Existem três bases para conhecer os Lençóis Maranhenses: Barreirinhas, Atins e Santo Amaro. Por anos, o difícil acesso manteve Santo Amaro fora do radar. Graças ao asfaltamento da estrada e a construção de uma ponte sobre o Rio Alegre, agora qualquer carro consegue chegar ao centrinho da vila. Mas pelo visto a notícia ainda não se espalhou: suas dunas e lagoas continuam recebendo poucos visitantes, que aproveitam a paisagem em silêncio.
Isso a diferencia um bocado de Barreirinhas, a base mais famosa e estruturada, onde há ruidosos grupos de excursão empunhando paus de selfie. Sem falar do trânsito de 4x4s da Toyota, que precisam esperar a sua vez na fila da balsa e atravessar uma trilha de mata fechada para só então chegar às dunas. Santo Amaro, em contrapartida, está bem na entrada do parque nacional – sair da pousada e, em questão de minutos, já estar mergulhando na primeira lagoa do dia foi a cereja do bolo para mim.
O clima também é bem diferente de Atins. Única das três que fica à beira do mar, a vila vem despontando como um dos hotspots do kitesurf no Brasil e ganhou pousadas e restaurantes sofisticados nos últimos tempos (veja um guia de Atins). Enquanto isso, Santo Amaro segue bastante rústica. Com mais ruas de areia do que asfaltadas, o povoado de pouco mais de 16 mil habitantes tem casas simples, pequenas mercearias, uma praça central com igrejinha e só.
Ou seja, é preciso ir ciente que dá para contar na mão as opções de bons restaurantes e que a vida noturna é inexistente. A oferta de hospedagem melhorou nos últimos tempos, com pousadas charmosas, mas que continuam passando longe de qualquer luxo. Cá entre nós, um preço pequeno a se pagar diante de um fato: em Santo Amaro estão as paisagens mais bonitas dos Lençóis Maranhenses. As dunas por lá são mais altas, as areias são mais brancas e, de quebra, as lagoas em tons de azul e verde costumam durar mais tempo. Mas não espalhe.
PASSEIOS EM SANTO AMARO
De todas as memórias que guardo dos Lençóis Maranhenses, a mais impactante foi a do meu primeiro passeio em Santo Amaro. Depois que a jardineira me buscou na pousada, rodamos por menos de dez minutos até alcançar a entrada do parque nacional. Dali, foi só subir a primeira duna para dar de cara com uma lagoa maravilhosa. A rapidez me pegou de surpresa e meus olhos marejaram diante de tanta beleza. A proximidade é apenas um dos luxos embutidos nos passeios em Santo Amaro.
Outra comodidade é o fato dos carros pararem pertinho das lagoas, de forma que você não precisa caminhar por muito tempo pela areia fofa, o que às vezes envolve afundar a perna até o joelho. Não é questão de preguiça: esse pode ser um baita diferencial para pessoas de mais idade ou que têm dificuldades de locomoção. De quebra, os guias ainda montam cadeiras e guarda-sóis à beira da água, que em algumas lagoas é povoada de peixinhos devido à proximidade com o Rio Alegre.
Os passeios podem durar meio dia ou um dia inteiro e, em alguns casos, incluem paradas para almoço nos “oásis”, que são pequenos vilarejos em meio ao areal. Em geral, os tours terminam no alto de uma duna para assistir ao pôr do sol, um espetáculo que você vai querer repetir dia após dia.
Confira, a seguir, os principais passeios por Santo Amaro. Os preços são da agência que contratei e gostei, a Ciamat.
Circuito Andorinhas
O passeio visita as lagoas mais próximas, com paradas para banho na Lagoa do Recanto e na Lagoa das Andorinhas. Fiz esse circuito logo no dia que cheguei a Santo Amaro, o que foi uma decisão acertada porque passa-se pouco tempo no carro e mais tempo relaxando nas lagoas. Caso você opte pela saída no período da tarde, o passeio termina com o pôr do sol no alto de uma duna.
