O Ministério das Relações Exteriores do Brasil enfrenta uma disputa judicial na França depois de demitir Tiago Fazito, ex-funcionário do . O Itamaraty perdeu a ação trabalhista e se recusa a pagar a indenização há mais de dois anos, que já ultrapassa € 320 mil, mais de R$ 2 milhões.
Segundo do jornal Folha de S.Paulo, Tiago Fazito agora processa o governo francês e busca que o país que sedia a representação diplomática brasileira assuma a dívida. O Itamaraty argumenta que a decisão da Justiça francesa atenta contra a soberania nacional.
O caso começou em 2014, quando Fazito, contratado como técnico de informática em 2012, descobriu que seus colegas recebiam € 500 a mais por funções equivalentes. Alegando desigualdade, ele entrou com uma ação por isonomia salarial, conforme a legislação trabalhista francesa.
Fazito foi contratado em dezembro de 2012 como técnico de informática, descrito no contrato como “auxiliar administrativo”, com um salário de € 2 mil — na época, o salário mínimo na França era de € 9 por hora, ou € 1,3 mil ao mês em uma carga horária comum.
O ex-funcionário disse à Folha que outros funcionários do consulado já tinham processado o Itamaraty por desvio de função. Ele próprio diz ter atuado no atendimento ao público e no trabalho com passaportes, mesmo tendo sido contratado como técnico de informática.
Fazito também fundou um sindicato para representar funcionários locais das representações diplomáticas brasileiras, o que, segundo ele, motivou sua demissão.
“Fui despedido por questão essencialmente política, por decisão da cônsul na época [Maria Edileuza Fontenele Reis]”, disse ao jornal. “Me demitiram por justa causa argumentando que anexei documentos sigilosos ao processo, um absurdo”. Ele se referiu ao contrato de trabalho e documentos rotineiros com que lidava e comprovariam o desvio de função.
Em resposta aos questionamentos da Folha, o Itamaraty diz que Fazito foi demitido por “constatação objetiva de falta grave à luz do contrato que regia sua relação trabalhista com o Consulado-Geral em Paris”, sem dar mais detalhes.
No processo, ao qual a reportagem teve acesso, a Justiça francesa descartou a argumentação de que os documentos não poderiam ser levados em conta em razão de sua natureza supostamente sigilosa. Afirmou ainda que o ex-funcionário não utilizou os papéis com outro motivo além do de provar os fatos do caso.
Logo depois de ser mandado embora, Fazito moveu outro processo contra o Itamaraty, no qual argumentava que a demissão foi ilegal e pedia reintegração.
A Corte determinou a reintegração de Fazito e o pagamento dos salários devidos. Além disso, negou a imunidade diplomática alegada pelo Brasil, com base na Convenção de Viena de 1961.
Para os magistrados da Corte de Apelações de Paris, da segunda instância, o caso é uma questão trabalhista natural do Direito privado, e portanto o princípio da imunidade diplomática não se aplicaria ao processo.
Segundo Fazito, o prazo para que o Brasil apelasse da decisão terminou em setembro de 2024 sem que o Itamaraty apresentasse recurso. Isso porque, segundo a legislação francesa, o empregador que deseja apelar de decisão de segunda instância precisa primeiro realizar o pagamento da indenização devida, o que não ocorreu. Caso ganhe a ação posteriormente, vai ser reembolsado.
O ex-funcionário entrou, então, com pedido para que a decisão transitasse em julgado — ou seja, que o caso seja oficialmente encerrado, sem possibilidade de recurso. A Justiça francesa ainda não decidiu sobre o pedido.
Questionado pela Folha, o Itamaraty descreveu a ordem de reintegração de Fazito como um atentado à soberania do Brasil e afirmou que não vai acatar a decisão por se tratar de uma ordem de recontratação de funcionário demitido.
“Decisões dessa natureza vão além da esfera estritamente trabalhista e atentam contra a soberania e a inviolabilidade das representações brasileiras no exterior, princípios sobre os quais não há hipótese de relativização”, escreveu a pasta.
“O Estado brasileiro determina o pagamento de decisões desfavoráveis sempre que esgotados os recursos a serem interpostos no Judiciário local”, acrescentou.
“Entretanto, não pode acatar decisões judiciais que atentem contra as inviolabilidades de seus postos no exterior”, conclui, descartando a hipótese de que o caso poderia afetar as relações diplomáticas entre o Brasil e a França.
Fonte: revistaoeste