As mudanças divulgadas esta semana pelo YouTube e a multa de US$ 170 milhões que a plataforma recebeu na última quarta-feira (4) acenderam mais uma vez um sinal de alerta: é necessário mais cuidado com o conteúdo consumido por crianças na internet. “Afinal, quem está cuidando dos nossos filhos e desenvolvendo o senso crítico deles? São as grandes corporações e redes sociais ou somos nós pais, tios e avós?”, questiona a pós-doutoranda em educação digital Katia Ethiénne Esteves dos Santos.
De acordo com ela, o conteúdo apresentado digitalmente aos pequenos pode influenciar seu desenvolvimento cognitivo, físico e socioemocional de maneira intensa, e ainda transmitir valores contrários aos que a família tenta transmitir dentro de casa. Além disso, a criança tem, naturalmente, dificuldades para diferenciar o real do virtual e pode sentir-se incompleta por não ter no seu dia a dia tudo o que é mostrado nos programas e anúncios que vê.
“A criança assiste a outra falando sobre brinquedos, roupas e viagens, mas talvez não tenha capacidade para compreender por que o outro tem aquilo e ela, não”, afirma a pesquisadora. “E essa insatisfação com o que se tem pode trazer problemas como depressão, ansiedade e até levar ao suicídio”, adverte a especialista, que aponta como forma de prevenção a necessidade de os pais estarem atentos ao que os filhos acessam na internet.
Esse, inclusive, foi um dos motivos que levou a Comissão Federal de Comércio (FTC), dos Estados Unidos, a punir o YouTube. De acordo com a sentença, a plataforma coletava dados das crianças sem o conhecimento dos pais, transmitia as informações aos anunciantes e permitia que eles divulgassem seus produtos no meio dos vídeos, violando regras de proteção à privacidade dos usuários menores de 13 anos.
Além disso, a plataforma não possui nenhum mecanismo para barrar a apresentação de anúncios impróprios aos seguidores de canais voltados ao público infantil, o que abre espaço para a apresentação de conteúdo inadequado à idade dos usuários. “E como saber que o seu filho está assistindo um conteúdo assim? Somente com um acompanhamento constante”, garante Katia.
De acordo com ela, os pais precisam sentar com os filhos desde pequenos para perguntar o que eles têm visto, o que têm feito e identificar como ajudá-los. “Só que muitos pais ouvem a resposta da criança e não vão atrás das informações, sentimentos e percepções que precisam ser buscados para que esse pai conheça de verdade o filho”. “Precisamos retomar a escuta verdadeira nas famílias”, orienta.
Outra dica, segundo a pedagoga, é se colocar como aprendiz diante da criança quando o assunto envolver tecnologia. Afinal, ela já nasceu envolvida pelos aparelhos e tem mais facilidade que o adulto para lidar com eles. “Normalmente os filhos têm muito orgulho de ensinar os pais, então eles falam, explicam como conseguiram a informação e o pai consegue um bom espaço para orientá-lo”.
Mudanças no YouTube
Uma boa notícia para acalmar – um pouco – as famílias em relação aos vídeos acessados pelas crianças atualmente é a lista de exigências que a FTC apresentou ao YouTube esta semana. Além da multa milionária, a comissão solicitou que a plataforma desenvolva um sistema para identificar os conteúdos direcionados ao público infantil, que eles obedeçam à Lei norte-americana de Proteção à Privacidade Online para Crianças (Coppa) e que solicitem permissão dos pais antes de coletar informações pessoais de menores de 13 anos.
Além disso, o próprio YouTube divulgou um comunicado em seu blog oficial informando que não exibirá mais anúncios segmentados nos conteúdos infantis e que desabilitará notificações e comentários nos vídeos para crianças. As mudanças entram em vigor a partir de janeiro de 2020.
Enquanto a alteração garante mais segurança ao conteúdo, ela também deve reduzir o número de canais destinados a esse público porque a plataforma deixará de pagar valores em dinheiro de acordo com a quantidade de pessoas que assistem aos vídeos e anúncios.
O youtuber brasileiro Felipe Neto se posicionou a respeito da mudança e afirmou que o canal do seu irmão Luccas Neto será um dos afetados. No entanto, explicou que eles já estava preparado para isso. “A maior bomba não foi para o Luccas Netto, pois ele já está cercado por uma gigantesca infraestrutura de receita”, escreveu. “Quem mais será ferido são os canais de crianças comandados pelos pais. Pelo que conheço, nenhum se preparou para isso e terá a monetização cortada”, completou.
A pós-doutoranda em educação digital, no entanto, vê as mudanças com bons olhos e acredita que trará benefícios. “Não é à toa que existe uma idade mínima para a criança estar nas redes sociais e utilizar as mídias. Existem pesquisas que mostram a melhor idade para esse contato”, afirma a especialista, que também sugere um momento de reflexão dos pais que incentivam a exposição de seus filhos na internet. “O que você quer para ele com essa visibilidade? Será que ele sabe lidar com isso? E como será quando a fama acabar?”.
Para evitar que o contato com o mundo virtual traga prejuízos, a especialista orienta a família a prestar atenção ao comportamento do filho e dedicar tempo ele. “Estejam presentes como pais”. Afinal, “o que você transmitir em relação a valores, ética e responsabilidade é o que fará diferença no resultado final”, garante Katia.
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Fonte: semprefamilia.com.br