Duração: Meio dia, de manhã (9h às 12h) ou à tarde (15h às 18h)
Preço: R$ 130 por pessoa no passeio compartilhado ou R$ 800 para quatro pessoas no privativo
Circuito Betânia
O passeio é um dos mais populares porque passa por diferentes e belíssimas lagoas. De fato, foi meu favorito. O roteiro pode variar, mas no meu caso começou com banhos na Lagoa do Cajueirinho e na Lagoa da Mochila. Depois, trocamos a jardineira por um barco para atravessar o Rio Alegre e percorrer uma curta trilha pela mata até chegar ao oásis de Betânia, onde almoçamos um ótimo PF de peixe (refeição paga à parte). De volta à jardineira, fizemos mais uma parada para banho na Lagoa do Lavado e terminamos assistindo ao pôr do sol.
Duração: Dia inteiro, das 9h às 18h
Preço: R$ 180 por pessoa no passeio compartilhado ou R$ 1.200 para quatro pessoas no privativo
Circuito Emendadas
O circuito ficou de fora do meu roteiro porque envolve caminhadas mais longas, o que não empolgou meu marido e meus pais, com quem eu estava viajando. A jardineira roda por mais de meia hora até chegar ao limite do parque nacional. A partir daí, é preciso caminhar por cerca de uma hora e meia até o topo de uma duna, para ver de cima o visual das Lagoa das Emendadas, que dizem ser a mais bonita de todo Lençóis Maranhenses. Depois do pôr do sol, é preciso andar por mais cerca de 40 minutos de volta para o 4×4: a caminhada é feita já ao anoitecer, de forma que a recompensa é admirar o céu estrelado.
Duração: Dia inteiro, das 13h30 às 19h30
Preço: R$ 170 por pessoa no passeio compartilhado ou R$ 1.100 para quatro pessoas no privativo
Circuito América
Muita gente deixa esse circuito de fora, mas ele me surpreendeu muito positivamente: foi o passeio em que mais relaxamos e tivemos tempo de curtir as lagoas. Além disso, ele se diferencia dos outros porque não envolve atravessar as dunas de jardineira. Um carro comum nos levou até a beira do Rio Alegre, onde pegamos barcos do tipo voadeira. No trecho final, fomos caminhando por águas rasas até chegar a uma duna. Bastou escalar para ver que ela escondia a Lagoa do Toco e, logo atrás, a Lagoa da América. Passamos horas nos revezando entre uma e outra até chegar o pôr do sol, que assistimos do alto da duna. Das poucas pessoas que compartilhavam o lugar conosco, a maioria era local. A volta de voadeira, já com o céu mais escuro, foi quase uma epifania.
Duração: Meio dia, de manhã (8h30 às 12h) ou à tarde (14h30 às 18h)
Preço: R$ 130 por pessoa no passeio compartilhado ou R$ 750 para quatro pessoas no privativo
Dia 1 – Chegada em Santo Amaro e Circuito das Andorinhas (tarde)
Dia 2 – Circuito Betânia (dia inteiro)
Dia 3 – Circuito das Emendadas (dia inteiro)
Dia 4 – Circuito América (tarde)
Dia 5 – Partida de Santo Amaro
QUANDO IR PARA SANTO AMARO
Os Lençóis Maranhenses possuem duas estações bem demarcadas: quando chove e quando não chove. É durante o primeiro semestre do ano, chamado de “inverno”, que as chuvas caem e preenchem os lençóis freáticos, que acabam transbordando e formando lagoas entre as dunas. O tempo firma no segundo semestre, quando o “verão” vai gradualmente secando as lagoas.
O momento ideal para conhecer o parque nacional é quando as chuvas já foram embora, mas as lagoas estão cheias, uma janela curta de tempo que dura cerca de quatro meses. Isso geralmente acontece entre junho e setembro, mas há variações dependendo do quanto choveu naquele ano.
