A Entidade Nacional de Eletricidade, mais conhecida no Brasil como , corre o risco de perder seu contrato de concessão para o fornecimento de energia elétrica em parte do .
Mais do que isso, a ex-estatal italiana está ameaçada de ter que responder a ações indenizatórias milionárias na Justiça em razão, principalmente, da incapacidade de solucionar a crise de abastecimento no maior núcleo econômico e populacional do país.
Depois de um temporal na sexta-feira, 11, pelo menos 2 milhões de pessoas ficaram sem energia elétrica na cidade de São Paulo e em municípios vizinhos. O apagão que se estendia até quarta-feira, 16, compromete a iluminação de residências e afeta empresas dependentes de equipamentos e sistemas de telecomunicação.
Nesse contexto de caos, a Enel vem sendo fortemente pressionada por políticos de todos os lados. Se de um lado a sua lentidão aprofunda o desconforto, de outro, esgota, cada vez mais, a paciência das autoridades públicas.
Em meio a esse inferno astral, a Enel vive às voltas com pelo menos duas possibilidades. A primeira é a chamada caducidade, que é a extinção de direitos por não cumprimento de dever em um determinado período de tempo.
A segunda é a encampação, que é o rompimento unilateral do contrato. Assim, a empresa pode ser obrigada a vender a sua concessão. Isso ocorreu com a própria Enel, em 2022, no Estado de Goiás.
Encurralada, a empresa se apoia em projetos de investimentos que preveem R$ 6,2 bilhões em São Paulo entre 2024 a 2026. Diz, ainda, que vai contratar, ao menos, 1,2 mil eletricistas até 2025.
No meio do atual sufoco, a concessionária buscou socorro em equipes próprias que estavam em outros Estados, como Ceará e rio de janeiro. Apelou também pelo recrutamento de técnicos estrangeiros.
No último sábado, 11, anunciou que recorreria a profissionais de países vizinhos (Chile e Argentina), além de Itália e Espanha. Os esforços, contudo, parecem não convencer as autoridades em razão, principalmente, do histórico.
Em março e novembro do ano passado, a mesma região sofreu dois apagões de grandes proporções. O problema com a falta de energia durou aproximadamente uma semana e, mais uma vez, quem pagou a conta com prejuízos financeiros e paciência foi o consumidor.
Em abril deste ano, o governo federal, por meio da , solicitou abertura de um processo administrativo disciplinar contra a Enel.
Essa medida tem a finalidade de investigar eventuais descumprimentos de regras, cujo resultado pode ser o rompimento ou a revisão dos contratos. A Aneel deixou o barco correr e, agora, é criticada por negligenciar a situação.
A agência se defende dizendo que multou a concessionária em cerca de R$ 320 milhões. Parte da penalidade foi suspensa por decisão judicial.
Desconfiados quanto ao engajamento da concessionária, os governos estadual e municipal, em meio às vésperas do segundo turno nas eleições da capital, pediram o rompimento do contrato da Enel.
As concessões de distribuição de energia são de competência federal. Logo, envolvem diretamente o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Com isso, observam alguns especialistas, não dá para contar, pelo menos no curto prazo, com a ideia de rompimento de contrato. O próprio governo diz que a caducidade é um processo que nunca foi adotado no país.
“Antes de qualquer decisão, é preciso dar o direito de ampla defesa à Enel para ver se ela falta com os compromissos previstos”, disse à Revista Exame o advogado Rafael Marinangelo, do escritório RGSA. “[O rompimento] tem uma sequência de atos que você não pode suprimir”.
O ex-diretor geral da Aneel e professor da Universidade Federal de Santa Catarina,Edvaldo Santana,concorda: “É um rito demorado”.
O também especialista em direito empresarial Dinovam Dumas de Oliveira, do escritório MFDB, reforça a existência de um cenário complexo.
“Se pretender o rompimento do contrato, o Estado terá de adotar todas as providências que a lei prevê. Isso inclui instaurar processo administrativo e permitir que a Enel exerça o direito ao contraditório e à ampla defesa”.
Conforme relatórios da Aneel, a frequência e a duração dos apagões são os critérios que, em princípio, medem a qualidade do serviço. Nesse contexto, a Enel, em 2022 e 2023, atende aos padrões mínimos.
A empresa, contudo, vem piorando o seu desempenho no quesito continuidade de fornecimento de energia. No último ranking do setor, publicado em março deste ano, caiu da 19ª para a 21ª posição.
Em caso de caducidade ou encampação, o governo federal teria, por exemplo, três caminhos: assumir a prestação do serviço; realizar um contrato provisório com outra empresa que atenda à demanda; ou manter a Enel até uma nova licitação.
Isso significa que a União teria que assumir a concessão ou escolher uma empresa de forma emergencial para operar o serviço até um novo processo de licitação.
Fonte: revistaoeste