Ao anunciar a lista, o ministério frisou que a decisão se deu após a saída da Apib e que o ministro do STF Gilmar Mendes solicitou ao governo, em 1º de outubro, a designação de representantes. A pasta, porém, afirmou que “os nomes não substituem a representação da Apib, cuja vaga segue à disposição da organização”.
Conforme observa a Apib no comunicado publicado, as pessoas indicadas pelo ministério pertencem a órgãos governamentais, o que demonstra, na avaliação da instância, que “não estarão lá em nome do movimento indígena”. Ao todo, foram escolhidos cinco nomes e seus respectivos suplentes. São eles: o secretário especial de Saúde Indígena, Weibe Tapeba; a coordenadora do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Interior Sul, Eunice Kerexu Yxapyry; o coordenador regional da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em Minas Gerais e Espírito Santo, Douglas Krenak; Pierlangela Nascimento da Cunha, que integra a Coordenação-Geral de Políticas Educacionais Indígenas na Diretoria de Políticas da Educação Escolar Indígena, do Ministério da Educação; e o educador Eliel Benites.
Apesar de o ministério dizer que tem “confiança de que, como guardiã máxima da Constituição, a Corte não permitirá retrocessos em relação aos direitos indígenas”, essa não é a percepção da Apib. “A Apib lamenta profundamente que as instâncias autônomas dos povos indígenas ou entes públicos em que há participação indígenas sejam pressionados a ocuparem colegiados contra a sua vontade, sobretudo em espaços nos quais não está garantido o respeito à lei e às decisões já tomadas pelo plenário da Suprema Corte, que declarou inconstitucional a tese do marco temporal, em setembro de 2023”, escreve.
“O Estado tutelar, paternalista e autoritário foi enterrado pela Constituição Federal há 36 anos, ao mesmo tempo que reconheceu o nosso direito de sermos povos étnica e culturalmente diferenciados, e de sermos protagonistas do nosso próprio destino e, por isso, reivindicamos dos poderes do Estado que respeitem as nossas decisões autônomas”, acrescenta.
O Conselho Indígena de Roraima (CIR), que defende os direitos dos povos macuxi, wapichana, ingaricó, taurepang, patamona, sapará, wai wai, yanomami e ye’kwana, também se manifestou contra a indicação do ministério, veiculando uma nota de repúdio. A entidade lembrou a recusa da Apib em participar da câmara e afirmou que, “até o momento, o ministro Gilmar Mendes não tomou a medida urgente e necessária que se impõe: suspender a Lei nº 14.701/2023, que representa uma grave ameaça aos nossos territórios e modos de vida”.
Com contundência, a CIR disse que, “ao fazer essa indicação, o ministério alinha-se com fazendeiros, garimpeiros, agronegócio, revivendo práticas coloniais de tutela e contra os direitos dos povos indígenas. Esse ato constitui uma violação clara ao princípio da boa-fé e ao direito internacionalmente reconhecido de consulta e consentimento prévio, conforme previsto em mecanismos de direitos humanos, como a Convenção 169 da OIT [Organização Internacional do Trabalho]”.
A organização indígena complementou a crítica defendendo que “a criação do ministério foi uma demanda coletiva, mas não tem legitimidade para nos representar dentro da estrutura do Estado brasileiro”. “Por fim, reafirmamos que apenas as nossas instâncias legítimas de representação têm o direito de decidir o nosso futuro e defender nossos territórios”, finaliza.
Emerson Pataxó, vice-presidente da Associação de Jovens Indígenas Pataxó, dos pataxó da Bahia, foi outra liderança que demonstrou insatisfação com a solução encontrada pelo ministério. “A decisão do Ministério dos Povos Indígenas em indicar parentes para a falsa câmara de conciliação do STF é um verdadeiro atentado à autonomia do movimento indígena e um desrespeito sem medida contra a Apib”, postou em sua conta na rede social X.
A Agência Brasil solicitou posicionamento do ministério quanto à questão e aguarda retorno. Caso a pasta se pronuncie, a matéria será atualizada.
Fonte: leiagora