideia de fato. Isso acontece quase sem percebermos.
O terceiro componente é a rede de saliência, cuja função ainda não foi totalmente elucidada. Ela parece fazer a ponte entre as duas outras redes.
O mais curioso de tudo é que essas redes neurais são bastante antagônicas: normalmente, quando uma está mais ativa, a outra costuma registrar uma atividade baixíssima. Ao divagar, por exemplo, é a rede de modo padrão que está dominando seu cérebro, não a de controle cognitivo. O processo criativo, porém, é uma exceção notável. Ele exige trabalho em equipe de vizinhas que normalmente não se bicam.
Essa é só uma descrição simplificada, é claro. Há muitas minúcias em jogo. O neurocientista Adam Green, por exemplo, identificou uma outra partezinha específica da cachola que é mais ativa durante processos criativos, chamada córtex frontopolar. O pesquisador e sua equipe estimularam esse naco do cérebro de voluntários com correntes elétricas (em doses baixas e seguras, claro) e notaram que, logo após essa intervenção, a performance dos participantes em testes de pensamentos divergentes melhorou. (3) Qual é o papel exato desse córtex? Ainda não se sabe.
Um outro estudo descobriu que o sistema de recompensa do cérebro – o mesmo que se ativa quando você come uma guloseima, por exemplo – também está envolvido na criatividade. Em um experimento, quando os voluntários tinham um insight, a atividade no córtex orbitofrontal, que tem a ver com a regulação do prazer e a motivação, subia rapidamente. (4) Isso parece indicar que ser criativo é algo satisfatório – o que faz sentido do ponto de vista darwiniano, já que alguma engenhosidade é essencial para sobreviver na natureza.
A verdade é que não seria mesmo muito criativo imaginar que há uma única área do cérebro dedicada à criatividade. “Faz sentido que a criatividade surja de um esforço de várias áreas do cérebro trabalhando ao mesmo tempo”, diz o neurocientista Adam Green. “Criatividade é feita de pensamentos e conexões, e o cérebro inteiro está pensando e fazendo conexões o tempo todo.”
O sono também é importante para ter ideias. Lembra do truque barato de Salvador Dalí e de Thomas Edison narrado no início do texto? Em 2021, pesquisadores do Instituto do Cérebro de Paris colocaram a estratégia à prova. No estudo, 103 voluntários precisavam resolver um problema de matemática que, à primeira vista, parecia bastante complicado – mas que, na verdade, podia ser solucionado rapidamente caso os participantes notassem um detalhezinho na equação. Só 16 pessoas, porém, tiveram esse insight e conseguiram resolver o enigma logo de cara.
Os voluntários remanescentes passaram então por um intervalo curto, no qual puderam deitar e descansar enquanto seus cérebros eram monitorados por um exame chamado polissonografia. Eles podiam ou não dormir – mas, se dormissem, seriam acordados com o barulho de uma taça de vinho se quebrando. Quando voltaram ao trabalho, aqueles que tinham entrado nos estágios iniciais do sono – o estado hipnagógico, entre a vigília e a soneca – foram três vezes mais eficazes em encontrar a solução da equação do que a parcela do grupo que não havia conseguido pegar no sono. (5)
Esse e outros estudos sugerem que, de fato, dormir parece ter um papel na criatividade. Não entendemos exatamente o porquê, mas sabemos que, durante o sono, áreas do cérebro que não costumam agir em conjunto passam a se comunicar – e conexões inusitadas podem levar a insights inéditos. É como uma divagação, mas no modo turbo.
Como ser mais criativo
Agora que entendemos de onde a criatividade vem, chegamos à questão de ouro: dá para aprender a ser criativo? Ou pensar fora da caixa é privilégio de alguns poucos talentos inatos?
A resposta é um pouco de cada coisa. Algumas pessoas, é fato, são naturalmente mais criativas. E os geneticistas estão dando alguns passos, ainda que humildes, na direção de entender esse componente hereditário do pensamento divergente.
Um estudo de 2016, por exemplo, descobriu que há uma correlação entre criatividade e genes associados com a dopamina, uma molécula mensageira do sistema nervoso que está associada à motivação. (6) A hipótese é que esses genes mexem com a conectividade das redes neurais do cérebro, facilitando a comunicação entre elas. De qualquer modo, esse é o aspecto menos estudado da criatividade, então não dá para cravar.
A habilidade de pensar fora da caixa também está claramente ligada à personalidade de cada um. Na psicologia contemporânea, o padrão-ouro para esse tipo de análise se baseia em cinco eixos (apelidados de big five), sendo eles: abertura a experiências, conscienciosidade, neuroticismo, amabilidade e extroversão. O primeiro é o que, comprovadamente, está mais associado à capacidade de pensamento divergente.
Pessoas mais abertas a experiências são mais curiosas e experimentam mais em sua vida – novas pessoas, filmes e músicas de gêneros variados, culinárias exóticas, programas diferentes etc. Faz todo sentido que elas também sejam mais criativas, claro: a bagagem de referências é muito maior e mais diversa do que a de quem segue a mesma rotina sempre e consome os mesmos conteúdos. A chance de fazer conexões menos óbvias é bem maior.
