Família, sonhos e espaço sideral compõem a história de Marte Um, que concorre ao prêmio de Melhor Filme no Festival de Cinema de Gramado e teve uma das exibições mais aclamadas nesta edição do evento. O filme estreou em festivais fora do Brasil, ganhou elogios da crítica internacional e, por aqui, a avalanche de aplausos também deixou claro que o longa do diretor mineiro Gabriel Martins é um dos grandes destaques entre a lista de competidores pelo troféu Kikito.
Em entrevista ao AdoroCinema, Gabriel contou sobre a inspiração no mundo real: ‘Marte Um’ é também o nome de um programa espacial lançado em 2012, que pretendia levar pessoas para colonizar o planeta. “A missão, de fato, existia e eu ficava pensando sobre como essa ideia parecia algo tão maluco, mas ao mesmo tempo uma aventura interessante e um contraste com a ideia de um menino jogando bola em um bairro pequeno, longe dos holofotes”, disse.
O menino é o personagem Deivinho (Cícero Lucas), filho caçula da família Martins, que tem o sonho de se tornar astrofísico e explorar o espaço, mas seu pai tem outros planos. O porteiro Wellington (Carlos Francisco) quer que o filho se torne jogador de futebol e é a partir daí que conhecemos o grupo de protagonistas, formado também pela mãe, Tércia (Rejane Faria), e pela filha, Nina (Camilla Damião).
“Esse sonho do jogador de futebol, que é do pai, é muito conectado com o desejo de ascensão, de orgulho. Mas a astrofísica e o espaço sideral têm essa ideia de expansão, de um sonho sem limites, inalcançável”, analisa o cineasta. Para os outros membros da família protagonista, a questão dos sonhos também é presente e apresenta outros conflitos, como contou ao AdoroCinema a atriz Rejane Faria.
“No filme, a mãe sente que precisa organizar tudo, ajudar os filhos, o marido. Cada um tem seu sonho, mas quando chega a vez dela é meio que um ‘ah não’. E isso é comum na vida de muitas mulheres, mesmo com todos os avanços”, reflete a atriz. No longa, Tércia é acometida por uma crise existencial após um acontecimento inusitado e a história nos oferece seu ponto de vista.
“A Tércia é uma diarista que está sempre cuidando dos outros, da casa dos outros. Então, pensei em como seria vê-la vivendo uma crise tão pessoal, que não tem a ver com servir ninguém, que não partiu de ninguém. Tem aí uma ideia de fé, de sorte também. Mostrar essa crise existencial era dar a ela o direito de sentir”, explica Gabriel. “Ela não conta com ninguém para se reorganizar internamente porque não quer levar mais problemas para a família”, pontua Rejane.
Com uma trama de “fazer rir e chorar”, Marte Um provocou reações entusiasmadas do público ao final da sessão no Festival de Gramado, o que surpreendeu Rejane Faria. “Acompanhei a exibição na Filadélfia, Estados Unidos, e a plateia lá tinha reações imediatas de aplausos, de ‘uau’. Aqui era um silêncio e eu pensei ‘deu errado’”, brinca a atriz. “Então, foi uma surpresa enorme os aplausos no final. Acho que as pessoas ficaram meio anestesiadas com o que estavam vendo, guardando as emoções. No final, foi aquela explosão incrível”, relembra.
Para Gabriel, a boa recepção reflete a força do afeto de família. “A estreia foi muito forte, muito emocionante. Lá fora, Marte Um deu muito certo e é bem especial quando o filme consegue transcender a barreira da linguagem. Fico imensamente feliz porque a gente vê que a força dessa família ultrapassa, consegue atingir outros lugares”, disse ao AdoroCinema.
Por fim, o diretor atribui a comoção gerada pelo longa à uma história que fala sobre emoções com simplicidade. “Sinto que vivemos um momento muito individualista, em que a polarização não deixa as pessoas se comunicarem. O país vem sendo muito maltratado e parece que a gente esquece que tem afeto, que sentimos emoções. Marte Um vem para trazer essa ideia de volta, da importância de olharmos um para o outro. De sonhar”, diz.