Uma reportagem do Fantástico, da TV Globo, que foi ao ar na noite desse domingo (18), mostra como funcionava suposto esquema de fraudes em procedimentos ortopédicos no sistema de saúde de Mato Grosso e outros dois estados envolvendo a empresa MedTrauma.
Em Mato Grosso, a empresa tinha contrato com o Estado e a Prefeitura de Cuiabá. Os contratos assinados pela MedTrauma foram baseados em documento chamado Ata de Registro de Preços (entenda como funciona mais abaixo).
No ano de 2021, o caminhoneiro Eduardo Goivinho, de 51 anos, precisava de uma cirurgia no quadril, e a Justiça do Mato Grosso determinou que o Estado fornecesse uma prótese de cerâmica. Contudo, após a cirurgia, Eduardo descobriu que a prótese implantada não correspondia àquela determinada pela juíza.
Eduardo questionou o hospital e recebeu uma nota fiscal de uma empresa chamada Prótesis Distribuidora de Implantes Cirúrgicos Ltda. A nota não tinha marca, modelo, validade ou registro da prótese na Anvisa, informações que são obrigatórias por lei.
Os materiais ortopédicos usados na cirurgia de Eduardo custaram mais de R$ 17 mil, todos fornecidos pela empresa Protesis. Esta empresa faz parte de um grupo com outras 9 empresas, incluindo a MedTrauma Serviços Médicos Especializados Ltda, sediada em Cuiabá. A MedTrauma possui contratos tanto com a prefeitura da cidade quanto com o governo de Mato Grosso para administrar toda a área ortopédica dos hospitais públicos do estado, tanto da capital quanto do interior.
“Até agora eu não sei que prótese colocaram em mim, que a do juiz, eu tenho certeza que não foi”, disse o caminheiro na reportagem.
No dia 2 de fevereiro deste ano, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão nas sedes da MedTrauma e empresas do seu grupo. Em Mato Grosso, o esquema também é investigado pela Operação Espelho, da Polícia Civil.
Contratação por Ata de Registro de Preços
A exemplo, uma empresa vence uma licitação para fornecer material escolar para a rede de ensino de um estado do sudeste. Essa licitação gera uma ata com uma relação dos preços de lápis, cadernos e outros itens. Um estado do nordeste também precisa comprar material escolar. Por lei, em vez de abrir uma nova licitação, ele pode utilizar a ata de registro de preços que foi gerada na licitação do sudeste.
“É uma modalidade de contratação que a administração pública faz. Muito interessante porque se de repente ela encontra uma oferta no mercado que é mais vantajosa do que o preço que está registrado, mesmo que seja uma oferta momentânea, ela pode comprar fora da ata”, explica Walter Cintra Ferreira, Professor em Gestão em Saúde / FGV.
“Uma ata de registro de preço não é ilegal. Agora, se essa ata ela, digamos assim, ela tem um vício, ela foi utilizada para superfaturar serviços e coisas desse tipo, ela acaba se disseminando para outros estados na medida que outros estados aderem a essa ata. Você no fundo, pode estar, e aí coloco ênfase, em ‘pode’, exportando um esquema ilegal de superfaturamento, eventualmente de corrupção para outros lugares”, diz Vinícius Marques de Carvalho, ministro da Controladoria Geral da União.
O que dizem os citados
À reportagem do Fantástico, um advogado da MedTrauma apresentou um argumento para justificar os valores de materiais considerados pela CGU muito acima até do preço de mercado. “A empresa não tem absolutamente nada a esconder e, pelo contrário, ela tem orgulho do serviço que presta”, afirma.
O advogado defendeu o modelo de contrato que concede à MedTrauma poderes para gerenciar todo o processo, desde a contratação de médicos até o fornecimento de próteses e órteses, conhecidas como OPMES.
O advogado garantiu que qualquer paciente pode procurar a empresa com pedido de informações de sua prótese. No entanto, não quis comentar as denúncias feitas por pacientes à reportagem.
O Governo de MT por meio da SES-MT (Secretaria de Estado de Saúde) disse que o pagamento de materiais utiliza valores de referência da tabela SUS. Para materiais fora da tabela, é praticado o menor valor de mercado. Sobre a rastreabilidade das próteses, disse que atende às exigências da Anvisa.
A Empresa Cuiabana de Saúde Pública, que administra os hospitais de Cuiabá, justificou que o município não chegou a executar o contrato com a MedTrauma devido à intervenção estadual. Por sua vez, o gabinete de intervenção afirmou que o contrato já estava firmado antes de assumir a gestão da saúde do município.
Fonte: primeirapagina