Nos últimos meses, as palavras, os olhares, os gestos de Rachel Goldberg-Polin, 55 anos, eram símbolos da esperança. No discurso. No semblante abatido, doce e obstinado. O rosto da esperança.
“A esperança é obrigatória”, disse ela, durante sua luta pelo retorno do seu filho, Hersh, 23 anos, e dos sequestrados pelo grupo terrorista Hamas em 7 de outubro.
Ao lado do marido, Jonathan, do dia para a noite ela deixou a rotina de mãe zelosa, daquelas que esperam os filhos para lhes dar o biscoito, para se tornar uma defensora da liberdade de Hersh. Ele estava no Re’im Music Festival no momento em que foi levado.
Rachel rodou o mundo, junto de Jonathan. Reuniu-se com líderes e executivos, fez discurso nas Nações Unidas, foi até o papa no Vaticano. Deu entrevistas. Foi eleita uma das cem personalidades mais influentes do ano pela revista Time. Participou de lives. Em agosto, foi celebridade na Convenção Nacional Democrata, nos Estados Unidos.
À repórter, e depois amiga, Elizabeth Bernstein, do Wall Street Journal, chegou a confessar que tinha tamanha crença na volta do filho que se imaginava dançando no casamento dele. E que depois se via com o seu futuro neto no colo.
Dirigiu-se, de forma aberta, até para o Hamas. Foi quando, depois de ver um vídeo de Hersh vivo, em abril, apelou para que todas as partes negociassem um acordo.
Mas os membros do Hamas não lhe deram ouvidos. Executaram Hersh, além de outros cinco reféns, no último dia 1, quando, tudo indica, eles estavam prestes a ser resgatados por Israel.
“Tive muito tempo para pensar em meu doce menino Hersh nos últimos 332 dias, e uma coisa em que continuo pensando é como, de todas as mães do mundo inteiro, Deus escolheu dar Hersh para mim”, disse Rachel, durante o enterro do filho
A cerimônia foi cercada por milhares de pessoas. Ocorreu no cemitério em Jerusalém, situado no alto de uma colina. “O que devo ter feito em uma vida passada para merecer um presente tão lindo?”
“Agora não preciso mais me preocupar com você, você não está mais em perigo. Você está com o lindo Aner. Espero que ele lhe mostre o lugar”, lembrou, ao se referir ao melhor amigo de seu filho, Aner Shapiro, morto em 7 de outubro ao atirar granadas de um abrigo antiaéreo para salvar os que estavam lá dentro.
Tentativa de resgate
As palavras de Rachel, uma orientadora educacional, mantiveram a sabedoria e a ternura mesmo depois da morte de Hersh, nascido na Califórnia e crescido em Jerusalém.
Dias antes, ela havia sido uma das líderes de uma caravana que rumou em direção a Gaza. Se não fosse parada pelas , teria entrado para resgatar os reféns por conta própria.
Mesmo parada na fronteira, no entanto, insistiu. Recitou a maior das bençãos da religião judaica e gritou, com um alto-falante nas mãos.
“É a mamãe. Estamos todos aqui, todas as famílias dos 107 reféns restantes. Hersh, estamos trabalhando dia e noite, e nunca vamos parar.”
Durante os quase 11 meses de cativeiro do filho, Rachel grudava um adesivo na roupa, diariamente, com o número relativo ao dia. Foram 332. Ela passou a adotar hábitos em função do filho, conforme conta Elizabeth.
Rachel não usava maquiagem, não mais soltava o cabelo. Também parou de fazer palavras cruzadas, porque costumava destrinchá-las com Hersh. Aboliu conversas sociais e não mais ouvia música.
Na mesa da cozinha, sentava na cadeira de Hersh, para não sentir o vazio de sua ausência. Parou de desfrutar da comida. Ingeria somente uma refeição por dia, de forma rápida, sem olhar. Seu temor era de que seu filho não estivesse sendo alimentado adequadamente.
“Correremos até os confins da Terra e falaremos com qualquer um”, disse ela a Elizabeth certa vez. “Não sabemos qual é a pedra que precisa ser virada.”
No funeral, Rachel estava dilacerada, ao lado das filhas Orly e Libby – irmãs mais velhas de Hersh – e de Jonathan. Mas ela não se mostrava derrotada.
“Agora meu Hersh, peço sua ajuda, enquanto transformamos nossa esperança em tristeza nesta nova e desconhecida marca de dor”, declarou. “Eu imploro a você, Hersh, por favor, faça o que puder para que sua vida brilhe sobre toda a família. Ajude-nos a nos banhar com coragem e resiliência. Ajude-nos a nos levantar novamente.”
Naqueles minutos, a esperança de Rachel, conforme ela mesmo disse, se transformava em tristeza, mas não terminava. Ganhava uma nova forma. Como ocorre com toda mãe incansável.
Fonte: revistaoeste