Uma das vantagens de eleger Santo Amaro como base é que por lá as lagoas costumam durar um pouco mais do que em Barreirinhas e Atins. Fui testemunha disso: apesar da pouca chuva no primeiro semestre de 2023, as lagoas ainda estavam lindíssimas na segunda metade de agosto, quando estive em Santo Amaro.
As chuvas têm sido abundantes nos primeiros meses de 2024, então a expectativa é que essa seja uma longa temporada. Em Santo Amaro, especificamente, tudo indica que as lagoas irão aguentar até outubro.
ONDE FICA SANTO AMARO, COMO CHEGAR E COMO CIRCULAR
Enquanto Barreirinhas e Atins ficam no lado leste do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, Santo Amaro está no lado oeste e por isso geograficamente mais perto de São Luís. Porém, o tempo que se leva para ir da capital maranhense para Santo Amaro é o mesmo que para Barreirinhas: cerca de quatro horas.
O percurso começa na BR-135, segue pela BR-402 e termina na MA-320, que dá acesso a Santo Amaro. A MA-320 é asfaltada desde 2018, mas ainda faltava a construção de uma ponte sobre o Rio Alegre, que finalmente foi inaugurada em 2021. Até então, a viagem era a bordo de 4x4s que atravessavam o curso d’água pela parte mais rasa.
Com a conclusão das obras, agora é possível chegar até o centro do vilarejo em carro comum. Tirando um buraco aqui e outro ali que obrigavam a desacelerar, fiz o trajeto sem problemas com um sedan, mais exatamente um Volkswagen Voyage, alugado no aeroporto de São Luís.
Mas há uma ressalva importante. Ainda que o asfalto tenha chegado até o centro de Santo Amaro, muitas ruas do município são de areia. Ou seja, uma vez dentro do vilarejo, existem trajetos que você consegue fazer em carro comum e outros em que só um 4×4 dá conta.
A dica de sobrevivência número um é perguntar de antemão se é possível chegar no hotel onde você está hospedado em carro comum. A número dois é dar a volta assim que se deparar com uma rua de areia pelo caminho.
Uma noite, indo da pousada até um restaurante, encontramos um trecho bem curto de areia. Meu pai, que estava ao volante, teimou que conseguiríamos passar. Resultado: o Voyage atolou e o pneu patinava, jogando areia para tudo quanto é lado enquanto a gente tentava empurrar o carro. A sorte foi que em determinado momento passou um guia local, na verdade um anjo, que tinha as manhas e deu a força que faltava para gente sair daquele aperto. Lição aprendida.
Quem prefere não alugar carro pode contratar um traslado saindo de São Luís. A maioria das agências de passeios também oferece o serviço de transfer. A Ciamat, com quem fiz os passeios, cobra R$ 750 para até quatro passageiros em um carro sedan.
A contrapartida de estar a pé é que a maioria das pousadas fica distante da praça central, onde estão os restaurantes. A caminhada passa por ruas com pouca ou nenhuma iluminação e pode levar até 20 minutos, dependendo de onde você estiver hospedado. Se isso for um problema para você, peça na recepção para chamarem um moto-táxi. Além disso, a maioria das pousadas tem restaurantes próprios.
ONDE SE HOSPEDAR EM SANTO AMARO
Casa de ferreiro, espeto de pau. A jornalista de viagem que vos fala deixou para reservar a hospedagem no final de junho e encontrou poucas opções de pousadas com disponibilidade. Era bastante óbvio que isso aconteceria: Santo Amaro é um vilarejo pequeno que recebe todos os visitantes em uma temporada de apenas quatro meses ao ano. Por isso, planeje-se com antecedência.
Ainda bem que ainda tinha lugar na Pousada Lençóis Maranhenses (nota 8,5/10 no Booking), e não à toa: a hospedagem inaugurada em 2022 é a maior do município. São 56 quartos novinhos e bem confortáveis, distribuídos em quatro prédios de dois andares. A pintura nas laterais imitando pedras não faz minha cabeça, mas as fachadas coloridas tinham sua graça. Para completar, a pousada tem piscina: era a gente chegar do passeio para pular na água e ficar por lá até escurecer.
