(J. R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 6 de janeiro de 2024)
O Brasil não vai ter paz enquanto não for fechado o inquérito que o Supremo Tribunal Federal, através do ministro Alexandre de Moraes, abriu cinco anos atrás para investigar “atos antidemocráticos”. Desde então, vem servindo como uma licença oficial para se suprimir direitos civis, anular qualquer lei em vigor no Brasil e criar um Estado policial neste país. O inquérito é uma declaração permanente de guerra. Foi aberto para apurar “notícias falsas”, que poderiam atingir a honra e a segurança do STF. De lá para cá, como se diz hoje, “viralizou”. Foi gerando um inquérito criminal depois do outro (tantos, que não se sabe mais ao certo quantos são no momento) e passou a incluir todos os delitos que alguém possa praticar, inclusive os que não existem em lei nenhuma. É uma aberração jurídica que não existe, nem seria admitida, em qualquer democracia séria do mundo.
É possível, naturalmente, que a ideia de paz seja a última coisa que passe na cabeça do ministro, do STF e da parceria que mantêm com o governo Lula. (Em cinco anos de inquérito não houve um único indiciado, nenhum, que possa ser descrito como de “esquerda” — o que faz do Brasil o único país do planeta em que só a direita é capaz de mentir.) Os inquéritos, afinal, permitem que o Supremo e seus sócios façam o que bem entendem: prisões, censura, bloqueio de contas bancárias, apreensão de passaportes, quebra de sigilo, confisco de celulares e tudo o que possa servir como instrumento de repressão. É como nas leis de “segurança do Estado” que existem em todas as ditaduras para perseguir adversários políticos. O inquérito perpétuo do STF (“só termina quando terminar”, diz Moraes”), faz a mesma função, dizendo que defende a “segurança da democracia”. Tudo bem — mas se não quiserem a paz, terão de apostar cada vez mais na força e desrespeitar a cada vez mais a lei.
Moraes em cena | “Jogo em aberto”, artigo de J. R. Guzzo publicado na Edição 198 da Revista Oeste
Não há, obviamente, nenhuma ameaça à democracia que justifique nada do que o ministro está fazendo. Essa realidade, somada às ilegalidades em massa dos inquéritos, levam à uma “cristalina e pacífica conclusão”, como diz em editorial do Estadão: “É tempo de os inquéritos criminais do STF relativos a atos antidemocráticos serem encerrados, de acordo com a lei”. Não é possível, com base na razão, contestar o que diz o editorial. Em vez de apresentar argumentos, . É menos jornalismo do que um exercício de taquigrafia em que só o ministro fala. Mas é mais um grito de guerra.
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Fonte: revistaoeste