Todo mundo já viu um papagaio falar. Ele tem um aparelho fonador muito diferente do nosso, mas o bichinho é hábil em manipular seus mecanismos de produção de som para imitar o que ouve em seus arredores (seja o canto de outros pássaros, seja uma sirene de ambulância).
Chimpanzés são muito mais parecidos conosco do que pássaros. Isso inclui suas bocas, línguas, cordas vocais e demais órgãos envolvidos na produção de sons. Apesar disso, não vemos chimpanzés pronunciando palavras humanas por aí, ainda que vários deles convivam diariamente com cuidadores em zoológicos.
Os biólogos não sabem dizer se isso ocorre por uma limitação de hardware (existem sutilezas na anatomia desses bichões que os impedem de emitir sons parecidos com os nossos) ou de software (o cérebro deles só não tem a programação necessária para mover os músculos da cabeça e do sistema respiratório de modo a emitir fonemas análogos aos nossos).
Alguns especialistas argumentam ainda que não há limitação alguma, e que esses animais são sim capazes de pronunciar palavras em línguas humanas, pelo menos em tese.
Outra questão é que, mais importante do que os sons em si, é a intenção por trás deles. Imitar um som em troca de uma recompensa é uma coisa – que pode ser treinada –, produzir sons espontaneamente para imitar alguém ou para interagir socialmente é outra, bem mais complicada.
Para desempatar essa discussão, um grupo de pesquisadores do Real Instituto de Tecnologia da Suécia e da Universidade de Warwick em Coventry, na Inglaterra, analisou três vídeos antigos de dois chimpanzés criados com alguma intimidade por seres humanos (um experimento impensável com as restrições éticas de hoje).
Um dos vídeos, a que você pode assistir abaixo, mostra um jovem chimpanzé falando mama (de “mamãe”). Outros registros também mostram papa e a palavra cup (“xícara”).
Analisando o áudio, os pesquisadores verificaram que a maneira como esses chimpanzés moveram língua, dentes e lábios, bem como certas características da vibração das cordas vocais, é idêntico ou muito parecido com a pronúncia dessas mesmas palavras por seres humanos.
Isso permite concluir que esses animais têm, sim, condições anatômicas e fisiológicas de emitir fonemas como os nossos, ainda que não tenham a capacidade para linguagem instalada no cérebro. O estudo foi publicado no periódico especializado Scientific Reports.
A evolução da linguagem
Hoje, é quase um consenso entre os linguistas que o software da linguagem vem instalado de fábrica no cérebro humano. Há indícios sólidos de que todas as seis mil e tantas línguas do mundo compartilham uma mesma gramática subjacente básica, que o linguista Noam Chomsky denominou Gramática Univeral (ou só “GU”).
Os bebês pronunciam suas primeiras palavras antes de conseguir andar de maneira autônoma ou exibir qualquer grau decente coordenação motora, e toda criança aprende a falar com a mesma fluência na mesma época – ainda que elas vivam em famílias e condições socioeconômicas muito diferentes.
Note que a escrita – que não tem base biológica, é uma habilidade completamente aprendida – não é onipresente. Se uma criança não for ensinada a escrever, ela chegará à vida adulta sem essa habilidade.
Ou seja: ainda que os chimpanzés possam aprender a pronunciar certas palavras em troca de recompensas (ou mesmo que consigam pronunciá-las espontaneamente com fins de interação social), eles não vão sair por aí falando como no Planeta dos Macacos. Pode ficar tranquilo.
Fonte: abril