O sítio arqueológico de Cerro Azul, na Colômbia, é conhecido como a “capela sistina da Amazônia”. É localizado na Serra do Chiribiquete, nome que significa “colina onde se desenha” em carijona, um idioma indígena da região. Isso porque são quilômetros de paredão, com milhares de desenhos que retratam diferentes aspectos da vida nas Américas há mais de dez mil anos.
Embora as pinturas estejam nesse mesmo paredão na Amazônia colombiana há 12 mil anos, não é nada fácil para os pesquisadores chegarem até lá. Primeiro, foi necessário um acordo de paz entre o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), assinado em 2016. Só então foi seguro para a equipe adentrar a floresta da região – contando, inclusive, com ex-guerrilheiros como guias.
Mas essa não é nem a parte mais difícil: para ficar frente a frente com as pinturas, é preciso uma longa e perigosa escalada e ficar pendurado em cordas. Agora, pesquisadores fazem a catalogação e análise das pinturas a partir do uso de drones.
A equipe de pesquisa, que incluía acadêmicos do Reino Unido, Colômbia e Alemanha, optou por se concentrar em seis painéis em detalhes. Entre eles estava o El Más Largo, de 40 m por 10 m, que continha mais de 1.000 imagens, até um painel muito menor, de 10 m por 6 m, chamado Principal, em que muitas das 244 imagens estão extremamente bem preservadas em vermelho vibrante.
Foram mais de 3.200 pinturas catalogadas, com pelo menos 22 espécies diferentes incluindo veados, pássaros, queixadas, lagartos, tartarugas e antas.
Em um estudo publicado na revista Journal of Anthropological Archaeology, arqueólogos analisam a relação entre os animais retratados e os hábitos alimentares daquele período, que são estudados através dos ossos encontrados em assentamentos humanos próximos.
Os restos de animais revelaram uma dieta diversificada, incluindo peixes, uma variedade de mamíferos de todos os portes e répteis, incluindo tartarugas, cobras e crocodilos. Outros pontos da Cerro Azul guardam registros de espécies já extintas da megafauna, como mastodontes, preguiças gigantes e equinos ancestrais.
Os pesquisadores notaram que as quantidades e proporções dos ossos dos animais não correspondem à frequência com que aparecem nas pinturas, o que sugere que os artistas não pintaram apenas o que comeram. Por exemplo: embora sua dieta fosse rica em peixes, só encontraram duas pinturas sobre pesca.
De forma semelhante, notaram a ausência de pinturas de felinos, que ocupavam o topo da cadeia alimentar e são retratados em outros sítios de pinturas rupestres na Colômbia. Segundo o estudo, essas escolhas do que pintar ou não pintar são peças essenciais para o entendimento da cultura daqueles povos. Por exemplo: pode ser que pintar uma onça fosse visto como um mau agouro, por ser um animal poderoso.
“Embora não possamos ter certeza do significado dessas imagens, elas certamente oferecem mais nuances à nossa compreensão do poder dos mitos nas comunidades indígenas. Elas são particularmente reveladoras quando se trata de aspectos mais cosmológicos da vida amazônica, como o que é considerado tabu, onde reside o poder e como as negociações com o sobrenatural eram conduzidas”, diz José Iriarte, coautor do estudo.
Fonte: abril