Nos últimos cinquenta anos a população mundial cresceu quase cem por cento, já somos mais de oito bilhões de pessoas no planeta. O avanço da medicina e da tecnologia na área de saúde foram alguns dos fatores que contribuíram com o aumento da longevidade e, consequentemente, do crescimento populacional.
🎧 Ouça abaixo a entrevista do psiquiatra Marcos Estevão à Morena FM:
A tecnologia, porém, não avançou apenas na saúde, avançou também nas pesquisas científicas e sociais e, principalmente, na comunicação, o que, teoricamente, nos tornaria mais sociáveis, comunicando-nos uns com os outros, sem restrição de tempo ou lugar. Todavia, não foi o que aconteceu, nem o que está acontecendo, e longe do que virá a acontecer; a tecnologia está nos isolando cada vez mais. Compartilhamos nosso tempo com nossos smartphones. Estamos nos condenando à solidão.
A sociedade gira em torno deste novo normal, a economia já é on-line, as mensagens entre amigos são por palavras digitadas ou por áudio, os relacionamentos são por vídeos. O toque de mão, o abraço, o beijo são ocasionais, cada vez mais raros, até o sexo vem sendo substituído por relações virtuais. As ligações afetivas e outras hoje em dia são mais frágeis, tênues, entramos e saímos dos relacionamentos individuais ou grupais com mais facilidade, ficamos quando nos agrada e saímos quando nos sentimos frustrados em nossas opiniões. Aceitamos mal os diferentes e por isso nos afastamos facilmente deles.
Fazemos novas amizades a cada instante, amigos virtuais, que muitas vezes mal conhecemos e a cada instante também as desfazemos. Ainda assim, vivemos a necessidade de procurar novas amizades, de encher nossa pasta de amigos e os procuramos às dezenas ou centenas. Por algum tempo parece que estamos satisfeitos, felizes com as novas amizades, mas logo nos decepcionamos com elas, porque hoje somos menos tolerantes e novamente diminuímos nosso número de amigos.
Vivemos hoje ora com mais amigos virtuais, ora com menos amigos virtuais e sempre solitários. O filósofo e sociólogo Zygmunt Bauman diz que vivemos em uma pós-modernidade ‘líquida’. Em seu livro “Amor Líquido”, Bauman observa que as relações humanas se tornam cada vez mais “flexíveis”, as pessoas se conectam e desconectam conforme sua vontade.
Os laços afetivos são cada vez mais frágeis e a solidão cada vez mais presente. Não mais precisamos uns dos outros, necessitamos apenas de um pequeno aparelho sem vida, mas que para muitos de nós é a própria vida. Ele é a nossa companhia em qualquer lugar, a qualquer hora. Fazemos o que desejamos, independente do outro, que também está fazendo o que deseja, logado no seu próprio aparelho, independente de nós.
Parece mesmo que estamos cada vez mais sós, dentro de bolhas individuais, vivendo a era da sociedade solitária. A solidão, que hoje parece normal, na verdade é prejudicial e já estamos percebendo isso na atualidade e veremos muito mais no futuro. Os prejuízos são tanto físicos, quanto emocionais. A solidão vem sendo associada a maior prevalência de doenças cardiovasculares. No campo psíquico, vê-se o surgimento e o desencadeamento de diversas doenças, principalmente a depressão e o suicídio.
Com o tempo a solidão nos faz valorizar a relação humana, a proximidade física entre nós, a socialização, o face a face, o abraço. É importante nos movimentarmos e procurarmos viver socialmente. Isso vai trazer um enorme ganho à nossa saúde física e, principalmente, mental. Quando não conseguimos interagir como deveríamos, quando a solidão está nos causando dor e desconforto, precisamos da ajuda de um profissional de saúde mental.
Fonte: primeirapagina