A falta de mão de obra qualificada no mercado brasileiro tem acelerado a contratação de estrangeiros. De janeiro a agosto deste ano, o saldo de imigrantes empregados formalmente cresceu 53% em comparação ao mesmo período de 2023. Os dados são do (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego.
De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, o crescimento é impulsionado principalmente por venezuelanos e cubanos, que encontram oportunidades no Sul e Sudeste. As regiões têm uma oferta de vagas maior e os índices de desemprego são mais baixos que a média nacional.
Em agosto, o número de estrangeiros com carteira assinada atingiu 321 mil, a maior marca desde janeiro de 2020, conforme levantamento da LCA Consultores para o Estadão. A taxa de crescimento anual de estrangeiros empregados também foi recorde, chegando a 27,6% em relação a agosto de 2023.
Apesar de representarem apenas 0,6% do total de empregados formais, o aumento reflete a falta de mão de obra qualificada no país, que soma 47 milhões de trabalhadores formais. Bruno Imaizumi, economista da LCA Consultores, destaca que o mercado de trabalho aquecido é um dos motivos para o aumento das contratações de estrangeiros.
“O mercado de trabalho aquecido é um motivo pelo qual tem sido registrado esse crescimento”, afirma Imaizumi ao Estadão.
O economista ressalta que muitos estrangeiros ocupam vagas informais e agora estão conseguindo trabalhos formais. Na consultoria de recrutamento RHBrasil, por exemplo, a contratação de estrangeiros mais que dobrou neste ano.
Oferta de vagas
Joanir Schadeck, gerente de recrutamento da RHBrasil, associa o aumento das contratações à maior oferta de vagas, especialmente no Sul e Sudeste. “No Sul, está virando pleno emprego: a taxa de desemprego no Brasil estava em 6,9% no segundo trimestre e em Santa Catarina era de 3,2%,” compara.
Dados do Caged mostram que a Região Sul liderou a absorção líquida de trabalhadores entre janeiro e agosto deste ano, com 65,1%, seguida pelo Sudeste (18,7%) e o Centro-oeste (10,7%). A indústria, que emprega 40,6% dos estrangeiros, sente de forma aguda a escassez de mão de obra.
Empresas como a BRF, gigante do setor de proteína animal, têm programas específicos para contratar imigrantes. Alessandro Bonorino, vice-presidente de Gente, Gestão e Transformação da BRF, destaca o engajamento dos imigrantes. “É a fome com a vontade de comer”, compara.
A empresa atualmente emprega 8,3 mil imigrantes, majoritariamente venezuelanos, em suas unidades no Sul e Centro-Oeste do país. Asdrubal Jose Chanchamire Hurtado, venezuelano empregado na BRF, exemplifica esse engajamento. Formado em administração de empresas e com experiência na guarda nacional venezuelana, Hurtado trabalha na linha de produção de aves desde março.
O venezuelano destaca o ganho salarial de cerca de 40% em relação ao emprego anterior e os benefícios como motivadores para sua mudança para a BRF. “No futuro, pretendo retomar a minha profissão no Brasil e crescer”, diz Hurtado, que almeja atuar na área administrativa da empresa.
Venezuelana morou na rua
O cenário de emprego também é favorável para Liliana Gomez, outra venezuelana que encontrou oportunidades no Brasil. Formada em administração de empresas, Liliana passou por dificuldades depois de migrar para o Brasil em 2019, chegando a viver na rua por cinco meses.
Hoje, ela trabalha como balconista de padaria no supermercado Negreiros, em São Paulo, e sonha em atuar na área administrativa da rede. “Quero melhorar na carreira, mas tudo tem o seu tempo”, afirmou ao Estadão.
A diretora de Recursos Humanos do supermercado Negreiros, Ana Paula Abou Roujaili, afirmou que o programa de refugiados da empresa está em funcionamento há cerca de 14 anos.
“Sempre busquei tê-los como trabalho social”, disse Ana, ressaltando que a contratação desses trabalhadores não está ligada à escassez de mão de obra. Porém, a diretora observou uma menor oferta de trabalhadores em geral atualmente.
O presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, Ricardo Patah, atribui a contratação de refugiados ao baixo salário oferecido no comércio. Ele observa que muitos refugiados se sujeitam a condições de trabalho difíceis.
“Tem de trabalhar domingo, feriado e o jovem não quer isso”, disse Patah.
Gelson Santana, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Porto Alegre, disse que muitos imigrantes qualificados acabam em empregos abaixo de suas qualificações.
“Tem professoras venezuelanas trabalhando como empregada doméstica e pessoas com curso superior em canteiro de obras, até por causa da revalidação do diploma”, comenta Santana.
Construção civil e a mão de obra estrangeira
A construção civil, depois da indústria, é um setor que emprega muitos estrangeiros. A construtora Tenda começou a contratar refugiados durante a pandemia para lidar com a alta rotatividade de trabalhadores.
lucas moura, gerente de Comunicação e Responsabilidade Corporativa da Tenda, afirmou que a rotatividade de refugiados é 67% menor do que a de brasileiros.
“Trabalhamos com um modelo industrial que requer um tempo para a pessoa entender o processo e replicá-lo”, explicou Moura ao Estadão. “O giro de trabalhadores estressa esse sistema.”
Imigrantes como Malamine Mane, conhecido como Maniche, da Guiné-Bissau, encontram na construção civil uma oportunidade de melhorar suas condições de vida. Maniche trabalha como pedreiro desde 2019 e destaca o salário melhor na construção civil.
A demanda por trabalhadores no setor é alta, especialmente em regiões afetadas por desastres naturais, como o Rio Grande do Sul.
“Hoje está mais fácil arranjar emprego, tem mais ofertas, mais possibilidades”, afirma Maniche, que sonha em juntar dinheiro para comprar uma casa para sua família na Guiné-Bissau.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Porto Alegre, Gelson Santana, estima que o Estado pode absorver até 60 mil trabalhadores no setor. Atualmente, aproximadamente 5% dos trabalhadores na construção civil em Porto Alegre são estrangeiros, mas há capacidade para absorver muitos mais.
“Estamos precisando de mão de obra e muita”, disse Santana.
Fonte: revistaoeste