Um advogado e um historiador franceses publicaram, na quinta-feira 20, um no qual afirmam que o antissemitismo da esquerda é menos ruim do que o de direita. O antissemitismo é um tema central da campanha para as eleições legislativas antecipadas na França, o país que conta com a maior comunidade judaica da Europa e onde os ataques antissemitas se multiplicaram desde o ataque do Hamas, em 7 de outubro.
De acordo com Arié Alimi e Vincent Lemire, “não há equivalência entre o antissemitismo contextual, populista e eleitoreiro, utilizado por certos membros de La France Insoumise (de extrema esquerda) e o antissemitismo fundador, histórico e ontológico do Rassemblement National (de extrema direita)”.
Troque a palavra “antissemitismo” por “racismo contra negros” ou “homofobia” e a aberração da tese ficará ainda mais estridente aos ouvidos amortecidos.
Não há “antissemitismo contextual”, o ódio contra judeus independe de adjetivos, e o seu uso para fazer populismo e obter votos (no caso, entre os numerosos muçulmanos franceses) apenas faz do antissemita um cínico oportunista também.
A esquerda francesa, assim como todas as outras, vinha manifestando despudoradamente o seu antissemitismo, sempre sob o manto do “antissionismo” pró-Palestina, até o presidente Emmanuel Macron dissolver a Assembleia Nacional e convocar novas eleições. Agora, confrontada prematuramente com a sua posição indigna, está fazendo o que sempre faz: relativiza os seus próprios defeitos.
O Rassemblement National, por seu turno, renunciou ao seu antissemitismo “fundador, histórico e ontológico” e tem sido forte apoiador de Israel e da comunidade judaica na França desde muito antes da antecipação das eleições. Tanto é que um grande número de judeus decepcionados com a esquerda cogita votar no partido da extrema direita, apesar de ele ainda contar com membros racistas.
O dado que ultrapassa as fronteiras francesas e o âmbito do antissemitismo é este: basta você ser de esquerda para que todos os seus pecados passados e presentes tenham justificativa e sejam desculpados. Se você é de direita, contudo, já está condenado de antemão ao inferno, mesmo que o seu presente virtuoso renegue o passado pecador.
O caso brasileiro é visível até para as tias do zap por ser caricatural de tão paroxístico: a Lula e aos lulistas perdoa-se tudo aquilo que se deve condenar a Jair Bolsonaro e aos bolsonaristas. O primeiro é o bem; o segundo é o mal.
Existem as fake news do bem e as fake news do mal; existem a corrupção do bem e a corrupção do mal; existem o machismo do bem e o machismo do mal; existem a ignorância do bem e a ignorância do mal, existem a depredação do bem e a depredação do mal, inexiste golpe de esquerda e só existe o golpe de direita — e, a partir deste momento, macaqueemos a gauche francesa, existem o antissemitismo do bem e o antissemitismo do mal.
O cerne do marketing da esquerda é simples: tudo nela só pode ser bom ou desculpável porque a esquerda quer a redenção da humanidade. É assim desde o pioneiro Jean-Jacques Rousseau, que entregou os cinco filhos à adoção e ainda achava que se livrar da prole foi uma ótima ação.
Como a direita não quer redimir a humanidade, mas privilegia o direito e o mérito individuais, ela só pode ser associada aos baixos instintos e piores sentimentos. É coisa de gente egoísta e impiedosa e, portanto, portadora de uma culpa original.
Depois de ler o artigo do advogado e do historiador franceses, recomendarei a judeus vítimas de antissemitismo perguntar se o seu algoz é de esquerda ou de direita. Se for de esquerda, eles devem aceitar o contexto e deixar para lá. Quem sabe até agradecer quem o ofende, humilha e agride. Afinal de contas, é um bom antissemita, não um mau antissemita de direita.
Fonte: revistaoeste