Viajar para comer é uma das melhores coisas da vida — uma das razões pelo qual ainda tenho brilho nos olhos quando falo sobre meu trabalho (mesmo 10 anos depois) e, claro, o motivo principal deste espaço existir. Conhecer outras culturas através da comida é uma boa oportunidade de pegar um desvio rápido e direto para conhecer a história, a geografia, a comunhão de um povo. Na mesa, somos sempre mais generosos, mais orgulhosos, queremos mostrar nosso melhor.
Quer dizer, nem sempre. Perdi as contas de quantas más refeições eu já colecionei nessa vida de caixeiro viajante em busca de boa comida. Porque o equilíbrio quase sempre pesa para o ruim, é lamentável dizer. Para uma refeição inesquecível, foram preciso algumas tantas que eu gostaria de nunca lembrar — uma proporção do tipo 1:3, sendo otimista. Contas muito caras pela qualidade servida; quilômetros percorridos para descobrir que o restaurante era só ruim; expectativas arruinadas depois de meses esperando sentar em uma mesa específica.
Acontece, eu já me acostumei. Mas também já aprendi (a custa de estômago revirado e algumas intoxicações alimentares) a evitar algumas roubadas — ainda que, nessa área, elas representem uma imunidade que precisa ser renovada com periodicidade, é verdade, à medida que os próprios restaurantes se reinventam. Mais vacinado e cuidadoso, tenho algumas lições que fui acumulando e anotando de especialistas de verdade ao longo de mais de uma década de jornalismo gastronômico.
Não existe ciência, claro: ainda caio no conto dourado de experiências medíocres — quando não realmente péssimas. Mas algum bom senso e certa capacidade de observação me tornaram um comensal mais atento no decorrer do tempo. Os dissabores acontecem porque a vida é assim. Mas como nós estamos mesmo é em busca dos sabores, aqui vão algumas reflexões aprendidas e até totalmente empiricamente vividas (mas nunca descabidas) de como escolher um lugar na hora de comer fora. Espero que seja tão útil para você quanto tem sido pra mim.
1. Nunca entre numa gelateria pela beleza da vitrine
Essa aprendi com um verdadeiro maestro dos gelatos de Milão. Stefano Guizzetti comanda a Ciacco, uma das melhores gelaterias da cidade. Todos os seus gelatos ficam devidamente refrigerados dentro de cilindros de alumínio milimetricamente encaixados em uma limpa e minimalista bancada de mármore. “O sorvete é delicado, precisa de temperatura constante para manter textura e sabor. Se eles estão expostos, isso significa que nem sempre usam ingredientes de qualidade”, ele me disse. Caso contrário estariam derretidos escorrendo pelas vitrines com os golpes de calor. As caldas, pedaços de bolacha picada e chocolate belga ralado por cima são só para te distrair. Quanto melhor armazenado, melhor o sorvete.
2. Tudo o que parece pretensioso, no fundo, é mesmo
E prestensão é o antônimo de boa refeição, eu já aprendi. Se o espaço parece mais um ambiente de apartamento decorado que um restaurante, se o cardápio é de couro com letras em dourado, se o garçom leva mais de um minuto para explicar um prato simples do cardápio, é armadilha, Bino. Claro que todo mundo gosta de estar em um lugar legal, com decoração bem pensada, e um cardápio bem impresso também impressiona. Mas quando é tudo demais, pode ter certeza que é uma forma de te desviar do que deveria ser o mais importante: a comida.
3. A pressa é inimiga da (boa) refeição
Tá bem, todo mundo odeia ter que esperar uma hora para a comida vir à mesa, mas me surpreende muito mais (pelo negativo, claro!), quando eu faço um pedido e, num piscar de olhos, o prato chega à minha frente antes mesmo de me servirem água. Isso significa que a cozinha deixa tudo o mais pré-produzido possível, muitas vezes só aquecendo o prato no microondas ou em fornos rápidos — como aqueles das cafeterias que transformam um folhado congelado em algo de queimar os beiços em segundos. A comida não perdoa o que é muito brusco: perde-se sabor, textura, aromas. Antes de sentar em um restaurante, observe o serviço ali por uns minutinhos: vai evitar muitas frustrações.
4. Se o cardápio for muito extenso, fuja!
É muito difícil que um restaurante consiga fazer bem dezenas de receitas ao mesmo tempo. Todo mundo tem uma especialidade — ou algumas delas, se falarmos dos cozinheiros mais talentosos. Historicamente, os estabelecimentos mais tradicionais serviam de tudo um pouco para agradar todos os tipos de clientes. Mas, com a evolução da oferta de restaurantes que há hoje, fica difícil dar crédito para alguém que sirva pizza, bife com batata frita e “o melhor cafreal indiano” (prato picante à base de galinha) como quer me fazer acreditar o restaurante na rua da minha casa.
5. Quanto mais turístico, pior
É uma máxima já bem conhecida, mas que precisa ser lembrada: as chances de comida ruim aumentam exponencialmente conforme o fluxo turístico da região em que os restaurantes estão localizados. Comer perto da Torre Eiffel, da estação central ou naquele bairro mais apinhado tende a ser mais arriscado. Muitos estabelecimentos não estão lá muito preocupados com a qualidade porque sabem que fome é uma necessidade — e invariavelmente terão clientes. Eles apostam no fluxo. E você, se puder, deveria não dar chance a eles. Mas atenção: há exceções para contradizer tudo o que escrevi antes: já comi pastas maravilhosas perto do Coliseu, já provei o melhor croissant na frente da Norte Dame e vou sempre comer umas bifanas do restaurante que fica na frente da estação de trem perto de casa. Aliás, acho que esse tema valeria um texto.
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Fonte: viagemeturismo