Via @portalg1 | A Polícia Civil de São Paulo investiga, por meio de um inquérito policial, o “golpe do falso advogado”, aplicado em clientes de escritórios de advocacia.
Os criminosos obtêm os dados dos clientes e dos advogados por meio dos autos do processo, ou seja, dos documentos relacionados ao processo jurídico — que são públicos. Com essas informações em mãos, eles entram em contato com os clientes se passando pelo escritório de advocacia, por meio de ligações e de aplicativos de mensagens, utilizando as fotos dos advogados e as logomarcas dos escritórios.
Como os criminosos têm todas as informações referentes ao caso, as vítimas acreditam realmente estarem se comunicando com um representante do escritório contratado por elas. Os criminosos, então, pedem o pagamento de boletos falsos ou transferências via PIX, alegando que são referentes a despesas do processo.
Foi o caso de Jesuíno Silva, motorista de ônibus que mora na capital paulista. Ele fez o pagamento de sete boletos que, juntos, ultrapassam R$ 117 mil.
“Veio por mensagem, no nome da minha advogada. Primeiro veio um [boleto] de R$ 3 mil, aí foi aumentando. Teve um de R$ 40 mil”, conta. “Agora eu estou devendo. É difícil, do INSS eu recebo uma mixaria e não posso fazer nada.”
A Constituição de 1988 prevê que todo o processo judicial tem que ser público.
O presidente da Comissão Nacional de Cibercrimes da ABRACRIM (Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas), Luiz Augusto D’Urso, afirma que é essa publicidade dos dados pessoais que permite que golpes como esse sejam facilitados.
“Antes não havia esses problemas de vazamento de dados, de internet, de crimes cibernéticos. O que se comprova hoje é que a regra de estarem públicas todas as informações gera risco, por isso eu defendo que tenhamos sigilos de documentos durante o processo”, afirma o advogado especialista em crimes digitais. “Todo mundo ver tudo pode ser um problema.”
A polícia está com uma investigação em andamento a respeito desse golpe. A Secretaria da Segurança Pública (SSP) do estado informou, por meio de nota, que essa investigação visa a identificação e a responsabilização dos envolvidos.
Documentos mostram como golpistas agiam — Foto: Reprodução
A reportagem pediu um posicionamento para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e aguarda retorno.
Criminosos fingiam trabalhar em bancos para enganar as vítimas — Foto: Reprodução
Casos em outros estados
Também há relatos de vítimas desse golpe em outros estados do Brasil. Um advogado que tem escritório em Curitiba (PR) e preferiu não se identificar afirma que a primeira tentativa de golpe com um cliente dele aconteceu em setembro de 2022.
De lá pra cá, foram 42 clientes ao todo que o informaram sobre a tentativa de golpe. Destes, sete acabaram fazendo o pagamento dos falsos boletos. Somados os valores, o prejuízo chega a R$70 mil.
“Em julho, um cliente pagou um boleto de R$ 23 mil”, conta o advogado. “E este valor, às vezes, é o valor ‘da vida’ dele, uma vez que são clientes que já esperaram pelo processo quatro, cinco, oito anos, então o cliente não hesita. Vai lá e paga o boleto sem se dar conta que está falando com outra pessoa.”
Uma das vítimas desse golpe, na capital paranaense, foi o aposentado Francisco Castro. Há duas semanas, ele recebeu mensagens no Whatsapp de um criminoso que se passava pela advogada dele. O aposentado fez dois pagamentos por meio de PIX, totalizando cerca de R$13 mil.
“Eles me passaram documento com meu nome, meu CPF, meus dados do banco e aquilo foi dando credibilidade e eu fui indo”, conta. “Quando eles informaram mais uma taxa de R$ 19 mil, e eu não tinha mais dinheiro praticamente, pensei: caí em um golpe”, diz Francisco.
O aposentado conta que já adotou medidas para evitar cair em novos golpes: “No mesmo dia, deixei como limite máximo de PIX R$1 mil. Pra nem eu mesmo me sentir propenso a fazer qualquer coisa. Porque se alguém me solicitar dinheiro eu vou precisar de 24h, 48h para liberar e até lá eu tenho tempo pra pensar ou pra pesquisar.”
Por meio de nota, a Polícia Civil do Paraná afirma que está investigando os casos e realizando diligências a fim de esclarecer os fatos.
Em Brasília (DF), o advogado previdenciário Diego Cherulli também relata que três clientes do escritório onde ele atua acabaram caindo no golpe.
Os criminosos se passaram pelo escritório de advocacia e enviaram mensagens por meio de um aplicativo informando que os clientes teriam um valor a receber da Justiça, mas que para isso, antes precisavam fazer o pagamento de um imposto e dos honorários do advogado.
Na capital cearense, um advogado que também preferiu não se identificar afirma que foram cerca de 60 tentativas de golpe em clientes do escritório em que ele atua. Dois dos clientes realizaram os pagamentos. “Aqui em Fortaleza, todo dia é com um colega previdenciarista diferente”, diz o advogado.
Organização criminosa
Em novembro do ano passado, uma operação conjunta das polícias de três estados prendeu 15 pessoas no Ceará, Paraná e São Paulo, que faziam parte de uma organização criminosa que aplicava o ‘Golpe do Falso Advogado’.
O grupo de criminosos tinha como principal alvo vítimas nos estados do Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo. Somente em Curitiba, ao menos 50 pessoas registraram boletim de ocorrência.
Na operação realizada em 2023, foram cumpridos 63 mandados de busca, além da apreensão de cerca de R$17 mil, 29 celulares, arma de fogo, máquinas de cartão, pen drives e documentos.
Por Amanda Lüder, Globonews — São Paulo
Fonte: @portalg1