A personalidade, é claro, não é algo que se muda na marra, pelo menos não da noite para o dia. Não basta dizer para uma pessoa tímida simplesmente sair por aí falando com estranhos em busca de aventuras. Mas é fato que o primeiro passo para se tornar mais criativo, pelo menos em longo prazo, é tentar também ser mais aberto a novas experiências. Uma rotina rígida, com pouco espaço para novidades, tende a matar o pensamento divergente. Evite.
Também no longo prazo é possível praticar o que os pesquisadores chamam de “divagação com propósito”. Ou seja: adquirir o hábito de deixar sua mente vagar por aí às vezes, “sonhando acordada”, mas ainda assim tentando direcionar essa divagação para temas relevantes para sua vida – trabalho, relacionamentos, lazer. Pesquisas mostram que pessoas que relatam divagar com frequência também se saem melhor em testes de criatividade. (7)
Vários estudos já chegaram à conclusão – talvez um tanto óbvia – de que humanos são mais criativos quando estão relaxados e de bom humor, e que o estresse é um dos maiores supressores do pensamento divergente. Especialistas recomendam, em caso de bloqueios criativos, buscar atividades prazerosas e calmantes, ou tentar meditação mindfulness. (8)
Sair para uma caminhada também ajuda, como mostrou um estudo de pesquisadores de Stanford. Além de relaxante, o ar livre também ajuda a mente a divagar e estimula o pensamento divergente, enquanto ficar sentado num cubículo faz o oposto. (O pensamento convergente, é claro, é afetado negativamente pelas caminhadas, por causa das distrações da rua.) (9)
Paul Seli, artista, psicólogo e pesquisador da Universidade Duke, nos EUA, elenca um outro supressor clássico da criatividade: o julgamento. Pessoas excessivamente críticas, seja de si mesmas ou dos outros, também têm uma aversão maior a novas experiências, justamente por causa do medo de falharem e de serem julgadas. Quem tem autocompaixão tende a ser mais criativo do que quem se cobra demais.
Essa é uma conclusão que se repete também em estudos do campo da administração e dos negócios: empresas mais criativas são também aquelas que dão mais liberdades para seus times experimentarem, mesmo que isso leve, eventualmente, a erros. Punir projetos ousados que falharam só aumenta o medo de testar caminhos alternativos e reforça as mesmas soluções já testadas. Um jeito melhor de estimular a criatividade é compensar os acertos.
Outros pesquisadores, por sua vez, estudam se a falta de criatividade tem remédio no sentido literal da coisa: o farmacêutico. Um campo promissor é o uso de drogas psicodélicas para turbinar o cérebro – uma estratégia que, como você sabe, deu um bocado certo para alguns grandes artistas da História (alô, Beatles). Porém, essa é uma área de pesquisa obviamente delicada do ponto de vista ético e legal, e ainda não há resultados conclusivos sobre os impactos e efeitos colaterais do uso dessas substâncias para estimular o pensamento divergente.
Diante de experimentos tão variados e tantos resultados inconclusivos, você pode estar saindo desta matéria frustrado, com a sensação de que não existe bala de prata contra o problema. E é verdade: tornar-se mais criativo é um projeto de longo prazo, que depende de mudanças no nosso lazer, na nossa rotina e na maneira como encaramos e julgamos pessoas e situações. Só não fique com preguiça de tentar. Dá para começar hoje mesmo. É só fazer uma forcinha.
“[Nos nossos testes], a alteração mais forte que observamos na criatividade foi quando simplesmente pedimos para as pessoas: ‘Você pode tentar pensar mais criativamente do que isso?’”, conta o neurocientista Adam Green. “Quando essas pessoas passaram a praticar o mindset criativo propositalmente, a performance delas também passou a melhorar ao longo do tempo. Pode ser uma conclusão meio entediante, mas é o que melhor funciona.”
Pois é: a capacidade de usar o raciocínio divergente vem instalada de fábrica em todos nós e foi essencial para nossa sobrevivência ao longo da Pré-História e da História propriamente dita. Assim como qualquer outra habilidade, é preciso praticá-la. Nem todos podemos ser Salvador Dalí ou Thomas Edison, mas sempre dá para se tornar um bocadinho mais mente aberta do que você foi ontem. Boa sorte – e boas ideias.
Fontes: (1) artigo “Naming unrelated words predicts creativity”; (2) artigo “Functional Realignment of Frontoparietal Subnetworks during Divergent Creative Thinking”; (3) artigo “Thinking Cap Plus Thinking Zap: tDCS of Frontopolar Cortex Improves Creative Analogical Reasoning and Facilitates Conscious Augmentation of State Creativity in Verb Generation”; (4) artigo “An insight-related neural reward signal” (5) artigo “Sleep onset is a creative sweet spot”; (6) artigo “Dopamine and the Creative Mind: Individual Differences in Creativity Are Predicted by Interactions between Dopamine Genes DAT and COMT”; (7) artigo “What types of daydreaming predict creativity? Laboratory and experience sampling evidence.”; (8) artigo “Mindfulness and creativity: Implications for thinking and learning”; (9) artigo “Give Your Ideas Some Legs: The Positive Effect of Walking on Creative Thinking”
Fonte: abril