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STF: Estado é responsável por morte de vítima atingida por bala perdida

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Via @consultor_juridico | O Estado é responsável, na esfera cível, por mortes e ferimentos decorrentes de disparos de arma de fogo durante operações de segurança pública, e a perícia inconclusiva sobre a origem do tiro não é suficiente para afastar a responsabilização.

Esse entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que fixou nesta quinta-feira (11/4) a tese sobre a responsabilidade da União, dos estados e dos municípios por mortes decorrentes de balas perdidas.

A responsabilização levará em conta o órgão responsável pela operação. Por exemplo, se a morte ocorreu durante ação da Polícia Militar, será apurada a responsabilidade do estado; se foi causada pelo Exército, da União.

O julgamento começou no Plenário Virtual, entre os dias 1º e 8 de março. Apesar de a maioria dos ministros votar pela responsabilidade da União pela morte de um homem durante operação do Exército no Rio de Janeiro, não houve maioria por nenhuma proposta de tese.

Na sessão desta quinta, os ministros chegaram a uma decisão. A tese foi lida pelo relator do caso, ministro Edson Fachin, a partir de apontamentos feitos pelos ministros Cristiano Zanin e André Mendonça.

Ficou estabelecido que:

1) O Estado é responsável, na esfera cível, por morte ou ferimento decorrente de operações de segurança pública, nos termos da teoria do risco administrativo;

2) É ônus probatório do ente federativo demonstrar eventuais excludentes de responsabilidade civil;

3) A perícia inconclusiva sobre a origem do disparo fatal durante operações policiais e militares não é suficiente por si só para afastar a responsabilidade civil do Estado, por constituir elemento indiciário.

O caso concreto é o de um homem morto em 2015 por projétil de arma de fogo durante troca de tiros envolvendo a Força de Pacificação do Exército. O episódio ocorreu no Complexo da Maré, no Rio. O laudo sobre a origem do disparo foi inconclusivo.

A família da vítima moveu ação contra os governos federal e do estado do Rio. A solicitação de indenização foi rejeitada em primeira instância porque a perícia sobre de onde partiu a bala não chegou a um resultado. O Tribunal Regional Federal da 2ª Região manteve a decisão.

Agora, com a decisão do Supremo, a União deverá pagar R$ 200 mil a cada um dos pais da vítima e R$ 100 mil para o irmão. E também terá de ressarcir os gastos com funeral e pagar pensionamento vitalício.

Voto do relator

Quando o caso estava no Plenário Virtual, Fachin entendeu que há responsabilidade do Estado e da União por mortes durante operações de segurança pública quando não há perícia conclusiva. Ele foi acompanhado pelas ministras Rosa Weber (aposentada) e Cármen Lúcia e pelo ministro Gilmar Mendes.

A responsabilidade da União se deve porque a Força de Pacificação do Exército participou do tiroteio, já a do governo do Rio, porque descumpriu o dever de investigar a morte.

Segundo Fachin, é desnecessário saber se a bala partiu da arma do agente de segurança pública ou de quem o confrontava. Se houve troca de tiros, a ação dos agentes contribuiu de forma decisiva para o dano.

“Para configurar o nexo de causalidade, não é necessário saber se o projétil proveio da arma dos militares do Exército ou dos confrontados, mas, sim, se houve operação da Força de Pacificação no momento e no local em que a vítima foi atingida”, explicou ele.

A partir do relatório feito pela Polícia Civil, o ministro concluiu que a ação dos militares desencadeou a troca de tiros. Se a investida da Força de Pacificação não ocorresse, não haveria tiroteio.

Para Fachin, o Exército assumiu o risco ao iniciar uma operação em um local habitado. Assim, descumpriu seu dever de diligência. “O fato gerador do dano não é o projétil em si, mas, sim, a operação da Força de Pacificação”, afirmou ele.

O ministro propôs a seguinte tese:

Sem perícia conclusiva que afaste o nexo, há responsabilidade do Estado pelas causalidades em operações de segurança pública.

Teoria do risco administrativo

Ainda no Plenário Virtual, Cristiano Zanin concordou em boa parte com a ideia de Fachin, mas sugeriu uma redação diferente para a tese — pois, segundo ele, o caso concreto envolveu não apenas a perícia inconclusiva, mas também “a ausência de demonstração de hipótese de excludente de responsabilidade por parte do Estado”. Ele foi acompanhado pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente da corte.