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Como estávamos de carro alugado, veio bem a calhar o fato de todo o caminho ser asfaltado até a Pousada Lençóis Maranhenses, o que é mais exceção do que regra em Santo Amaro. Outra opção para quem está em veículo comum é a Pousada Rancho das Dunas (nota 9,1), com chalés independentes espalhados por um jardim onde também há redes sob a sombra de um cajueiro. A categoria “quarto deluxe” é especialmente charmosa, com acabamentos em madeira e palha e uma piscina privativa.
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A econômica Pousada Paraíso (nota 8,4) recebe grupos de até cinco pessoas e tem como trunfo a localização, a cinco minutos a pé da praça central – o caminho até ela também é pavimentado.
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A partir daqui, todas as pousadas mencionadas têm acesso por rua de areia. A dez minutos de caminhada da praça central, a Vila do Junco (nota 8,4) tem atmosfera rústica e cheia de charme. É composta por bangalôs de madeira e palha (nem todos com ar condicionado) e possui uma piscina de água natural, sem cloro.
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O Quintal de Areias (nota 9,4), a quinze minutos a pé do centrinho, é muito elogiada pelo atendimento, mas também muito disputada: são apenas quatro quartos.
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A agência Ciamat, com quem eu fiz os passeios, possui uma pousada chamada Ciamat Camp (nota 8,6), à beira do rio: há uma prainha de água doce privativa com caiaques à disposição. A hospedagem pode ser em chalés de madeira, que lembram muito os lodges de selva na Amazônia, ou em quartos de alvenaria, com ar condicionado. A questão é que a pousada fica na margem do rio oposta ao centrinho, o que torna mais difícil circular pela cidade: para chegar à praça central, é preciso dar uma volta e atravessar a ponte, o que leva cerca de 15 minutos de carro. Mas dentro da pousada há um restaurante com opções de massas e risotos – os donos são italianos.
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Já a Vila Capininga Ecopousada (nota 8,8), aberta em 2019, tem chalés de alvenaria que acomodam até quatro pessoas e rede na sombra. A hospedagem fica a mais de 20 minutos de caminhada da praça central, mas oferece transporte até lá por R$ 20.
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Santo Amaro também possui algumas casas para aluguel de temporada. A Casa Lençóis é tão luxuosa que chega a ser difícil acreditar que fica mesmo na vila. Até 14 pessoas podem desfrutar da mansão com piscina no terraço e dois funcionários à disposição. Fica dentro de um condomínio fechado com outra piscina, quadra poliesportiva e até heliponto.
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ONDE COMER EM SANTO AMARO
A cena gastronômica de Santo Amaro ainda engatinha. Em geral, paga-se caro por pratos muito simples. Na dúvida, os PFs de peixe costumam ser uma opção sem erro. Além disso, as pousadas costumam ter seus próprios restaurantes.
O restaurante com o ambiente mais bonito – instagramável, até – é o Dunas Bistrô, mas os preços são altos.
Bom que estão surgindo novas opções em torno da pracinha, que fica bem gostosa à noite com as mesinhas – uma pena serem de plástico – espalhadas pela calçada. É o caso do Jordan Burger, onde comemos um bom hambúrguer, e do Farol Bistrô, que tem carnes, risotos e massas no cardápio. Por ali, também fica a Casa do Picolé, com sorvetes feitos de frutas regionais.
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Caminhando por uns dez minutos a partir da praça, descobrimos dois restaurantes vizinhos com ambiente bem agradável à beira do rio. No Cajueiro (dentro da pousada de mesmo nome) provamos a pizza, simples e gostosa. Já o Rota do Sabor serve vários pratos de peixe e camarão, mas o carro-chefe da casa é mesmo a carne de sol com batata frita.
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Ainda na beira do rio, o Sol de Amaro serve um famoso arroz de cuxá (arroz branco cozido no molho de vinagreira com camarão seco e farinha de mandioca), entre outros pratos típicos maranhenses.
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fonte: viagemeturismo