Uma das contribuições mais significativas da civilização cristã e ocidental à humanidade é a contagem do tempo e o atual calendário. Qual a razão e desde quando o ano começa à zero hora do dia 1º de janeiro? Foram séculos até o criar e adotar plenamente o calendário atual. Nos primeiros séculos do cristianismo, em qual data se iniciava o ano e desde quando se contavam os anos? Na origem, havia três calendários: judaico, romano e litúrgico ou religioso, o da Igreja. Nenhum satisfatório.
O , herdado dos babilônios, era essencialmente lunar. Os nomes atuais dos meses judaicos são de origem e foram assimilados pelo povo hebreu durante seu exílio na Babilônia, no século 4 antes de Cristo (a.C.). São necessários ajustes complexos para esse calendário encaixar-se no ano solar e para a Páscoa acontecer sempre na primavera, por exemplo. O início do ano () é uma data móvel. O Rosh Hashaná não pode começar em um domingo, quarta-feira ou sexta-feira. A festa do Dia do Perdão, do , não pode cair em uma sexta-feira ou domingo, e a festa do não pode ocorrer em uma segunda-feira ou sábado. São necessários . Os anos são contados desde a “criação do mundo”, 5,7 mil anos atrás. Um planeta bem rejuvenescido.
O é solar e foi herdado dos astrônomos sacerdotes egípcios. Eles estabeleceram um ano de 365 dias, por volta do ano 2800 a.C. Os anos eram contados a partir da data de , o ano 753 a.C. A data de início de cada ano era fixa, nas calendas de março ou no primeiro dia de março. Ele passou por diversas evoluções. Ainda é utilizado pelos em vários países, como calendário religioso. Nele, anos bissextos ocorrem sempre de quatro em quatro anos. No calendário atual, não.
“Dadas as confusões e as divergências entre o calendário judaico e o romano, havia várias datas para o início do ano e para a festa da Páscoa.”
Inicialmente, nos primeiros séculos, o calendário litúrgico ou religioso dos cristãos tinha como referência principal a Páscoa, a data da morte de Jesus. Dadas as confusões e as divergências entre o calendário judaico e o romano, havia várias datas para o início do ano e para a festa da Páscoa. No século V, o decidiu dar fim às “querelas pascais” e realizar um ajuste entre o calendário litúrgico, o lunar judaico e o solar romano. Para isso, o papa designou o monge (humilde), um erudito, canonista, tradutor, astrônomo e matemático.
O estudo para definir o início do ano
Seu estudo, publicado no ano 525, foi uma revisão completa da divisão do tempo e uma grande reviravolta. Ele sugeriu ao papa basear a contagem do tempo não mais na morte, mas no nascimento do Cristo. E tomar essa data como a do início da nova : o dia 25 de dezembro do ano 753 do calendário romano. Estava encerrada a Era dos Césares. O monge Dionísio estabeleceu o conceito do Ano do Senhor, Anno Domini (A.D.) ou Ano da Graça, Anno Gratis, em vigor até os dias atuais. Agora, A.D. 2025.
A Igreja Católica arbitrou e definiu como data para início do ano, o dia 1º de janeiro e não o 25 de dezembro, por razões religiosas. A vinculação oficial de Jesus ao seu povo e a Deus não ocorreu no seu nascimento e sim no dia da circuncisão, da apresentação no templo, de sua primeira manifestação pública. Na tradição judaica, esse rito de identificação da pessoa e de seu vínculo com Deus e Israel, ocorria uma semana depois do nascimento.
“O ano 1 a.C. foi imediatamente sucedido pelo ano 1 d.C.. Resultado: o primeiro século da Era Cristã teve 99 anos.”
Só por esse deslocamento de data, Jesus já teria nascido um ano antes do ano 1 da Era Cristã. Não havia ano zero nesse cálculo. A contagem dos anos assemelha-se à ordem dos números inteiros, com a exceção de um ano zero, inexistente. O ano 1 a.C. foi imediatamente sucedido pelo ano 1 d.C.. Resultado: o primeiro século da Era Cristã teve 99 anos.
Naquele tempo, o zero não integrava facilmente cálculos matemáticos com algarismos romanos. Esse e outros fatores levaram o monge matemático Dionísio, a um pequeno erro de cálculo. Jesus nasceu no reinado de Herodes, entre os anos 3 e 6, antes da Era Cristã. Até o mostrou este pequeno erro em sua obra . Apesar das dificuldades de comunicação, das diversidades culturais e políticas, a nova contagem do tempo foi adotada, aos poucos, na Europa e alhures.