A conclusão de sua tese foi que a perícia inconclusiva sobre a origem do disparo fatal em operações policiais e militares “não é suficiente, por si só, para afastar a responsabilidade civil do Estado”.

Zanin ainda divergiu na resolução do caso concreto. Ele entendeu que o governo estadual não poderia ser responsabilizado pela morte, já que não há registro de operação da Polícia Militar do Rio de Janeiro no dia em questão.

“Eventual falha em cumprir, com diligência, a investigação dos fatos é causa autônoma e posterior à responsabilidade aqui tratada, não contemplada na petição inicial, podendo ser objeto, se o caso, de medida judicial própria”, acrescentou ele.

Quanto à tese, Zanin entendeu que a teoria do risco administrativo é a regra para a responsabilidade civil do Estado, conforme a própria jurisprudência do STF.

Segundo essa teoria, o Estado tem responsabilidade quando há ato ou omissão, dano indenizável e nexo causal entre o comportamento e o dano. Mas o Estado também pode ser isentado de responsabilidade caso demonstre que não houve tal nexo.

“Havendo a demonstração da causa da morte por disparo e demonstrada sua conexão com a operação policial com uso de armas de fogo, há elementos indicativos da responsabilidade do Estado, a quem competirá, se o caso, comprovar a interrupção do nexo causal.”

Zanin propôs a seguinte tese:

1) A responsabilidade civil do Estado, na forma do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, opera sob a teoria do risco administrativo, cabendo a oposição, se o caso, de excludentes de responsabilidade pelo ente federativo;

2) A perícia inconclusiva sobre a origem de disparo fatal durante operações policiais e militares não é suficiente, por si só, para afastar a responsabilidade civil do Estado.

Perícia impossível

André Mendonça divergiu do relator e propôs a tese de que o Estado é responsável pela morte de vítimas de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidades quando a perícia é inconclusiva quanto à origem do disparo, “desde que se mostre plausível o alvejamento por agente de segurança pública”.

Segundo ele, o Estado pode ser isento se demonstrar que houve “total impossibilidade da perícia” para esclarecer os fatos e que houve uso de todos os instrumentos técnicos disponíveis. Mendonça foi acompanhado pelo ministro Dias Toffoli.

Ele votou por condenar só a União a pagar a indenização, pois não haveria provas de participação da Polícia Militar no tiroteio. E o ministro se opôs à tese de que o Estado assume o risco por operações policiais em áreas nas quais o crime organizado se estabelece.

Segundo ele, “não se pode estabelecer a priori um critério para caracterização do caso fortuito e da força maior”. Em vez disso, é preciso analisar, caso a caso, as condições em que o evento ocorreu e se o fato era imprevisível ou inevitável.

Mendonça propôs a seguinte tese:

1) O Estado é responsável por morte de vítima de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade quando a perícia que determina a origem do disparo for inconclusiva, desde que se mostre plausível o alvejamento por agente de segurança pública;

2) Poderá o Estado se eximir da responsabilização civil, caso demonstre a total impossibilidade da perícia, mediante o emprego tempestivo dos instrumentos técnicos disponíveis, para elucidação dos fatos.

Origem do projétil

O ministro Alexandre de Moraes também divergiu do relator. Para ele, só é possível responsabilizar o Estado por mortes decorrentes de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidades quando for comprovado que a bala partiu dos agentes estatais. Ele foi seguido pelo ministro Luiz Fux.

Segundo Alexandre, só há responsabilidade civil em relação aos efeitos diretos e imediatos causados pela conduta do agente do Estado — ou seja, nos casos em que o dano é causado de forma direta e imediata pelo evento.

O magistrado ressaltou que as operações policiais precisam ser planejadas e bem estruturadas, mas indicou que “as forças militares não têm como atuar na repressão do crime organizado sem adentrar nas comunidades, onde o imponderável estará sempre presente, por mais bem estruturada que seja a missão”.

Ele propôs a seguinte tese:

A responsabilidade estatal por morte de vítima, por disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, pressupõe a comprovação de que o projétil partiu dos agentes do Estado.

  • Clique aqui para ler o voto de Fachin
  • Clique aqui para ler o voto de Zanin
  • Clique aqui para ler o voto de Mendonça
  • Clique aqui para ler o voto de Alexandre

ARE 1.385.315

Tiago Angelo
Fonte: @consultor_juridico

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