Grãos com alto valor de mercado, nutritivos, saborosos e com cozimento rápido estão entre os principais atributos das novas cultivares de feijão-de-corda, ou feijão-caupi que a Embrapa recomenda.
As cultivares BRS Bené (grãos marrons graúdos), BRS Guirá (grãos pretos), BRS Utinga (grãos brancos graúdos) e BRS Natalina (tipo “manteiguinha”) são plantas com elevado potencial produtivo, sanidade e bom porte e arquitetura.
Resultado de 40 anos de pesquisa em melhoramento genético de feijão-caupi, também conhecido como feijão da colônia, as cultivares BRS Bené, BRS Utinga e BRS Guirá apresentam porte ereto, semiereto e semi-prostrado, que se ajustam bem à colheita mecanizada e favorecem também a colheita manual. E a BRS Natalina, a primeira cultivar do tipo “manteiguinha” do Brasil.
“Trata-se de um importante aporte tecnológico para a agricultura em escala familiar e empresarial do Pará e de estados da Região Nordeste”, afirma o agrônomo Francisco Freire Filho, pesquisador aposentado da Embrapa Amazônia Oriental, que liderou o trabalho de melhoramento genético das cultivares.
Ele ressalta que as novas cultivares têm apelos comerciais diferentes e atendem às demandas de consumo e produção.
“Os grãos têm excelente qualidade, bom tempo de panela e bons níveis de proteína, ferro e zinco. Todas elas têm níveis de produtividade bem superior aos materiais atualmente utilizados no campo e se ajustam tanto para colheita mecanizada quanto manual”, detalha Freire.
Grande trabalho de seleção
O trabalho de melhoramento genético de feijão-caupi na Embrapa soma mais de quatro décadas.
Para o estabelecimento do banco de recursos genéticos desse grão, que é uma coleção de sementes, os pesquisadores realizaram ao longo desse tempo um extenso trabalho de coleta de sementes nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, e realizou intercâmbio com outros países.
A coleção possui diferentes tipos de feijão-caupi com variação em cores e formatos, potencial produtivo, além de resistência a pragas e doenças.
“Nesta jornada, foram realizados centenas de cruzamentos, obtidas milhares de linhagens, das quais foram selecionadas dezenas de cultivares,” conta o pesquisador da Embrapa Rui Alberto Gomes Junior.
Os cientistas focaram em cultivares que apresentassem qualidade de grão, produtividade, porte e arquitetura da planta e resistência a doenças.
O trabalho, como relata o pesquisador da Embrapa João Elias Rodrigues, envolveu uma equipe multidisciplinar das áreas de melhoramento genético, solos, fitossanidade e agroindústria.
Bonitos, saborosos e de rápido cozimento
A qualidade do grão foi o principal objetivo do melhoramento genético do feijão, segundo o Gomes.
“Diferente de outras culturas agroindustriais, o grão seco do feijão é o produto final que vai ser embalado e ofertado ao consumidor, por isso, a qualidade visual é o primeiro ponto que deve ser considerado”, acrescenta o pesquisador.
Outros pontos importantes são o sabor e o tempo de cozimento, “porque além de bonito, o feijão tem que ser gostoso e cozinhar rápido”, completa.
Aliado ao aspecto visual e sabor, os grãos das novas cultivares apresentam altos teores médios de proteína, ferro e zinco.
A pesquisadora da Embrapa Ana Vânia Carvalho conduziu análises de laboratório e testes sensoriais com provadores potenciais consumidores do produto, que indicaram boa aceitação das novas cultivares.
Em relação às características físico-químicas das cultivares, foi observado um alto teor de proteína.
“Mais de 20% de proteína é um bom teor para alimentos em geral. O feijão-caupi é uma excelente fonte de proteínas vegetais, além do ferro e zinco”, afirma a pesquisadora. Outro resultado apontado pela análise foi o tempo de cozimento do grão, que permaneceu o mesmo após seis meses de armazenamento, indicando boa vida de prateleira.
As avaliações sensoriais com potenciais consumidores foram realizadas para as cultivares BRS Bené e BRS Utinga. Na primeira rodada, 67 provadores analisaram a aparência e cor dos grãos crus, e o aroma, sabor, textura e impressão global dos grãos cozidos.
“As duas cultivares tiveram excelentes notas com índice de aceitação acima de 80%”, relata Carvalho. Surpreendeu a pesquisadora o resultado do teste de comparação entre a cultivar BRS Bené e um feijão marrom comum (Phaseolus vulgaris), comercializado nos supermercados. Os provadores não perceberam a diferença entre eles.
Opção segura para a “safrinha”
Com o avanço do melhoramento genético aliado à expansão do cultivo de grãos no Brasil, o feijão-caupi ganhou escala principalmente no estado de Mato Grosso, que é o maior produtor nacional desse grão, ao integrar a produção onde a soja é a cultura principal, na chamada “safrinha”.
O caupi entra como segundo cultivo realizado em mesma área e mesmo ano agrícola. Isso porque o ciclo precoce e o porte ajustado para a colheita mecanizada tornaram o caupi uma alternativa competitiva na produção de grãos.
“As cultivares de feijão-caupi têm ciclo de 70 a 75 dias, cerca de um mês a menos que as cultivares mais precoces de milho. Elas têm um potencial muito grande para a safrinha da soja o Pará, principalmente na fase final de plantio quando a cultura do milho tem um risco mais elevado ou em condições onde o intervalo de chuvas é limitado para o milho”, explica o pesquisador Rui Gomes.
Ele destaca ainda que o porte e arquitetura da BRS Bené e BRS Utinga são muito bem ajustados para a colheita mecanizada. “São atualmente as cultivares de melhor aptidão para essa operação. É possível utilizar o mesmo maquinário da soja, por exemplo, com baixíssima perda de grãos”, afirma o pesquisador. A cultivar BRS Guirá, continua Gomes, apesar do porte semi-prostrado, possui boa arquitetura, com elevada posição de vagens, sendo uma boa opção também para a colheita mecanizada.
Desafios do mercado
Das quase 10 mil toneladas que a empresa paraense Gama Lopes vende anualmente de feijão, apenas 1,2 mil toneladas são de feijão-caupi, entre o tradicional e do tipo “manteiguinha”.
Apesar de ocupar pouco mais de 10% das vendas, o caupi tem potencial para crescer, segundo Fabrício Campos de Sá, sócio-diretor da empresa.
“São dois os grandes desafios do mercado de feijão-caupi no estado: o primeiro é aumentar consumo, pois o paraense não tem o hábito de consumir esse grão; e o segundo é aumentar a produção”, cita o empresário.
A Gama Lopes atua no mercado paraense há mais de 30 anos com três tipos de feijão comum (phaseolos) e dois de feijão-caupi. Todo o feijão comum ensacado na empresa vem de outros estados como Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. “Do feijão que vendemos, o Pará só produz o caupi tradicional e o tipo manteiguinha”, acrescenta Campos de Sá.
Para ele, o feijão “manteiguinha” tem um nicho de mercado importante: a alta gastronomia. “Mas é preciso profissionalizar e ampliar a produção desse grão no estado”, ressalta.
Fonte: canalrural