Sophia @princesinhamt
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Um rabino, um muçulmano e um escritor francês se encontram – final é feliz

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Crimes de ódio são graves – e também sujeitos a interpretação. No caso de Michel Houellebecq, o mais conhecido escritor francês, duas declarações não deixaram lugar a dúvida.

Primeira: “O que as pessoas de estirpe francesa querem é que os muçulmanos parem de roubá-las e matá-las. Na falta disso, que vão embora”.

Segunda: “As pessoas estão se armando. Buscam fuzis, fazem cursos em stands de . E não são os malucos. Quando territórios inteiros estiverem sob controle islâmico, acho que haverá atos de resistência. Haverá atentados diante das mesquitas, nos cafés frequentados por muçulmanos, em suma, Bataclans ao contrário”.

A referência é aos terríveis atentados lançados por extremistas islâmicos em 13 de novembro 2015, com 130 mortos.

Para lembrar: Houellebecq é o autor de Submissão, o livro em que trata da adesão progressiva dos franceses a um estado dominado pela lei islâmica, a partir da eleição de um presidente presumidamente moderado.

O reitor da maior mesquita de Paris, Chems-Edinne Hafiz entrou com uma queixa crime contra o escritor, por incitação ao ódio.

A briga estava formada – e em torno de uma questão incendiária na França, onde uma multiplicidade de fatores leva uma parte da população muçulmana, originária na maioria do norte da África, a rejeitar o sistema francês, uma posição que induz uma minoria radicalizada a abraçar o extremismo islâmico. Numa reação contrária, muitos franceses aderiram a teses de extrema contra a imigração.

Está aí o caldo de cultura que transformaria as declarações do escritor numa fogueira – ardentemente debatida em programas de televisão a cabo onde a figura do intelectual francês continua a ter uma projeção quase mitológica.

O escritor de ar amarfanhado e complicado (na verdade, Michel Thomas) enfrentaria mais um processo? Teria que deixar a França novamente? Viraria alvo de terroristas? Forneceria elementos aos que pregam a impossibilidade da integração dos muçulmanos à sociedade francesa?

Foi aí que entrou em cena “a proposta pública e fraternal” do rabino chefe da França, Haim Korsia, de “nos colocar em volta de uma mesa”, segundo o reitor da mesquita.

No encontro, que durou seis horas, Houellebecq concordou em mudar alguns elementos de suas declarações e o líder muçulmano retirou a queixa.

Não foi um arrependimento padrão, do tipo produzido por linchamento virtual, mas uma avaliação honesta feita pelo escritor de que suas declarações, que insistiu serem um reflexo do que vê acontecer, não uma opinião, tinham um teor reducionista. Tradução: colocavam todos os muçulmanos como ladrões ou assassinos, uma barbaridade que nunca foi o que pretendeu.

Houellebecq tinha batido o pé nas declarações originais, ironizando que é um “islamofóbico em período parcial” e que gostaria de escrever uma cena otimista sobre vizinhos de diferentes origens fazendo um congraçamento amistoso, “mas não é isso o que observo”.

Infelizmente, em muitas áreas da França não existe nada que dê motivos para o otimismo. No Ano Novo, o governo chegou a “celebrar” indiretamente que apenas 690 carros foram incendiados em bairros com grande população de origem estrangeira, uma violência que se repete anualmente.

Aliás, Houellebecq concordou em mudar a palavra “muçulmanos” por “estrangeiros” em sua declaração, parte de uma entrevista de nada menos que 45 páginas.

Até é pouco diante das mais de 700 de seu último livro, Aniquilar, onde fala de um futuro muito próximo, entre 2026 e 2027, com um país decadente onde está em jogo a sucessão de um presidente igualzinho a Emmanuel Macron e…

Bem, não dá para resumir 700 páginas. Houellebecq pode ser um escritor magnífico pelos insights implacáveis que tem do comportamento humano e a visão cortante com que capta as incontáveis nuances de seu país.

É possível dizer que com toda certeza o encontro com o imã e o rabino ainda serão tema de alguma obra de Houellebecq e aí ele se estenderá em análises impiedosas, como sempre.

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Fonte: Veja

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