Escolhido em 2019, apenas nesta segunda-feira, 24, o compositor e escritor brasileiro Chico Buarque recebeu o Prêmio Camões, considerado o mais importante da literatura em língua portuguesa. Os quatro anos de atraso decorrem da recusa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em assinar o diploma, responsabilidade dividida por Brasil e Portugal.
A cerimônia na sala do trono do Palácio de Queluz, no distrito de Lisboa, capital portuguesa, contou com a presença dos presidentes brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e português, Marcelo Rebelo de Sousa, além de ministros e artistas, como as cantoras Fafá de Belém e Carminho.
Ao receber o prêmio, muito emocionado, Chico relembrou o pai, que sempre lhe indicou leituras, e sua primeira experiência em Portugal. “Conheci Portugal em 1966, ao lado de João Cabral de Melo Neto, o primeiro laureado pelo prêmio”, contou.
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Afirmou ainda que valeu a pena esperar por essa cerimônia. “Eu já me perguntava se me haviam esquecido”, brincou.
Ao falar dos quatro anos do último “governo funesto”, foi aplaudido. Depois, fez um elogio torto a Bolsonaro. “Teve a rara fineza de não sujar meu prêmio”, afirmou.
Muito emocionada, Pilar del Río, viúva do escritor português José Saramago, descreveu a entrega como um momento mágico. “Neste momento, o que destaco é a emoção. De repente ver que, por cima da noite e de toda a escuridão que vivemos, a liberdade, a poesia, a música e a convivência se impuseram”, afirmou.
O escritor moçambicano Mia Couto, laureado com o Camões em 2013, disse ser um admirador do trabalho de Chico e também enalteceu a arte e a cultura brasileira. Para ele, o reconhecimento é importante até mesmo para a autoestima do povo brasileiro.
“Quando a gente pensa no Brasil, estamos num momento em que tudo se reduz à sua dimensão política. Mas a dimensão cultural e artística do Brasil é enorme. Acho que os brasileiros nem sempre se dão conta de como essa dimensão ultrapassa o Brasil”, afirmou a VEJA um pouco antes do início da cerimônia.
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Para Mia Couto, a recusa de Bolsonaro acabou sendo bem-vinda, porque agora se faz “uma festa a dobrar”. Lembrou, porém, que a arte ultrapassa a política.
“Quando o Palácio da Alvorada foi invadido, ele foi notícia no mundo, mas a gente esquece que por trás daquilo há uma outra história, muito mais importante, que é a beleza ousada de Oscar Niemeyer, que fez o desenho que é um patrimônio do mundo. Esse valor de cultura perdura e sobrepõe-se àquilo que é contingente, do domínio da política cotidiana”, disse.
Manuel Frias Martins, membro do júri do prêmio de 2019, elogiou o alcance humanista da obra múltipla de seis décadas de vida artística de Chico. As palavras do brasileiro, disse, “são abraços que unem continentes”.
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Contudo, foi impossível deixar a política de fora da cerimônia. Até porque a cerimônia na sala do trono do Palácio de Queluz, em Sintra (distrito de Lisboa), contou com a presença dos presidentes brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e português, Marcelo Rebelo de Sousa, além de ministros e artistas.
O presidente de Portugal lembrou que a entrega do prêmio deu-se no dia que há 49 anos foi o último da ditadura (em Portugal) e no lugar onde nasceu e morreu o filho que rompeu com o pai para abraçar uma nova pátria (d. Pedro I). Também criticou quem não gostou da escolha por causa das opiniões do “cidadão Chico”.
“Ninguém precisaria da fundamentação dessa decisão (de premiar Chico)“, afirmou, arrancando aplausos da plateia ao dizer: “Meu caro amigo, me perdoe, por favor, por essa demora”.
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“O ataque à cultura foi uma dimensão importante do projeto que a extrema direita tentou implantar no Brasil”, afirmou Lula. O presidente brasileiro disse ainda que a entrega hoje só foi possível com a vitória da democracia.
“Hoje já é outro dia”, brincou, referindo-se à famosa música do compositor, “Apesar de Você”.
O premiado do Camões recebe 100 mil euros, valor financiado por Brasil e Portugal. Como a láurea de 2019 não foi entregue, o montante ficou suspenso desde então – os escolhidos nos anos seguintes também não o receberam.
A partir de agora, devem ser organizadas as próximas cerimônias. Estão na fila Vítor Manuel de Aguiar e Silva (Portugal), Paulina Chiziane (Moçambique) e Silviano Santiago (Brasil).
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Fonte: Veja