Há cenas indizíveis, registros indeléveis das grandes tragédias. O terremoto que devastou o sul da Turquia e o norte da Síria será para sempre lembrado pela figura heroica de Mesut Hancer a segurar por horas a mão da filha, Irmak, que morreu em sua cama, debaixo de lajes de concreto, na província turca de Kahramanmaraş. Ela tinha 15 anos e sonhos. Houve comoção amplificada com o registro de um outro drama, em Afrin, na Síria. Moradores que vasculhavam escombros de um prédio descobriram uma menina recém-nascida chorando, com o cordão umbilical conectado à mãe, que deu à luz enquanto estava soterrada. Só a pequena sobreviveu. O número de mortos (11 000 até quarta-feira 8) pode chegar a 20 000. A Síria foi especialmente abalada devido às estruturas já danificadas por doze anos de guerra civil. A Turquia, de seu lado, está em uma das áreas mais vulneráveis a abalos sísmicos do planeta. Três dias depois dos impactos, serviços de emergência travavam uma corrida contra o tempo para resgatar vítimas, acossados pelo frio inclemente de um inverno especialmente rigoroso, com temperatura média de 2 graus negativos. Em meio ao sofrimento, contudo, houve milagres. Uma família inteira foi retirada dos restos de sua casa na província síria de Idlib, na terça-feira 7. Uma salva de palmas de uma multidão atônica comemorou o resgate de um casal de pais, duas meninas e um menino, levados de ambulância ao hospital. Passam bem — e continuam a sonhar com o futuro subtraído de muitos outros.
Publicado em VEJA de 15 de fevereiro de 2023,
Fonte: Veja