Outros calendários
Por mais de um milênio, o Ocidente viveu sob o , instituído por , em 46 a.C.. Com imprecisões e deriva temporal, os equinócios se distanciaram da data real em cerca de dez dias no século 16. Sob determinação do papa , em 1579, matemáticos e astrônomos jesuítas das universidades de Salamanca e Coimbra trabalharam nas bases de um novo calendário. Em 24 de fevereiro de 1582, pela bula , o papa lançou o , adotado de imediato em Portugal, Espanha e Estados Pontifícios. Logo nos países protestantes e, hoje, em todo o planeta. A expressão carpe diem assumiu, desde então, todo o seu significado ().
Se dependesse do movimento da Terra em torno do Sol, a passagem do ano nunca seria à meia-noite. A Terra realiza uma translação completa em 365,256363 dias solares ou 365 dias, 5 horas, 48 minutos e 45,2 segundos. Para festejar a virada de ano sempre à meia-noite, o número de dias precisa ser um inteiro e não uma fração. Para tornar isso possível e evitar deslocamentos temporais, o ajuste final veio com o calendário gregoriano. Outra revolução. Um ganho excepcional de precisão no cálculo do tempo. E elegante, com um acerto nos anos bissextos. Não são bissextos os anos seculares, salvo múltiplos de 400, como o ano 800 ou 1600, por exemplo.
Sem esses ajustes, o calendário juliano, ainda em uso pelos cristãos ortodoxos, acumula uma diferença para o gregoriano de 13 dias. O dia 31 de dezembro de 2024 no calendário gregoriano é dia 18 de dezembro de 2024 no calendário juliano. A chamada , russa e bolchevique, na realidade ocorreu em novembro. Em 25 de outubro de 1917, segundo o calendário juliano então em vigor na Rússia dos , ocorreu a tomada do poder em São Petersburgo. De fato, era o dia 7 de novembro no calendário atual, o gregoriano. De lá para cá, os russos deixaram o comunismo e o calendário juliano. Ou quase.
A contagem atual de um ano
O jeito atual de contar o tempo ainda não tem 500 anos de existência — e é um sucesso. O calendário gregoriano é o padrão internacional de registrar o tempo, reconhecido pela Organização das Nações Unidas e pela União Postal Universal. Isso justifica-se tanto pelo peso da tradição ocidental, quanto pela precisão astronômica do calendário gregoriano. Ele estabeleceu até uma específica para se datar: a .
Existe um discurso , , associado à e da , onipresente na internet, sobre o calendário e a marcação do tempo. Ele busca no calendário e trata diversos desses eventos e passos históricos na construção do atual calendário como arbitrariedades. Anacrônicos, esses canceladores e censores ideológicos apontam todas essas datas estabelecidas pela Igreja ao longo de séculos como arbitrárias. Nada mais distante da verdade.
“O calendário universal é o Ocidental, o Gregoriano, o estabelecido pela Igreja Católica. Tem muito ‘desconstrucionista’ incomodado com este fato”
Essas datas do atual calendário foram arbitradas, e não arbitrárias, com os melhores critérios em seu contexto histórico. Inúmeras questões necessitam de arbítrio. Não há livre arbítrio no calendário. Nem há receita na Bíblia para calcular o tempo. Ele foi arbitrado várias vezes, com recurso aos melhores cientistas de cada época, por uma das maiores autoridades temporais, a Igreja. O Tempo Ocidental se impôs aos do Oriente e alhures. Algo distante de qualquer arbitrariedade.
O calendário universal é o Ocidental, o Gregoriano, o estabelecido pela Igreja Católica. Tem muito “” incomodado com este fato. Na vida civil e civilizada, o calendário gregoriano substituiu outros calendários (muçulmano, judaico, chinês, juliano…), limitados a usos religiosos e tradicionais. Quem regula voos de aviões, satélites, tratados internacionais, GPS de máquinas agrícolas, pagamento de boletos e o cotidiano de bilhões de pessoas é o calendário cristão, papal, romano e gregoriano, criado e estabelecido progressiva e cientificamente pela Igreja.
N’en déplaise a , anticristã e antiocidental, o calendário gregoriano é um marco científico da e de seu relativo domínio do , do Tempo. Dele, ninguém escapa, do Réveillon ao Natal, passando por Páscoa e Carnaval. Pode tentar.
Fonte: revistaoeste