“A Casa do dragão”, ou “House of the Dragon”, deve ter chocado boa parte de seus espectadores em seu segundo episódio, que foi ao ar neste domingo (27), depois que um pai oferece a filha, de apenas 12 anos, para casar com o rei, um homem em torno dos 50.
Diferentemente dos mortos-vivos criados para “Game of Thrones”, este não é mais um delírio fantasioso da mente do escritor george r. r. martin. O casamento infantil era prática recorrente nas cortes europeias de séculos atrás, nas quais o autor se inspirou para conceber o universo literário e, agora, também televisivo.
Na cena em questão, Corlys Velaryon, um homem ambicioso que sempre quis ver sua linhagem se misturar àquela dos ocupantes do Trono de Ferro, oferece sua filha Laena, uma criança, para ser a nova mulher do rei Viserys Targaryen.
Ele fica claramente desconfortável com a proposta, mas sabe que aquilo faz parte do jogo político. Então, aceita dar uma volta pelos jardins com a menina, que diz a ele que “seria uma honra unir nossas casas”. “Eu te darei muitas crianças para fortalecer a linhagem real e a coroa”, diz ainda.
O rei, então, pergunta se foi o pai de Laena quem a mandou dizer aquelas coisas. Ela dá a entender que sim e, ao ser questionada sobre a opinião de sua mãe, responde que ela avisou que a menina só precisaria se deitar com o rei quando fizesse 14 anos.
A cena se junta a um leque de outras situações polêmicas do universo de “Game of Thrones”, como estupros e incestos, que apesar de terem desagradado a alguns telespectadores, encontram eco num passado que já foi mais violento e incivilizado.
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Na corte europeia, o casamento infantil era prática comum para assegurar laços políticos e a continuidade de dinastias. Em vários casos, tanto noivo quanto noiva eram menores de idade. Em outros, apenas um deles, com mais frequência a mulher, ainda era criança ou adolescente. O casamento poderia ser consumado após a cerimônia ou depois que uma determinada idade fosse alcançada.
No século 9º, Judite de Flandres, por exemplo, tinha cerca de 12 anos quando se casou com Etelvulfo, rei de Wessex –hoje parte do Reino Unido–, então com cerca de 60. A união durou menos de dois anos, devido à idade avançada do marido, mas Judite teve que se casar outras duas vezes com homens bem mais velhos.
No século 16, Catarina de Aragão, antes de se casar com Henrique 8º, celebrou matrimônio com o irmão mais velho do rei inglês, Arthur. Ambos tinham 15 anos, mas o marido morreu poucos meses depois.
Uma nobre que quase se casou com o mesmo Henrique 8º, mas nem por isso teve um destino mais feliz, foi Cristina da Dinamarca. Aos 11, ela se uniu ao duque milanês Francisco Sforza, que tinha 38. Quando ele morreu, tentaram oferecê-la ao monarca inglês, que tinha 46, enquanto ela, 16.
Fora das linhagens monárquicas, um exemplo notável é o do casal de químicos francês Antoine e Marie-Anne Paulze Lavoisier. Quando se casaram, ele tinha 28, mas ela, apenas 14.
Apesar de o costume ter cessado na corte europeia, o casamento infantil ainda é um problema grave em várias partes do mundo, incluindo o Brasil. O país é hoje o quarto com o maior número de moças que se casam antes de atingir a maioridade. Segundo dados do IBGE de 2016, o Brasil registrou 28.379 uniões de meninos de até 19 anos, contra 109.594 de meninas.