Via @portalmigalhas | Por unanimidade, 2ª turma do STF determinou a absolvição de um homem negro, de 65 anos, condenado por tráfico de drogas com base em provas consideradas insuficientes e vícios processuais. A Corte concedeu habeas corpus de ofício, apontando parcialidade da magistrada na condução da audiência de instrução e julgamento.
Em outubro, o colegiado havia determinado a liberdade do réu, devido à fragilidade probatória. Agora, decidiu pela anulação da condenação.
No caso, o idoso foi abordado em frente a um imóvel na periferia de São Paulo, apontado como depósito de drogas por denúncia anônima. Embora negasse qualquer vínculo com o local e que estaria na região para visitar sua filha, foi preso, acusado de tráfico de drogas e condenado em 1ª e 2ª instâncias.
No entanto, a defesa apontou a fragilidade do conjunto probatório, destacando que o idoso não portava drogas, dinheiro, armas ou outros itens que sugerissem envolvimento com o tráfico.
Além disso, ressaltou que a condenação levou em consideração antecedentes criminais de mais de 16 anos, contrariando entendimento do STF de que tais antecedentes não podem embasar a formação de culpa.
Na análise do habeas corpus, o relator, ministro Edson Fachin, destacou duas razões principais para a concessão da ordem de ofício.
Em primeiro lugar, a insuficiência probatória. “Esses elementos, evidentemente, são insuficientes para atestar com segurança a autoria delitiva”, afirmou, ao mencionar que as provas se basearam em uma denúncia anônima e na presença do réu próximo ao imóvel.
Outro ponto foi o descumprimento do art. 212 do CPP, que comprometeu o princípio da imparcialidade.
Durante a audiência de instrução e julgamento, em 1ª instância, a magistrada assumiu papel preponderante na inquirição de testemunhas, prática que, segundo a decisão, “violou o texto legal do art. 212 do CPP, exercendo função que não lhe cabia na dinâmica instrutória da ação penal”.
Diante dessas falhas, o Supremo determinou a imediata soltura do réu e sua absolvição, com fundamento no art. 386, VII, do CPP. “Em processo penal, a dúvida resolve-se em benefício do réu”, concluiu o relator.
- Veja o voto.
“Trabalho mal feito”
Ministro Gilmar Mendes, ao acompanhar o relator, acrescentou que, em relação à busca domiciliar, a ação policial baseou-se exclusivamente em denúncia anônima, sem qualquer averiguação preliminar ou atividade de inteligência que pudesse justificar o ingresso forçado no imóvel.
Segundo o decano do Supremo, a jurisprudência da Corte exige “fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori”, para legitimar a entrada em domicílios.
Ainda, criticou a atitude dos policiais, como um exemplo de “trabalho mal feito”, resultando em lacunas investigativas fundamentais, como a identificação do proprietário do imóvel ou a vinculação concreta do réu ao local.
Também ressaltou a inversão do ônus da prova, como forma de desrespeito ao princípio da presunção de inocência. Pontuou que as incertezas deixadas pela investigação foram imputadas ao réu, o que contraria os preceitos do devido processo legal.
Além disso, quanto à magistrada de 1ª instância, ministro Gilmar Mendes entendeu que ela assumiu um papel incompatível com o sistema acusatório ao protagonizar a instrução processual.
Veja o voto vogal.
- Processo: HC 246.965