Não é novidade para ninguém que as mudanças climáticas já estão causando impactos por todo o planeta. Uma nova pesquisa, porém, revelou que essas mudanças podem também afetar outro elemento importante do nosso dia a dia: o tempo, ou mais precisamente, as horas.
Apesar de basearmos a duração dos dias, meses e anos na movimentação do planeta no espaço (a rotação e a translação), a “hora oficial” do planeta é ajustada a nível atômico. Os relógios atômicos possuem uma precisão impressionante, de modo que levaria cerca de 1 milhão de anos para que ele ganhasse ou perdesse 1 segundo.
Esses relógios são utilizados por satélites e pelo mercado financeiro, por exemplo, justamente por isso – qualquer alteração temporal impactaria significativamente o seu funcionamento (o atraso de alguns segundos no GPS poderia resultar em uma diferença de posição de mais de um metro, por exemplo).
O movimento de rotação da Terra não é 100% preciso. A velocidade de rotação pode mudar dependendo de uma série de fatores, como o atrito entre as águas do oceano com o fundo do mar, a gravidade do Sol e da Lua, a velocidade de rotação do núcleo da Terra etc.
Alterações na distribuição de massa do planeta e em sua superfície também podem afetar a sua rotação. Um exemplo disso são grandes terremotos. O grande tsunami do Oceano Índico em 2004, considerado pela ONU como o pior desastre natural já registrado, atingiu 9.1 na escala Richter. Tão forte que fez o planeta girar um pouquinho mais rápido.
Com tanta coisa influenciando na rotação do planeta, os relógios atômicos se tornam indispensáveis. Mas aqui tem um twist: para não causar grandes distorções temporais, o relógio atômico é constantemente ajustado para corresponder exatamente à rotação do planeta – afinal, imagina a bagunça que seria o relógio indicar meio dia com o sol se pondo.
Essa coordenação é feita por meio do UTC (Coordinated Universal Time, ou Tempo Universal Coordenado), que desde 1969, utiliza cerca de 450 relógios atômicos para ajustar os relógios e as zonas temporais em todo o planeta.
Para ajustar os relógios atômicos com a rotação da Terra, os cronometristas decidiram adotar um sistema de tick extra no relógio, chamado de segundo bissexto ou segundo intercalar. Esses segundos extra só são adicionados quando necessário para igualar as duas medidas, e desde 1972, quando foi criado, foram utilizados 27 vezes (no caso, foram acrescentados 27 segundos).
Os metrologistas (especialistas em medição) não são exatamente fãs desse método. Muitos sistemas de navegação por satélite e do mercado financeiro possuem seus próprios sistemas para adicionar esse segundo extra, o que dificulta também o ajuste do tempo globalmente.
Bom, você deve estar se perguntando o que tudo isso tem a ver com as mudanças climáticas, certo? Lembra que mudanças na superfície do planeta também podem afetar a sua rotação? Bem, é exatamente isso que uma nova pesquisa mostrou.
O estudo realizado pelo geólogo Duncan Agnew, da Universidade da Califórnia, descobriu que o derretimento das camadas de gelo na Groenlândia e Antártica está diminuindo a velocidade de rotação da Terra – e influenciando no ajuste de tempo global.
Essa diminuição na rotação está tornando os dias um pouquinho mais longos – tão pouco que nós, humanos, não percebemos, mas é relevante para os computadores que dependem de uma medição extremamente precisa.
Utilizando dados de gravidade via satélite, Agnew descobriu que o derretimento das calotas de gelo está alterando a distribuição de massa na superfície do planeta. Isso está alterando uma dinâmica entre o acoplamento do núcleo da Terra com sua crosta.
A rotação do planeta depende também da movimentação das partes que compõem sua estrutura interna (núcleo, manto e crosta). A pesquisa descobriu que a alteração de massa por causa do derretimento do gelo fez com que uma parte se movesse mais lentamente que a outra.
A desaceleração da rotação do núcleo está acelerando a rotação das camadas externas. Assim, para que os relógios continuem sincronizados, os cronometristas futuramente vão ter que remover segundos bissextos do UTC – o oposto do que vinha ocorrendo nas últimas décadas, quando segundos foram adicionados.
Por enquanto, o movimento de rotação da Terra e os relógios atômicos estão quase que perfeitamente alinhados. Mas não por muito tempo, sugere esse estudo. As alterações na dinâmica da superfície e núcleo do planeta podem fazer com que os cronometristas passem a mexer para ajustar os relógios já em 2026.
Fonte: abril